sábado, 19 de dezembro de 2015

Opinião do dia: Miguel Reale Junior

Está sendo praticado um ativismo de altíssimo grau no STF. O Supremo Tribunal Federal não está contente em julgar e quer legislar. Como pode uma maioria simples do Senado destituir uma maioria de dois terços da Câmara dos Deputados? O artigo 51 da Constituição diz que compete privativamente à Câmara, por dois terços dos votos, instaurar o processo (de cassação da presidente da República). Achei a decisão estranha. O STF entrou em um campo de normatizar o que já está previsto na Constituição.

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Miguel Reale Junior, um dos autores de pedido de impeachment, entrevista em O Estado de S. Paulo, 19.12.2015.

Lula atribui a Dirceu indicação de diretores para a Petrobrás

• À Polícia Federal, ex-presidente afirmou que 'processo de escolha não contava com sua participação'

Por Beatriz Bulla e Gustavo Aguiar – O Estado de S. Paulo

O ex-presidente Lula atribuiu a José Dirceu, ex-ministro chefe da Casa Civil do seu governo, responsabilidade pela indicação de diretores da Petrobrás. Em depoimento à Polícia Federal na quarta-feira, 16, Lula disse que “cabia à Casa Civil receber as indicações partidárias e escolher a pessoa que seria nomeada”.

Dirceu chefiou a Casa Civil durante parte do primeiro mandato do petista, entre 2003 e 2005, quando estourou o escândalo do mensalão – Dirceu foi condenado a 7 anos e onze meses de prisão no mensalão e está preso desde 3 de agosto como alvo da Operação Lava Jato, que desmontou esquema de propinas na estatal petrolífera.

Investigadores já suspeitavam que Dirceu havia indicado o engenheiro Renato Duque – preso da Lava Jato desde março – para a Diretoria de Serviços da estatal petrolífera. Mas Dirceu sempre negou. “Que o nome de Renato Duque foi levado à Casa Civil da Presidência da República, à época chefiada por José Dirceu”, disse Lula à PF.

O ex-presidente disse que “não sabe se foi o PT ou outro partido politico que indicou Renato Duque para assumir a Diretoria de Serviços”. Afirmou que “não conhecia Renato Duque e que não participou do processo de escolha do nome de Renato Duque”.

Sobre o ex-diretor da Área Internacional da Petrobrás, Nestor Cerveró, que também foi preso na Lava Jato e já está condenado a 17 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, o ex-presidente disse. “Que acha que Nestor Cerveró foi uma indicação politica do PMDB; que Nestor Cerveró era um funcionário de carreira da Petrobrás.”

Lula eximiu-se de qualquer responsabilidade na indicação dos diretores da Petrobrás. Ele afirmou que “o processo de escolha dos nomes dos diretores não contava com sua participação”.

“Que o declarante recebia os nomes dos diretores a partir de acordos políticos firmados; que este processo de acordos políticos era feito normalmente pela ministro da área, pelo coordenador politico do Governo e pelo partido interessado na nomeação; que teve vários coordenadores políticos ao longo de seus oito anos de mandato; que pode citar Tardo Genro, Jacques Wagner, Alexandre Padilha, Aldo Rebelo, etc; que não se recorda qual destes articuladores políticos tratou das nomeações de Renato Duque e também de Nestor Cerveró.”

Sobre outro ex-diretor que a Lava Jato pegou – Paulo Roberto Costa (Abastecimento) -, o ex-presidente disse que ‘seu nome foi apresentado pelo Partido Progressista’. “Como nos demais, o nome de Paulo Roberto Costa foi levado à Casa Civil para deliberação e posterior e posterior nomeação pelo declarante; que os nomes dos indicados pelos partidos não eram levados diretamente ao declarante; que, como explicado, o processo de • escolha passava pela discussão com os diversos envolvidos no aspecto politico e não somente com o ministro-chefe da Casa Civil; que, ao final deste processo, o declarante concordava ou não com o nome apresentado, a partir dos critérios técnicos que credenciavam o indicado.”

A PF quis saber de Lula se ele conversou com o ex-deputado José Janene (PP/PR, morto em 2010) sobre a indicação de Paulo Roberto Costa para assumir a Diretoria de Abastecimento da Petrobrás – Janene é apontado como o mentor do esquema de corrupção que se instalou na Petrobrás. O ex-presidente disse que ‘nunca conversou’ com Janene ‘a respeito de qualquer assunto’.

Lula também afirmou que nunca tratou com os deputados Pedro Henry e Pedro Corrêa sobre a indicação de Paulo Roberto Costa. “Nunca tratou com qualquer liderança de qualquer partido sobre a indicação de algum nome para cargo da administração pública; que os nomes eram apresentados pelo Governo, ou seja, pelos articuladores políticos que levavam O nome à Casa Civil da Presidência.”

Lula disse que ‘nunca se sentiu pressionado pela Partido Progressista a fim de que Paulo Roberto Costa fosse nomeado diretor de Abastecimento da Petrobrás’. Ele declarou que o PMDB ‘nunca ofereceu apoio político ao Governo a fim de manter Paulo Roberto Costa no cargo de diretor de Abastecimento, e se ofereceu tai apoio isto não chegou ao conhecimento do declarante’.

A PF indagou de Lula sobre quais diretores da Petrobrás foram indicados pela PT. “O declarante afirma que talvez Renato Duque tenha sido uma indicação do PT.”

Ele saiu em defesa do ex-presidente da Petrobrás José Sergio Gabrielli. Neste caso disse que ‘foi uma indicação pessoal sua’. “Que indicou José Sérgio Gabrielli para ser diretor financeiro da Petrobrás em razão do mesmo ser um economista altamente capacitado e por ser alguém de sua confiança; que, da mesma forma, a indicação de José Sérgio Gabrielli para assumir a presidência da companhia foi uma escolha do declarante.”

Lula disse que há um “processo de criminalização” do PT

• Ex-presidente afirmou, ainda, não ter conhecimento sobre corrupção na Petrobrás

Em depoimento prestado à Polícia Federal no âmbito da investigação da Lava Jato, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que existe um “processo de criminalização” do PT. Ele disse não ter conhecimento sobre os eventos de corrupção ocorridos na Petrobrás e, questionado a que atribui a existência de pessoas de seu governo investigadas na Operação, apontou três motivos: o aprimoramento dos processos de fiscalização, a imprensa livre, e a criminalização do PT. Ele disse ainda que “não crê que os principais partidos da base aliada do governo tenham, através de suas principais lideranças, obtido vantagens indevidas a partir dos contratos das diversas diretorias da Petrobras”.

DEPOIMENTO LULA   PDF

Lula atribui nomeações a Dirceu

O ex-presidente Lula disse em depoimento à PF que coube ao então ministro José Dirceu (Casa Civil) indicar diretores da Petrobras suspeitos de comandar o esquema de corrupção na estatal

À PF, Lula diz que cabia à Casa Civil encaminhar indicações na Petrobras

• Ex-presidente afirma que não participou da escolha de diretores

Vinicius Sassine e Evandro Éboli - O Globo

BRASÍLIA - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou em depoimento à Polícia Federal, em Brasília, na última quarta-feira, que ficou fora do processo de escolha dos diretores da Petrobras suspeitos de comandar um esquema de corrupção na estatal. Ouvido como testemunha no principal inquérito da Lava-Jato em curso no Supremo (STF), que investiga crime de formação de quadrilha e atuação de políticos do PMDB, do PP e do PT, Lula disse que os diretores foram indicações políticas dos partidos e que apenas recebia as indicações a partir de acordos políticos. “O processo de escolha dos nomes dos diretores não contava com a participação do declarante”, cita o termo do depoimento, anexado ontem ao inquérito.

O petista imputou à Casa Civil e à coordenação política de seu governo a responsabilidade por fazer, respectivamente, o encaminhamento das indicações e os acordos políticos necessários à ocupação dos cargos. Lula disse que não conhecia Renato Duque, ex-diretor de Serviços da Petrobras preso em Curitiba por suspeita de operar um esquema de desvios de recursos da estatal. “O nome de Renato Duque foi levado à Casa Civil da Presidência da República, à época chefiada por José Dirceu”, disse Lula ao delegado Josélio Azevedo de Sousa. “Cabia à Casa Civil receber as indicações partidárias e escolher a pessoa que seria nomeada”, completou. O ex-presidente afirmou não saber se foi o PT o responsável pela indicação de Duque.

Sobre Nestor Cerveró, que ocupou a Diretoria Internacional e que também é suspeito de operar o esquema, Lula disse “achar” que o nome foi uma indicação do PMDB. “O declarante recebia os nomes dos diretores a partir dos acordos políticos firmados. Este processo de acordos políticos era feito normalmente pelo ministro da área, pelo coordenador político do governo e pelo partido interessado na nomeação”, registra o termo do depoimento. O petista afirmou ter tido diferentes coordenadores políticos em oito anos de governo. Ele citou os petistas Tarso Genro, Alexandre Padilha e Jaques Wagner, atual ministro da Casa Civil. Também foi citado Aldo Rebelo, do PCdoB, hoje ministro da Defesa.

A indicação de Paulo Roberto Costa para a Diretoria de Abastecimento partiu do PP, segundo Lula, e também “foi levada à Casa Civil para deliberação e posterior nomeação do declarante”. “Ao final deste processo o declarante concordava ou não com o nome apresentado, a partir dos critérios técnicos que credenciavam o indicado”. Lula disse acreditar que o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, preso em Curitiba, será absolvido. O ex-presidente foi questionado sobre a proximidade ao pecuarista e lobista José Carlos Bumlai, investigado e preso na Lava-Jato. Lula disse ter “relação de amizade” com Bumlai, mas negou ter tratado de qualquer negócio ou indicação política com ele.

O presidente do PT, Rui Falcão, prestou depoimento no mesmo inquérito no início de dezembro. Ele declarou que nunca definiu as empresas a serem procuradas por Vaccari e que a única diretriz que deu é que as doações “sejam legais”. Perguntado, respondeu que o PT “nunca” recebeu dinheiro do esquema de corrupção na Petrobras.

Ala governista do PMDB quer tirar Cardozo

• Renan e outros senadores investigados na Lava-Jato reclamam de ministro da Justiça

Fernanda Krakovics - O Globo

Aliado do governo e peça-chave para barrar o processo de impeachment, o comando do PMDB do Senado pressiona a presidente Dilma Rousseff a tirar José Eduardo Cardozo do Ministério da Justiça. Assim como o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o PT, o grupo liderado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), reclama que Cardozo não controla a Polícia Federal. Além de Renan, quatro senadores peemedebistas são investigados na Operação Lava-Jato.

A ala governista do PMDB argumenta que Dilma precisa colocar no comando do Ministério da Justiça alguém que tenha “autoridade” e possa “dialogar” com a Polícia Federal, o Ministério Público e os outros Poderes. No PMDB do Senado, além de Renan, estão na mira da Lava-Jato os senadores Romero Jucá (RR), Jader Barbalho (PA), Edison Lobão (MA) e Valdir Raupp (RO).

O assunto foi abordado em almoço do presidente do Senado com Dilma anteontem e seria reforçado pelo ministro Eduardo Braga (Minas e Energia) em conversa com a presidente ontem. O líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), foi na mesma linha em encontro com Dilma na semana passada.

Cerco ao partido
O PMDB foi o alvo de nova fase da Lava-Jato na última terça-feira. A Polícia Federal vasculhou casas e escritórios do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), e de outros políticos do PMDB, inclusive ligados ao presidente do Senado, além de dois ministros indicados pelo partido, Celso Pansera (Ciência e Tecnologia) e Henrique Eduardo Alves (Turismo).

No PT, a avaliação é que há um “apagão” no Ministério da Justiça. Desde o ano passado, Lula tenta convencer Dilma a substituir Cardozo. Mas, mesmo entre os insatisfeitos com o ministro, a avaliação é que a presidente está em uma saia-justa. Se substituir Cardozo, passará a imagem de que cedeu às pressões e de que pretende abafar as investigações. Além de reclamar de falta de controle da Polícia Federal, Lula se queixa de supostos excessos e de vazamentos seletivos. A irritação do ex-presidente aumentou com a operação de busca e apreensão no escritório de seu filho Luis Claudio, em outubro.

A avaliação da cúpula do PMDB do Senado é que, apesar da vitória obtida pelo governo no Supremo Tribunal Federal (STF) em relação ao processo de impeachment, Dilma precisa, para atravessar os próximos três anos, ter um mínimo de controle da Lava-Jato, que aumenta a turbulência política, e fazer mudanças nos rumos da economia, para aumentar sua popularidade.

Esse assunto foi debatido, na noite de anteontem, em reunião em que estavam presentes Renan, Eunício, Jucá e Eduardo Braga. Esse último ficou encarregado de reforçar os argumentos em conversa com Dilma ontem.

— A gente está dizendo para ela que, com essa decisão do Supremo, o impeachment foi para o saco, mas ela precisa conquistar também as ruas. Se ela não mexer na área econômica, não vai adiantar nada. Se ela não der uma sinalização nesse sentido até março, (o governo) está perdido. E precisa dar uma mexida no Ministério da Justiça, botar alguém que tenha autoridade, que possa dialogar com a Polícia Federal — afirmou um dos participantes da reunião.

O STF decidiu que o Senado, onde a base governista é mais forte, pode rejeitar o processo de impeachment, caso ele seja aberto pela Câmara. Em uma vitória do governo e contrariando o rito que vinha sendo imposto por Eduardo Cunha, o Supremo anulou os procedimentos adotados até agora, e a Câmara terá de eleger novamente, e em sessão aberta, a comissão que fará o parecer a ser votado em plenário.

A decisão do STF foi um revés para o vice-presidente da República e presidente do PMDB, Michel Temer, que, apostando no impeachment, tentou liderar um desembarque do partido do governo. Aliado a Cunha, Temer chegou a destituir o deputado Leonardo Picciani (RJ) da liderança do PMDB da Câmara. Picciani, que conseguiu retomar o cargo, trabalha para barrar o processo de afastamento de Dilma.

Agora, em uma guerra aberta, a ala governista do PMDB articula o lançamento de um candidato à presidência do partido contra Temer. A convenção nacional está marcada para março, e o nome defendido pelo grupo alinhado ao Planalto é o do ex-senador José Sarney (MA).

O vaivém de Renan

• Ao longo do ano, presidente do Senado esteve ao lado do governo e contra ele


STF ainda tem dúvida sobre comissão da Câmara

• Rito não define o que ocorre se chapa indicada por líderes for rejeitada

Tiago Dantas e André de Souza – O Globo

BRASÍLIA - Na última sessão do ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) aprovou ontem a ata da sessão que definiu o rito do impeachment da presidente Dilma Rousseff. Durante a sessão, os ministros discutiram o texto do acórdão, que será publicado hoje em uma edição extraordinária do Diário Oficial. A principal dúvida que resta é sobre o que ocorre se o plenário da Câmara rejeitar a chapa dos deputados indicados pelos líderes partidários para compor a comissão do impeachment. O STF determinou que essa é a única forma de apontar integrantes para a comissão, proibindo candidaturas avulsas.

O ministro Dias Toffoli, que foi voto vencido nessa questão, não soube responder, e disse que é possível entrar ainda com embargos de declaração, um tipo de recurso usado para esclarecer omissões, obscuridades, contradições de uma decisão. Já o advogado-geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, que defendeu Dilma e foi contra a possibilidade de candidatura avulsa, apontou um caminho.

— Essa questão quem deve responder são aqueles que votaram no sentido de que há necessidade da indicação dos líderes. Eu não votei dessa forma — disse Toffoli em entrevista após a sessão.

— Uai, isso mostra que haverá necessidade de os líderes refazerem a chapa. Se não há base de sustentabilidade no processo para essa chapa, eles refazem a chapa — afirmou Adams.

Para Mendes, STF foi ‘bolivariano’ em julgamento

• Integrante da Corte, ministro criticou decisão sobre o rito do impeachment e afirmou que houve ‘cooptação’ e ‘artificialismos’

Gabriel Manzano Valmar Hupsel Filho – O Estado de S. Paulo

Horas depois de o Supremo Tribunal Federal ratificar, ontem, as decisões da quinta-feira sobre o rito a ser adotado no processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o ministro da Corte Gilmar Mendes afirmou, em São Paulo, onde almoçou com amigos, que o tribunal se comportou de forma “bolivariana” naquela sessão.

Ele disse concordar, de modo geral, com as críticas feitas pelo jurista Miguel Reale Jr., que afirmou que houve “ativismo político”. Ele repetiu a frase do jurista e um dos autores de pedido de impeachment de Dilma segundo a qual o Supremo decidiu “legislar em vez de julgar”. “Eu também disse isso, no final da sessão.”

“Mas o que mais me preocupou”, afirmou o ministro ao Estado, “foi a opção do tribunal pela intervenção no sistema de eleição da comissão na Câmara. Achei lamentável. ”E prosseguiu: “Tem jeito de coisa direcionada. Líderes indicados, voto aberto. Ora, a gente vê o que está acontecendo nos partidos. Foi para isso que o tribunal se reuniu? Achei aquilo constrangedor”.

No julgamento do rito do impeachment, na quinta-feira, o Supremo, por maioria, reconheceu o poder do Senado em barrar o processo, mesmo após eventual aprovação na Câmara. Além disso, a Corte derrubou a eleição dos membros da Comissão Especial instalada para avaliar o processo do impeachment, estabeleceu que os membros da comissão devem ser nomeados pelos líderes partidários, e rejeitou a exigência da defesa prévia da presidente em caso de abertura do processo. Gilmar Mendes foi voto vencido em todas os casos.

‘Cooptação’. Em entrevista à rádio Jovem Pan, o ministro também criticou a decisão do plenário do Supremo sobre o rito do impeachment. “Lembra que eu tinha falado do risco de cooptação da Corte? Eu acho que nesse caso isso ocorreu”, disse Mendes. “Há todo um processo de bolivarianização da Corte. Assim como se opera em outros ramos do Estado também pretende-se fazer isso no Tribunal. E, infelizmente, ontem se deu mostra disso.”

Reconhecido por suas declarações críticas aos governos petistas, Mendes insinuou que o Supremo usou de “artificialismos” para beneficiar o governo. “Imagine que diante de todo quadro de crise de corrupção vamos fazer artificialismos jurídicos para colocar um balão de oxigênio para quem tem morte cerebral”, afirmou. O Estado entrou em contato com o ministro, mas ele não quis comentar.

Miguel Reale Jr acusa STF de fazer 'ativismo de altíssimo grau' sobre impeachment

• Ex-ministro da Justiça do presidente Fernando Henrique Cardoso e um dos que assinou o pedido de afastamento da presidente criticou decisão do STF desta quinta

Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Um dos signatários do pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff que foi acolhido pela Câmara dos Deputados, o jurista Miguel Reale Júnior, acusou o Supremo Tribunal Federal (STF) de ter praticado "ativismo jurídico" a favor do governo ao acatar a tese do Palácio do Planalto na votação desta quinta-feira, 17, sobre o rito do processo.

"Está sendo praticado um ativismo de altíssimo grau no STF. O Supremo não está contente em julgar e quer legislar", diz. Ex-ministro da Justiça do presidente Fernando Henrique Cardoso, Reale também considera que a Corte não seguiu o mesmo rito de impedimento de Fernando Collor. "Como pode uma maioria simples do Senado destituir uma maioria de 2/3 da Câmara?", questiona.

Além de Reale, também assinaram o pedido o ex deputado petista Hélio Bicudo e a professora de direito da USP, Janaína Paschoal. O Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a eleição da comissão especial da Câmara que será responsável por decidir se abre ou não processo contra a presidente.

A Corte respondeu uma iniciativa do PC do B, que questionou o rito adotado por Eduardo Cunha (RJ). O peemedebista permitiu a participação da chapa avulsa, formada pela oposição e dissidentes da base e eleita por 272 votos contra 199 em votação secreta.

Entrevista. Miguel Reale Junior, um dos autores de pedido de impeachment

1.O que o sr. achou da decisão do Supremo Tribunal Federa sobre o rito do processo de impeachment? 

Está sendo praticado um ativismo de altíssimo grau no STF. O Supremo Tribunal Federal não está contente em julgar e quer legislar. Como pode uma maioria simples do Senado destituir uma maioria de dois terços da Câmara dos Deputados? O artigo 51 da Constituição diz que compete privativamente à Câmara, por dois terços dos votos, instaurar o processo (de cassação da presidente da República). Achei a decisão estranha. O STF entrou em um campo de normatizar o que já está previsto na Constituição.

2.O que achou da decisão do STF de derrubar o voto secreto na votação da comissão do impeachment?

O ministro (Luís Roberto) Barroso diz que a decisão foi pessoal do Eduardo Cunha (presidente da Câmara dos Deputados), mas o artigo 188 do regimento da Casa diz que a eleição é secreta para as comissões, tanto as permanentes como as temporárias. O voto do ministro (Luiz Edson) Fachin foi correto.

3.Avalia que impeachment perdeu força depois dos últimos acontecimentos?

Tudo vai depender dos fatos que vão ocorrer. O novo ministro da Fazenda (Nelson Barbosa) é um dos apontados como responsável pela pedaladas fiscais. Se o PMDB tiver, depois do recesso, uma prevalência de deputados pró-impeachment, ele poderá ocorrer.

4.A manifestação pró-governo de quarta-feira levou mais gente para a rua do que a de domingo em defesa do impeachment. Como avalia isso politicamente?

O governo federal nunca colocou tanta gente nas ruas como as redes sociais. Em março foram milhões de pessoas no Brasil inteiro. Quem foi para a rua na quarta-feira, em um dia de trabalho, recebeu algum benefício. / Pedro Venceslau

Oposição aposta em ruas e na divisão da base para impeachment avançar

• Após revés no STF, adversários do Planalto na Câmara definem estratégia para manter presidente sob pressão, o que inclui aproximação com grupos anti-Dilma, projeto de resolução para escapar de decisão da Corte e atuação para desidratar alas pós-governo

Erich Decat e Pedro Venceslau - O Estado de S. Paulo

Após vitória do governo no Supremo Tribunal Federal, que definiu o rito do impeachment, a oposição a Dilma Rousseff iniciou ontem a elaboração de uma estratégia para tentar manter a petista sob pressão na Câmara dos Deputados e dar início ao processo na Comissão Especial da Casa encarregada de analisar o pedido de afastamento da presidente, aceito por Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no último dia

A tática dos oposicionistas, que não se agregam num único grupo, apesar do interesse comum de afastar a presidente, tem três pilares: 1) novas ações regimentais; 2) busca de apoios nos movimentos antipetistas da sociedade civil para pressionar políticos nas suas bases durante o recesso; 3) enfraquecer a ala de parlamentares governistas do PMDB, hoje liderada por Leonardo Picciani (RJ).

Apesar de o Congresso funcionar na próxima semana, é quase certo que o trâmite do impeachment só comece mesmo no ano que vem. Para escapar do alcance de uma das decisões do STF, a oposição promete apresentar um projeto de resolução que estabelece a possibilidade de se ter chapa avulsa para compor a comissão responsável por analisar o de impeachment.

Em decisão tomada anteontem, os ministros do STF, entre outros pontos, vetaram a possibilidade de candidaturas alternativas para a composição do colegiado. No entendimento dos integrantes da Suprema Corte, a chapa deve ser composta apenas com os nomes indicados pelos líderes partidários, o que favorece o governo.

A proposta já foi protocolada na Casa pelo líder do DEM na Câmara, Mendonça Filho (PE), e prevê mudanças no regimento interno justamente para validar a chapa avulsa que o STF julgou inconstitucional. "A ideia é mudar o regimento e colocar a questão de líderes e candidaturas avulsas. Como o Supremo mandou desmanchar todos os atos praticados até aqui, vai ser designada uma nova Comissão Especial e, com a alteração do regimento da Câmara, essa nova eleição para a constituição da comissão se dará com esse novo entendimento, ou seja, via eleição e num processo em que se pode ter chapa avulsa", afirmou Mendonça Filho.

Segundo ele, o tema deverá ser discutido em reunião de líderes prevista para a próxima segunda-feira na Câmara. Na ocasião, Mendonça pretende também coletar assinaturas dos demais líderes para que o projeto tramite sob o regime de urgência. Além desse tema, deve ser colocada em pauta a apresentação de possíveis embargos contra a decisão do STF a respeito do rito do impeachment.

Frente. A outra aposta é nas ruas. "Haverá pressão popular na base dos deputados durante o recesso. Isso deve influir no mau humor do Parlamento com o governo depois do recesso", diz. "Haverá tempo, daqui até o fim do recesso, para se reorganizar e mobilizar os movimentos de rua", completa Bruno Araújo, líder do PSDB.

Dentro das discussões realizadas entre os integrantes do grupo a favor do impedimento de Dilma, após a decisão do STF, está também a possibilidade de se apresentar um voto em separado na Comissão Especial, caso os opositores não consigam apoio para o projeto de resolução de Mendonça.

Diante da possibilidade de o processo de impeachment coincidir com um período de agravamento da crise econômica, lideranças da base apostam na divisão dos partidos de centro - o chamado "centrão", mais flexível a mudanças de posições a depender do quadro político. Legendas como PP e PSD, que contam com ministérios relevantes na Esplanada dos Ministérios, estão rachadas. A bancada pepista, com 41 deputados, se divide hoje em 26 votos a favor e 15 contra o impeachment. A bancada do PSD conta hoje com 20 votos contra o afastamento e 12 a favor. No PMDB, a ala pró-impeachment vai tentar destituir Picciani. "Ele introduziu a prática das listas e agora vai esperar outra que o destituirá. Picciani será um líder em exercício", afirma Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA).

Grupo de Temer reclama do STF e do Planalto


  • Oposicionistas do PMDB dizem que governo fez intensa pressão pró-Picciani

Júnia Gama - O Globo

BRASÍLIA - A cúpula do PMDB ligada ao vice-presidente Michel Temer criticou as decisões de anteontem do Supremo Tribunal Federal (STF) — que anulou a comissão de impeachment da Câmara que tinha maioria antigovernista — e do Palácio do Planalto — que conseguiu devolver ao deputado Leonardo Picciani (PMDBRJ) a liderança da bancada na Câmara, fortalecendo a ala do partido contrária à queda da presidente Dilma Rousseff.

Dirigentes do PMDB afirmam que a retomada da liderança pelo grupo governista ocorreu graças a um intenso trabalho de pressão sobre caciques do partido, incluindo ministros, parlamentares e seus familiares. A interferência do Planalto na articulação próPicciani levou integrantes do grupo dissidente do PMDB a reclamar de um suposto viés “chavista” no governo.

— É um governo totalitário. Onde ele vê que pode influenciar, ele vai. A intervenção no PMDB é para transformar nosso partido na filial do PT, e algumas pessoas se prestam a esse trabalho, achando que serão recompensadas se prestarem esse serviço, mas desconhecem a tradição do PT de chupar a laranja e jogar o bagaço fora — disse o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), que esteve na linha de frente da articulação que levou Leonardo Quintão (PMDB-MG) à liderança do partido por uma semana. — O chavismo no governo sempre foi um sonho do PT, e agora passa a ser o Brasil o polo mais importante desse projeto hegemônico e totalitário das esquerdas da América do Sul.

Há reclamações de que o governo teria atuado diretamente para pressionar deputados que apoiaram Quintão a voltar atrás e assinar a lista a favor de Picciani. São citados os casos das deputadas Elcione Barbalho (PMDB-PA) e Simone Morgado (PMDB-PA), mãe e madrasta do ministro Helder Barbalho (Pesca), respectivamente, e do deputado Hildo Rocha (PMDB-MA), a quem teria sido oferecido um cargo no Dnit no Maranhão.

Segundo integrantes da cúpula do partido, cresceu o apelo interno para que a convenção do PMDB, marcada para março, seja antecipada, mas os dirigentes pretendem esperar até fevereiro, na volta do recesso parlamentar, depois que estiver consolidada a decisão do Supremo sobre o impeachment — que será alvo de recursos de partidos da oposição e do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

A maior preocupação, afirmam peemedebistas históricos, é sobre o que fazer a respeito daqueles que não querem desembarcar do governo Dilma, como os ministros ligados ao Senado. Reservadamente, as críticas no PMDB se estendem também ao Supremo.

— A Câmara representa a nação, e o Senado, os estados. O Supremo tirou da nação o direito de decidir sobre o impeachment e levou esse poder para os estados — afirma um integrantes da cúpula do PMDB.

País perde 1,5 milhão de vagas formais em 12 meses

• Em novembro, foram fechados 130 mil empregos com carteira assinada, no pior resultado em duas décadas

Geralda Doca - O Globo

BRASÍLIA - O mercado formal de trabalho registrou uma redução de 130.629 vagas (admissões menos demissões), no oitavo mês consecutivo de piora no emprego. É o pior resultado para o mês da série histórica do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), iniciada em 1992. No mesmo período de 2014, foram criados 8.381 postos. Nos doze meses encerrados em novembro, as demissões superam 1,5 milhão, segundo o Ministério do Trabalho. É também o pior resultado em 23 anos. Entre janeiro e novembro, o país fechou 945.363 vagas com carteira assinada.

Em relação a outubro, quando foram eliminados 169.131 postos, houve queda no ritmo dos desligamentos. No mês passado, o comércio registrou saldo positivo de 52.592 empregos, devido às vagas temporárias para o fim de ano. Mas, nos demais setores, as demissões superaram as contratações, sendo que na indústria, os cortes somaram 77.341; a construção civil perdeu mais 55.585 empregos; serviços, outros 23.312 e agricultura, 21.969.

O diretor do Departamento de Emprego e Salário do Ministério do Trabalho, Márcio Borges, disse que o resultado do emprego formal em novembro já era esperado. Segundo ele, os números mostram que as empresas vêm ao longo dos últimos meses fazendo ajustes, diante da crise na economia e do cenário de incertezas.

Corte menor em dezembro
Isso, destacou, pode fazer com que o saldo de dezembro, tradicionalmente negativo devido às rescisões dos contratos temporários, fique inferior à média de 300 mil desligamentos.

— Nossa expectativa é que dezembro venha com um número menor porque já está havendo um processo de alinhamento das empresas — disse o diretor, acrescentando que o cenário de incertezas precisa ser enfrentado pela equipe econômica, a fim de retomar a geração de empregos. — Isso precisa ser enfrentado pelos Ministérios da Fazenda e do Planejamento — destacou.

Para Rodolfo Torelly, do site especializado Trabalho Hoje, não há sinais de que o desemprego vai diminuir:

— Os resultados no mercado de trabalho formal continuam se agravando, com seguidos recordes negativos de perdas mensais de empregos formais. Ainda não vislumbramos uma desaceleração nos cortes de vagas, que obrigatoriamente irão anteceder uma retomada da geração positiva dos empregos formais — disse Torelly.

De acordo com o Caged, os setores mais afetados no acumulado do ano são a indústria, onde os cortes já atingiram 414.075 empregos, seguida pela construção civil, que já perdeu 309.226 empregos. No Rio, foram fechadas 137.740 postos entre janeiro e novembro. Em São Paulo, foram registrados 254.040 desligamentos no período.

Emprego industrial recua
Outra pesquisa divulgada ontem, do IBGE, mostrou que o emprego na indústria caiu 7,2% em outubro, na comparação com o mesmo mês do ano passado. Frente a setembro, a queda foi de 0,7%, no décimo mês seguido de perdas de emprego.

Houve forte redução também na renda dos trabalhadores. A folha de pagamento real — ou seja, o total ganho por todos os trabalhadores da indústria, já descontada a inflação — caiu 0,8% frente a setembro. Na comparação com outubro do ano passado, a queda foi de 10,3%, a maior já registrada na série histórica do IBGE.

Prévia indica que inflação deve fechar o ano próximo dos 11%

• IPCA-15 tem alta de 10,71%, influenciado por preços de alimentos e energia

Lucianne Carneiro e Marcello Corrêa – O Globo

O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), considerado a prévia da inflação oficial, fechou o ano de 2015 em 10,71%, segundo o IBGE. Trata-se do maior nível desde 2002, quando o índice acumulou alta de 11,99%. Alimentos e energia elétrica foram as principais pressões para a disparada dos preços no ano.

Em dezembro, a inflação ficou em 1,18%. É o resultado mais alto para o mês desde 2002, quando havia avançado 3,05%.

O preço da energia elétrica subiu 51,76% e foi a principal influência individual para a alta da inflação em 2015. Com isso, o grupo Habitação, do qual faz parte, acumulou alta de 18,51%, a maior expansão entre os nove grupos de gastos medidos pelo índice. O preço de alimentos e bebidas subiu 12,16% no ano.

Para Marcio Millan, economista da Tendências, o resultado de dezembro confirma a expectativa do mercado financeiro de que a inflação oficial de 2015, que será divulgada em janeiro, ficará em dois dígitos. Millan elevou sua projeção para o IPCA de 2015, de 10,6% para 10,7%. Para o ano que vem, prevê alta de 7%, acima do teto da meta do governo, de 6,5%:

— O resultado é surpreendente. Se a gente olhar projeções de três ou quatro meses atrás, ninguém esperava por isso.

O economista destacou o papel dos alimentos, que só em dezembro subiram 2,02%, respondendo pela principal influência sobre o indicador no mês.

— A primeira análise é o movimento de alta dos alimentos ‘in natura,’ com o choque do efeito do El Niño provocando perdas nas colheitas. Há também repasse do câmbio para o varejo, afetando principalmente alimentos industrializados — disse Millan.

Em relatório, o Itaú Unibanco informou que espera que o IPCA do ano chegue a 10,7%. O banco revisou sua projeção para o índice fechado de dezembro, de 0,97% para 1,02%. Já o Banco Fator destacou, em nota, que o resultado “representa praticamente uma meta de inflação a mais (4,5%) sobre o teto dessa (6,5%)”.

Sete das onze regiões pesquisadas pelo IBGE tiveram alta de dois dígitos na prévia da inflação oficial no ano. O Rio de Janeiro registrou alta de 11,05%.

O IPCA-15 é usado para definir o reajuste do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU). A Secretaria Municipal de Fazenda já informou que o aumento será de 10,71% em 2016.

Troca de Levy por Barbosa provoca temor de recuo

• Novo ministro diz, porém, que manterá foco no equilíbrio fiscal

• Em meio à crise política e à maior recessão em duas décadas, Dilma dá comando da economia a titular do Planejamento, mais alinhado com PT. Empresários e analistas temem volta do modelo expansionista

Após meses de desgaste, Joaquim Levy deixou o Ministério da Fazenda e foi substituído por Nelson Barbosa, que ocupava o Planejamento. A troca foi recebida com ressalvas por empresários e economistas, que temem a volta da política fiscal expansionista. Barbosa, porém, fez questão de afirmar que a política econômica não muda e que o equilíbrio fiscal é prioridade. A Bolsa caiu 2,9% e o dólar subiu 1,43%, para R$ 3,949, com a notícia da saída de Levy. A escolha de Barbosa foi comemorada pelo PT e pela CUT, que espera maior adesão nos protestos contra o impeachment.

Sai Levy, entra Barbosa

• Para buscar confiança do mercado, novo ministro da Fazenda assume defendendo controle fiscal

Catarina Alencastro, Geralda Doca, Martha Beck, Cristiane Jungblut e Washington Luiz - O Globo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff fez ontem a troca que o PT e a área social do governo tanto queriam na equipe econômica. O comando do Ministério da Fazenda saiu das mãos do liberal Joaquim Levy e passou para o desenvolvimentista Nelson Barbosa, até então titular do Planejamento. Preocupado com a reação do mercado a seu nome — muitos economistas e empresários temem que a troca de Levy por Barbosa represente a volta de uma política fiscal expansionista — o novo ministro da Fazenda deu ontem sua primeira entrevista coletiva defendendo as propostas do seu antecessor e garantindo que não haverá uma ruptura. Prometeu compromisso com o rigor fiscal, com a realização de superávits primários (economia para pagar juros) capazes de reduzir a dívida pública, com o combate à inflação e com reformas, começando pela da Previdência Social.

— A política fiscal, a política econômica como um todo, continua na mesma direção. Direção de buscar o reequilíbrio fiscal, controlar o crescimento da dívida pública, de elevar o resultado primário da União, controlar a inflação — disse o ministro, que acrescentou depois: — Com foco no controle das despesas, vamos conseguir produzir os resultados primários necessários para estabilizar a dívida pública e depois reduzir a dívida pública. Com a estabilização fiscal, vamos, de um lado, ajudar o combate à inflação e também acelerar a recuperação do crescimento.

Meta fiscal foi gota d’água
Na tentativa de tranquilizar o mercado que tanto defendeu Levy, Barbosa repetiu várias vezes que o principal desafio do Brasil é o fiscal. As ações de curto prazo, segundo ele, são o pagamento das “pedaladas” de 2015 e a meta de superávit primário prevista para 2016. Ele garantiu que trabalhará para cumprir a meta fiscal de superávit de 0,5% do PIB aprovada pelo Congresso, apesar de o Planalto ter defendido um resultado menor, com abatimentos que, na prática, permitiriam ao governo não fazer qualquer economia em 2016. Perguntado sobre a desconfiança do mercado financeiro a seu nome, afirmou:

— É natural que haja avaliações divergentes do mercado financeiro. Isso se traduz numa flutuação de curto prazo de preços de ativos, mas, à medida que ficar cada vez mais claro que o governo continua na direção do reequilíbrio fiscal, do controle da inflação, essas oscilações vão se dissipar, e as avaliações vão melhorar em relação à economia brasileira.

A saída de Levy vinha sendo anunciada há meses, mas foi acelerada depois de um forte desgaste justamente por causa da meta fiscal de 2016. O ex-ministro queria manter 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB) e condicionou sua permanência a este número. Para que ele fosse atingido, porém, o Congresso previu um corte de R$ 10 bilhões no Bolsa Família.

Com isso, o Planalto saiu do lado de Levy e se alinhou com Barbosa, propondo ao Legislativo a redução da meta para 0,5% do PIB. Menos de 24 horas depois, a agência de classificação de risco Fitch retirou do país o grau de investimento, selo de bom pagador. Levy, então, avaliou que depois de sucessivas derrotas, não tinha mais sentido continuar no governo.

Com pouco tempo para fazer a troca — Levy deixou claro que não permaneceria no cargo por muito tempo — a presidente optou por uma solução caseira. Mas antes mesmo do anúncio do novo nome, interlocutores do Planalto se apressaram em dizer que não haveria qualquer guinada brusca na condução da economia.

— Não vai ter populismo, guinada e nem um retorno à matriz econômica do primeiro mandato — afirmou uma fonte do governo.

Em seu último dia no cargo, Levy divulgou uma carta na qual defendeu seu trabalho durante pouco mais de um ano à frente da Fazenda, indicando ter achado injusto o bombardeio que sofreu por parte do PT, e ressaltando que sua agenda nunca foi excessivamente fiscal.

Em nota, a presidente Dilma agradeceu a dedicação de Levy, que, segundo ela, teve “papel fundamental” no enfrentamento da crise econômica. Para o lugar de Barbosa no Planejamento foi o ex-chefe da Controladoria-Geral da União (CGU), Valdir Simão. Na CGU ficará interinamente o secretário-executivo, Carlos Higino.

Em sua primeira fala como ministro da Fazenda, Barbosa disse que vai trabalhar junto com o Congresso para aprovar as medidas de ajuste fiscal pendentes, como a recriação da CPMF e a DRU (Desvinculação de Receitas da União). Também afirmou que encaminhará a proposta de reforma da Previdência no início de 2016. Ele ainda mencionou a reforma do PIS/Cofins, enviada por Levy à Casa Civil, para simplificar o sistema tributário.

Barbosa citou o trabalho feito conjuntamente por ele e Levy, como a mudança nas regras de pensão por morte, de auxílios sociais e o contingenciamento de R$ 78 bilhões de gastos deste ano.

— Estamos empenhados na redução da inflação, o Banco Central vem adotando as medidas necessárias para trazer a inflação para o centro da meta do período. Esse esforço está em andamento e começará a gerar frutos no próximo ano com a redução da inflação de modo a começar a melhorar o poder de compra das famílias brasileiras — afirmou.

Para lula, levy estava insustentável
Barbosa teve de responder várias vezes sobre as incertezas que sua entrada na Fazenda já começava a gerar. Demonstrando tranquilidade, respondeu calmamente:

— Prefiro não ter o debate sobre política macroeconômica com base em estereótipos ou caricaturas. Estamos aqui não para aprovar ou refutar teses. Estamos focados em resolver os problemas do presente para construir um futuro melhor.

Nos bastidores, o ex-presidente Lula deu aval para a substituição de Levy. Na quarta, ele esteve em Brasília com aliados e disse que a situação de Levy era insustentável:

— Essa divisão não dá mais — disse. Apesar do esforço do novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, de pregar a continuidade do ajuste fiscal tocado por Joaquim Levy, o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, evidenciou ontem que a estratégia do governo por trás da troca de comando é uma mudança gradual na condução da política econômica. Segundo ele, as escolhas do governo são feitas pela presidente Dilma Rousseff e aos ministros cabe executá-las.

— Há um equívoco dos que fazem uma leitura dos caminhos do governo da presidente Dilma. Quem banca a política econômica não é o ministro da Fazenda, quem banca a política econômica é a presidente da República, e ela convoca o ministro da Fazenda para cumprir. Evidentemente que discute com ele, mas se ilude quem aponta um fuzil para este ou aquele ministro. Se agora ela entender que está na hora não de sair do ajuste, mas de modular o ajuste, aí é uma questão pessoal dela — disse, em encontro com jornalistas antes do anúncio oficial da saída de Levy.

Preocupação com crescimento
A declaração explicita o que no entorno da presidente se discutia freneticamente nas duas últimas semanas. Pressionada pelo impeachment, que reforçou a necessidade de aglutinar a base de apoio no Congresso e nos movimentos sociais, e pela mais grave recessão brasileira em 25 anos, Dilma chegou à conclusão de que precisa trabalhar para “tirar a economia do buraco”.

Esta meta embute a percepção de que são necessárias medidas que, ainda que com baixo impacto fiscal, estimulem o crescimento e a retomada dos investimentos e estanquem o desemprego. Porém, este objetivo se chocava com o receituário de Levy, centrado no ajuste fiscal.

Não foi coincidência, desta forma, o fato de que a gota d’água para a saída de Levy tenha sido a discussão da meta de superávit primário (economia para pagamento de juros da dívida) de 2016. Mesmo quando Dilma deu sinal verde para a equipe econômica trabalhar com um número menor, de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB), o agora ex-ministro articulou pessoal e incisivamente com o Congresso a aprovação da meta original de 0,7%.

Com a troca, Dilma fortaleceu ainda o PT e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que pressionaram nos últimos meses pela substituição.

Umas das principais críticas do grupo era a de que Joaquim Levy fazia um discurso muito parecido com o do mercado financeiro e das agências de classificação de risco, focado nos problemas e nas dificuldades de passar o ajuste, esquecendo de ressaltar que o esforço fiscal do governo ao longo de 2016 foi imenso, com corte de despesas em todas as áreas.

Esta corrente do PT, da qual Jaques Wagner é um dos principais integrantes, defendia há meses que Barbosa tinha perfil mais habilidoso para transmitir a mensagem de que o governo não está parado.

Wagner deixou isso claro ontem. Ao comentar o perfil que um ministro tem que ter, disse que não adianta nada ser puramente técnico ou um grande político se não resolver o problema do governo. Em momentos de crise, o ideal é que o portador das más notícias seja sensível:

— Quando você conclui que há um desequilíbrio fiscal e que é preciso fazer uma arrumação não é bom para ninguém. Evidentemente quando você tem que trazer uma notícia que é dura, melhor que quem a traga... O mensageiro tem que ser jeitoso. Mas eu não quero fazer nenhum juízo de valor sobre a atuação do ministro Levy.

Wagner afirmou ainda que tem ido a São Paulo ouvir especialistas da área econômica e representantes do meio empresarial a pedido de Dilma. Segundo ele, “a grande pergunta” é qual o melhor caminho para a economia, para o desenvolvimento do país e para a retomada da geração de emprego.

Colaborou Bárbara Nascimento

Lula e PT comemoram a escolha de Barbosa

• Visão de dirigentes do partido é que Barbosa tem mais sensibilidade para fazer política de desenvolvimento e geração de emprego que Levy

Ricardo Galhardo - O Estado de S. Paulo

A escolha do nome de Nelson Barbosa para o Ministério da Fazenda foi bem recebida tanto pelo PT quanto pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que enxergam no novo ministro a possibilidade de mudanças na política econômica do governo.

“Trata-se de um ministro experiente, com reconhecidas qualidades técnicas, habilidade política e sempre aberto ao diálogo. Minha expectativa é de que, sob a orientação da presidente Dilma, ele sinalize para a população e para o empresariado medidas para a retomada do crescimento econômico com inclusão social, geração de empregos e sustentabilidade, investimentos em infraestrutura e inflação sob controle”, disse o presidente nacional do PT, Rui Falcão.

Lula apresentou Barbosa a empresários e estimulou aproximação com acadêmicosJá o presidente do diretório estadual do partido em São Paulo, Emidio de Souza, lembrou que embora Barbosa seja mais alinhado ao PT do que o antecessor, Joaquim Levy, vai enfrentar dificuldades pelo estado de deterioração da economia nacional. “Não tem milagre na crise econômica brasileira, mas ele encarna uma ideia de economia que representa melhor o que o PT pensa”, avalia o dirigente.

Lula. No Instituto Lula, a escolha foi bem vista. Embora tenha avalizado o nome de Levy, Lula vinha pedindo mudanças no rumo da economia desde agosto, principalmente por motivos políticos. Lula avalia que a forma como o ajuste fiscal foi executado afastou Dilma da base que a elegeu em 2014.

Segundo interlocutores do ex-presidente, há anos Lula prepara o novo ministro para o cargo. Depois de deixar o governo, em 2010, Lula levou o economista para o Instituto Lula, estimulou Barbosa a se reaproximar da comunidade acadêmica e carregava o colaborador em encontros com grandes empresários e representantes do mercado financeiro. Tudo com o objetivo de tirar de Barbosa o “ranço sindical” – ele foi assessor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) – e torná-lo mais palatável ao andar de cima.

Ainda segundo interlocutores de Lula, foi o ex-presidente quem aconselhou Barbosa a manter a discrição e não entrar em disputas públicas.

A nomeação foi saudada ontem no Instituto Lula. “É uma ótima pessoa. Tem experiência em administração pública, sabe da responsabilidade de colocar o País em equilíbrio fiscal, mas tem sensibilidade para fazer a política de desenvolvimento e geração de empregos”, disse Paulo Okamotto, presidente do instituto.

Unidade. No PT, a escolha de Barbosa provocou o raro fenômeno de agradar, praticamente, à totalidade das forças políticas do partido, incluindo as correntes de esquerda.

“Apoiamos integralmente a decisão da presidente Dilma de fazer a substituição do ministro Levy e a escolha de Barbosa. Espero que o eixo da economia agora seja a orientação do programa de governo eleito em 2014, ainda que se possa discutir quais os passos para chegar lá”, disse Carlos Henrique Árabe, secretário de Formação do PT e da corrente Mensagem, a segunda maior do partido.

O deputado Renato Simões (PT-SP), da minoritária Militância Socialista, comemorou nas redes sociais. “Nelson Barbosa é expectativa de diálogo com movimentos sociais que cobram o programa econômico vitorioso nas urnas em outubro passado. Golaço da presidente Dilma para fechar uma semana vitoriosa.”

O nome de Barbosa também agradou, com ressalvas, aos movimentos sociais que foram às ruas na quarta-feira para protestar contra o impeachment. “Preferia o Marcio Pochmann (Unicamp), mas o Nelson Barbosa tem todas as condições de tirar o Brasil dessa armadilha”, disse Raimundo Bonfim, da Central de Movimentos Populares.

Oposição acusa Barbosa de pedaladas

• Para parlamentares oposicionistas, novo ministro aprofundará a crise e desemprego

Ricardo Brito, Daiene Cardoso - O Estado de S. Paulo

Num sinal de que não haverá trégua em relação ao ministro da Fazenda, diferentemente do que ocorria no caso de Joaquim Levy, lideranças de oposição criticaram ontem a escolha do titular do Planejamento, Nelson Barbosa, para o cargo. O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), acusou Barbosa de ser o mentor das “pedaladas fiscais”.

Os oposicionistas sustentam que ele pode aprofundar ainda mais a crise em razão da desconfiança em relação ao seu nome, mas destacaram que o problema está com a presidente Dilma Rousseff, a condutora da política econômica. Para os oposicionistas, a mudança na equipe econômica tem potencial de aumentar o desemprego, a queda nos investimentos e a perspectiva negativa sobre o futuro.

“Na época, ele (Barbosa) estava na Secretaria de Política Econômica e era secretário executivo do Ministério da Fazenda. Assinou portarias que autorizaram as pedaladas no BNDES”, disse Caiado, ao citar o fato de o ministro estar arrolado em um processo no Tribunal de Contas da União (TCU). “O temor agora é em relação às ilusões e mágicas que ele irá desenvolver, a exemplo das pedaladas, o que pode aprofundar ainda mais a crise”, disse Caiado.

Rebaixamento. Ele lembrou também que a saída de Levy acontece dias após o rebaixamento do País pela agência de classificação de risco Fitch. “A saída de Levy demonstra o fracasso da tentativa do governo de ludibriar o mercado colocando um nome de respeito como fachada da política econômica, quando, na realidade, não estava interessado em mudar nada. Usaram o Levy como forma de tirar a atenção. Todos os equívocos na máquina pública que trouxeram o País a esta crise permanecem”, afirmou.

O líder do PSDB na Câmara, Carlos Sampaio (SP), disse que a escolha de Barbosa pode aprofundar a recessão com todos os efeitos desemprego, queda nos investimentos e incertezas sobre o futuro. “É uma indicação ruim, de que a presidente Dilma continuará interferindo na política econômica e reforça também a manutenção do modelo que mergulhou o país nesta crise sem precedentes”, criticou Sampaio, ao destacar que Barbosa responde pelas pedaladas comprovadas pelo TCU e que seriam base para o impeachment de Dilma Rousseff.

Para o tucano, a ida de Barbosa para a Fazenda revela também que a presidente não tem "peças de reposição", já que ninguém quer fazer parte de um governo que está com os dias contados com a presidente prestes a sofrer um impeachment.

O líder do PSDB do Senado, Cássio Cunha Lima (PB), disse que não adianta trocar “Joaquim por José nem por Antônio muito menos por Nelson”. “O problema não está no nome de quem vai ocupar o ministério, mas na política econômica equivocada patrocinada pelo desgoverno da presidente Dilma.”

Merval Pereira: As razões do rito

- O Globo

A decisão do plenário do STF foi uma surpresa para mim e certamente para o ministro Edson Fachin, que baseou seu voto num consenso que supostamente haveria no plenário, tanto que mudou muito do que já havia anunciado logo que deu a liminar suspendendo o processo em andamento na Câmara.

Na verdade, havia uma tendência de mudar pouca coisa no rito de 1992, quando do impeachment do ex-presidente Collor. O ministro Fachin manteve esse rito, com duas mudanças que, pelas circunstâncias políticas atuais, mostraram-se cruciais: manteve a escolha da comissão da Câmara já feita, e mudou o entendimento de que o Senado poderia não aceitar a denúncia da Câmara.

Fachin achou que os pontos deveriam ser atualizados. A Câmara já resolvera internamente o rito para escolha da comissão, e, embora em 92 a escolha tenha sido por voto aberto, e a lista tivesse sido feita pelos líderes, a maioria desta vez decidira pelo secreto; Fachin achou que o STF não deveria se imiscuir em decisões internas da Câmara, no que acho que ele tem razão.

Na questão do papel do Senado, ele mudou o entendimento de 1992 para se ater ao artigo 56 da Constituição, que diz que o Senado “julgará” o impeachment depois de autorizado o processo pela Câmara. Os ministros de 1992 entenderam que o texto de outro artigo, o 52, em que está dito que o Senado “processará e julgará”, significava que ele tinha condições de recusar a decisão da Câmara, em vez de entender o “processará” como uma ação burocrática de encaminhamento do processo ao julgamento.

Essa interpretação foi ratificada pela maioria do plenário atual, liderado pelo ministro Luís Roberto Barroso, que abriu a divergência. A diferença é que em 1992 não havia disputa política, e tudo foi feito quase que no automático. Não houve nenhuma discussão sobre o papel do Senado, porque não havia dúvida de que o Senado também aprovaria, como aprovou em questão de horas.

A comissão da Câmara foi eleita por aclamação, e os líderes indicaram os componentes da chapa sem brigas políticas. Fachin entendeu que, num momento de disputa política intensa, o Supremo teria que tomar algumas providências para evitar que o presidente da República influencie a decisão do Congresso.

Vários juristas defenderam essa tese, como Diego Werneck Arguelhes e Thomaz Pereira, professores da FGV Direito Rio. Em artigo publicado no site jurídico Jota, chamam a atenção para questões políticas na decisão: “Para um deputado, votar contra a presidente com a certeza de que em seguida ela seria afastada é muito diferente do que fazêlo sabendo que ela poderá, ainda com poderes de presidente, tentar evitar o recebimento pelo Senado. Para um senador, decidir votar contra a presidente em exercício é muito diferente do que fazê-lo contra uma presidente afastada”.

Barroso explica assim a decisão sobre o papel do Senado: “O rito do impeachment perante a Câmara, previsto na Lei nº 1.079/1950, partia do pressuposto de que a tal Casa caberia, nos termos da CF/1946, pronunciar-se sobre o mérito da acusação. Estabeleciam-se, em virtude disso, duas deliberações pelo Plenário da Câmara: a primeira quanto à admissibilidade da denúncia e a segunda quanto à sua procedência ou não”.

“Essa sistemática foi, em parte, revogada pela Constituição de 1988, que, conforme indicado acima, alterou o papel institucional da Câmara no impeachment do presidente da República. Conforme indicado pelo STF e efetivamente seguido no caso Collor, o plenário da Câmara deve deliberar uma única vez, por maioria qualificada de seus integrantes, sem necessitar, porém, desincumbir-se de grande ônus probatório. Afinal, compete a esta Casa Legislativa apenas autorizar ou não a instauração do processo”.

Os ministros que votaram contrariamente ao relator podem certamente alegar que o STF não tem que ver aspectos políticos, só os técnico-jurídicos. O rito de 92, agora referendado pelo plenário do STF atual, segundo depoimento do ex-ministro Sydney Sanchez, que presidiu o processo por ser o presidente do STF, saiu basicamente do trabalho do ministro Celso de Mello, que já fazia parte do STF à época do impeachment de Collor.

Portanto, ele, mais do que ninguém, tinha condição de assegurar que o rito aprovado pela maioria correspondia ao que daria segurança jurídica ao processo.

Hélio Schwartsman: Esticando a incerteza

- Folha de S. Paulo

Uma das coisas difíceis nesta vida é ter poder e encontrar a sabedoria para não exercê-lo. Nesse contexto, acho que o STF carregou um pouco na mão na votação sobre o rito de impeachment.

A tarefa dos ministros, reconheça-se, não era das mais fáceis. Eles precisavam, de um lado, assegurar que o processo transcorra sem pedaladas (desculpem-me, não resisti ao trocadilho) e nos termos da Constituição. E, obviamente, surgem ruídos quando a lei que regula a matéria, a 1.079/50, foi escrita antes da promulgação da Carta. De outro lado, os magistrados tinham de evitar ao máximo interferir sobre outro Poder da República, o Legislativo, que é o que tem a prerrogativa de decidir o destino da chefe do Executivo.

Uma contenção maior do que a demonstrada pela maioria dos ministros teria sido, me parece, o melhor meio de cumprir essa dupla missão. O Judiciário deveria interferir apenas diante de violações muito flagrantes aos termos vagos em que o processo é descrito na Constituição. A razão para isso é que pequenas variações no rito tendem a ser pouco importantes, já que, ao fim e ao cabo, uma decisão contra a mandatária terá necessariamente de ser tomada pelo voto aberto de pelo menos 2/3 dos deputados e, depois, se for o caso, de 2/3 dos senadores. O que ocorre no meio do caminho acaba sendo superado por essas votações.

Isso foi a teoria. Na prática, embora governo e aliados estejam comemorando a decisão, ela poderá revelar-se-lhes bem menos positiva um pouco mais adiante. Minha impressão é que, se o impeachment fosse a votação hoje, Dilma Rousseff venceria tanto na Câmara como no Senado. Amanhã, nós já não sabemos. O que sabemos é que a situação política é instável e a econômica ainda pior. É improvável que Dilma se fortaleça em meio a uma bagunça dessas. E o que o Supremo, provocado por um partido aliado do Planalto, acabou fazendo foi esticar o processo.

Dilma nas mãos de Renan – Editorial / O Estado de S. Paulo

A quinta-feira passada foi um dia de importantes vitórias para a presidente Dilma Rousseff. O processo de impeachment ganhou novos e sólidos obstáculos no Supremo Tribunal Federal e no Congresso. Além disso, o PMDB rachou de vez, exatamente como Dilma queria, fragilizando o grupo do vice-presidente Michel Temer, herdeiro de seu cargo em caso de impeachment.

Acuada por uma imensa crise que expõe a cada dia sua incapacidade de permanecer na Presidência, Dilma deve ter mandado soltar rojões e abrir champanhe para comemorar o raro triunfo. No entanto, sem querer azedar a festa da presidente, é preciso dizer que o único resultado concreto dos acontecimentos da quinta-feira é que a presidente, na prática, se tornou de vez refém do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Alvo de seis inquéritos no âmbito da Lava Jato e com um currículo que inclui uma renúncia à presidência do Senado para escapar da cassação, Renan passou a ser o principal avalista de Dilma no Congresso. É evidente que o senador alagoano tem todo interesse em proteger a presidente, pois espera reciprocidade. Se esse arranjo vai funcionar ou não, é impossível saber, mas há coincidências que ajudam a traçar algumas perspectivas.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, está sendo especialmente célere e duro no que diz respeito ao processo contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), reconhecido como o grande desafeto de Dilma no Congresso. Não apenas denunciou o deputado no Supremo, sob acusação de receber propina no caso da Petrobrás, como agora pediu o afastamento de Cunha da presidência da Câmara, argumentando que o parlamentar transformou a Casa em “balcão de negócios” e que usa seu cargo para proteger a “organização criminosa” que integra.

Há evidências mais do que suficientes para considerar que Janot tem razão em todas as suas denúncias, e por esse motivo Cunha não só deveria ter sido afastado de seu cargo há tempos, como certamente já deveria ter perdido o mandato. No entanto, o procurador-geral não tem sido tão diligente quando se trata do caso de Renan Calheiros – que, assim como Cunha, tem contra si carradas de denúncias.

Em delação premiada, devidamente homologada pelo Supremo, o ex-diretor da Área Internacional da Petrobrás Nestor Cerveró disse que intermediou pagamento de propina para Renan, fruto de desvio de vários contratos da estatal. Versão semelhante foi dada por outro delator, o lobista Fernando Baiano. Além disso, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa disse em delação premiada que Renan recebia uma parte dos contratos da Transpetro, subsidiária da estatal, quando esta era presidida por Sergio Machado – que ocupava o cargo por indicação pessoal do senador alagoano.

Apesar dessas e de outras suspeitas, Janot ainda não ofereceu denúncia contra Renan – e esse delongamento, motivado sabe-se lá por quais razões, tem sido muito conveniente tanto para o senador quanto para Dilma.

Sem ser incomodado pela Justiça, Renan, associado a Dilma e ao ex-presidente Lula, está à vontade para articular o enfraquecimento de Michel Temer, à luz do dia. A presidente, com a ajuda do senador, interferiu pessoalmente na escolha do líder do PMDB na Câmara, atuando em favor do grupo que se opõe a Temer e ao impeachment. Além disso, Renan ajudou a aprovar, no Senado, requerimento para que se investigue se decretos assinados pelo vice no exercício da Presidência ferem a Lei de Responsabilidade Fiscal. Por fim, Temer está cada vez mais isolado no PMDB e corre o risco de ser afastado da presidência do partido e de se inviabilizar como alternativa a Dilma.

Tudo nesse contubérnio pode parecer muito astuto, mas o fato é que, para se manter na Presidência, Dilma entregou anéis e dedos a Renan Calheiros – a quem cabe dirigir, no Senado, um eventual processo de impeachment. Enquanto o senador não tiver de finalmente prestar contas à Justiça, está nas mãos dele o destino da presidente.

STF aumenta responsabilidade do Planalto – Editorial / O Globo

• Dilma ganha oxigênio com rito do impeachment avalizado pela Corte, cai expectativa de alternância no poder, mas ela precisa melhorar rendimento do governo

A definição do rito de impeachment estabelecido quinta-feira pelo Supremo foi um alívio para a presidente Dilma, depois do susto com o voto do relator, ministro Edson Fachin, proferido na véspera. O ministro havia suspendido, por decisão liminar, a partir de reclamação do PCdoB, os passos iniciais dados no processo do pedido de impedimento da presidente, aceito pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

Cunha acolheu o pedido encaminhado pelos juristas Hélio Bicudo, fundador dissidente do PT, Miguel Reale Jr. e Janaína Paschoal, e levou ao plenário a montagem da comissão que avaliará a consistência da reclamação contra Dilma. Entre manobras, tapas e palavrões, elegeu-se, para a comissão, um grupo de deputados oposicionistas. O PCdoB reclamou, Fachin concedeu a liminar e levou a questão ao Pleno da Corte.

Como se comprometeu na sabatina pela qual passou no Senado para ser confirmado ministro do Supremo, o juiz Fachin, embora tenha feito campanha para Dilma em 2010, redigiu um parecer isento, técnico. Tanto que contrariou o Planalto. Entre outros pontos, manteve o voto secreto na escolha dos membros da comissão — forma de preservar deputados da retaliação palaciana —, permitiu candidaturas avulsas à comissão e não concedeu poder ao Senado, onde será julgado o impeachment, de simplesmente rejeitar o processo recebido da Câmara, sem votá-lo em plenário.

Na quinta, logo no primeiro voto da sessão, o ministro Luiz Barroso deu o tom do veredicto final: o Senado pode, em votação prévia, não aceitar o processo; a constituição da comissão na Câmara tem de ser por voto aberto e não pode haver chapa avulsa, e ela precisa ser constituída por indicados pelos respectivos líderes dos partidos.

Justifica-se o desafogo no Palácio, mesmo que não tenha vingado a proposta governista de Dilma fazer uma defesa prévia ainda na fase de tramitação na Câmara. O ministro Gilmar Mendes, um dos derrotados no julgamento, identificou na decisão pelo voto aberto na Câmara, na criação da comissão do impeachment, uma manipulação do STF. Mas é preciso reconhecer os mesmos embasamento técnico e seriedade nos votos dos discordantes de Fachin.

Dilma ganhou fôlego, mas também desafios. Porque, se o rito definido pela Corte contrariasse os interesses do Planalto, cresceria uma expectativa de alternância no poder para antes de 2018. Como isso não ocorreu, resta a ela voltar-se desde já e com mais afinco a governar com um mínimo de competência. O que não tem feito.

Há ainda amplo campo de incertezas à frente de Dilma. Por exemplo, a fragilidade do aliado Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado, dentro da Lava-Jato, e o próprio agravamento previsível da crise econômica, a se refletir em mobilizações de rua. O veredicto do STF soterra a ideia palaciana de acelerar o impeachment, para evitar reflexos políticos da quase certa deterioração do quadro econômico. Mas ela recebeu oxigênio.

Demétrio Magnoli: Fim de jogo

- Folha de S. Paulo

O pedido de impeachment assinado por Miguel Reale Jr., Hélio Bicudo e Janaina Paschoal reduziu-se a papel de embrulho. O ato de reciclagem aconteceu no STF, na quinta (17). As decisões da maioria da Corte encerram uma etapa e ilustram a profundidade da crise institucional à qual o país foi conduzido ao longo de 13 anos de lulopetismo.

Luís Roberto Barroso é o principal expoente brasileiro da vertente radical do neoconstitucionalismo, uma escola de pensamento que atribui aos juízes a prerrogativa de tomar o lugar dos representantes eleitos e reescrever as leis segundo valores morais genéricos implícitos na Constituição. Sob o comando de Barroso, constituiu-se na sessão do STF uma maioria disposta a elaborar novas leis e, ainda, a produzir normas infralegais sobre os trabalhos parlamentares. Os juízes trataram os deputados como infantes barulhentos no recreio escolar. No fim da operação, cassaram os poderes da Câmara, transferindo-os para o Senado.

O STF deliberou que a Câmara não pode eleger como quiser uma comissão meramente destinada a emitir uma opinião preliminar sobre o processo de impeachment. Faltou apenas decidir sobre a duração exata das sessões parlamentares e a cor das gravatas que devem exibir os deputados. Mas, sobretudo, ao determinar que o Senado tem o direito de rejeitar liminarmente o início do julgamento de um impeachment aprovado pela Câmara, os juízes-legisladores promulgaram uma nova Constituição. Rebaixando a Câmara ao estatuto de órgão de assessoramento do Senado, fundaram um sistema unicameral peculiar no qual o Poder Legislativo coagula-se nos representantes das unidades federativas, com exclusão dos representantes do povo.

A ironia é dupla. De um lado, a maioria do STF faz um agrado aos senadores, que dispõem da palavra final na aprovação dos integrantes da Corte Suprema e usaram tal poder para sacramentar os nomes de juristas engajados no sequestro das atribuições parlamentares. De outro, a cassação coletiva dos direitos dos deputados reflete a desmoralização autoinfligida da Câmara, que permanece sob a presidência de uma figura do quilate de Eduardo Cunha. Barroso e seus seguidores não ousariam derrubar estátuas sagradas e dançar uma rumba sobre as ruínas se os nobres deputados não escarrassem no chão ou dirigissem embriagados na contramão.

Fim de jogo. A denúncia do impeachment, plantada no solo salgado das "pedaladas fiscais" e irrigada pela água suja do pacto de conveniência entre as oposições e Eduardo Cunha, nunca dialogou com a indignação popular contra um governo mentiroso, corrupto e incompetente. Agora, ela está morta, pois não tem nenhuma chance de ultrapassar a muralha de um Senado investido de poderes absolutos. O PSDB pode resmungar, até bufar, exercendo o direito universal ao esperneio, mas iludirá a si mesmo se não reconhecer que cultivou a semente errada, de modo equivocado. Os juízes salvaram a presidente não porque a idolatram, ou por serem petistas, mas para ocupar um círculo de poder incendiado pelos representantes do povo.

As exéquias do impeachment malogrado se estenderão além das festas, para júbilo de uns e lancinante angústia de outros, até a hora do enterro anunciado. O longo ritual não implica a salvação disso que, impropriamente, continua a ser batizado como governo. A Lava Jato aperta o cerco em torno do núcleo do poder, estilhaçando a aliança profana entre o lulopetismo e o alto empresariado. A falência do projeto articulado à volta de Michel Temer fragmenta o PMDB, dividindo a antiga base governista em facções irreconciliáveis. A economia submerge, golpeada pelo fracasso do ajuste fiscal e afogada na maré imunda da inflação. A política econômica, já sem rumo, agora perdeu o patético timoneiro que se fantasiava de Deus.

No meio do caos, é tempo de falar sério. Só pra variar.
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Demétrio Magnoli, sociólogo

José Antonio Segatto*: Despertando demônios

- O Estado de S. Paulo

Os recentes atentados terroristas promovidos pelo Estado Islâmico (EI) e grupos ou seitas similares (Al-Qaeda, Taleban, Frente al-Nusra, Al Shabaab, Ansar al Sharia, Boko Haram) na França, Turquia, Líbano, Mali, Líbia, Tunísia, Egito, Iêmen que chocaram o mundo - divulgados como atos espetaculares e/ou fantásticos, por parte de certos órgãos da mídia global - não devem ser compreendidos como uma simples reação de seitas político-religiosas fundamentalistas contra o Ocidente cristão e democrático, como muitos ideólogos ou governantes querem fazer parecer. Ou ainda como um epifenômeno do "choque de civilizações", como quis Samuel Huntington.

Quais seriam os elementos explicativos para tais atos? Seu entendimento, cremos, envolve um conjunto complexo de fatores histórico-políticos, tanto no passado longínquo e/ou secular, quanto hodierno.

Para não recuar muito na História, pode ser mencionada o modo como foram organizados os Estados nacionais no Oriente Médio no pós-guerra, em 1918, com a dissolução do Império Otomano. Inglaterra e França redesenharam as fronteiras da região, criando países artificiais, no mais das vezes sem nenhuma tradição, coesão ou fundamento histórico. Há casos em que o poder foi instituído a partir de tribos e clãs nômades do deserto, por meio de monarquias teocráticas, com a invenção de dinastias ou casas reais. Seu poder e seu domínio foram impostos, em geral, por força e coerção e garantidos pela submissão aos interesses das potências (EUA e Europa) e aos monopólios da indústria petrolífera e armamentista. Na África Setentrional e do Nordeste e na Ásia Central o processo foi similar, com governos de reduzida legitimidade, regimes opressores e iníquos, tirânicos ou autocráticos. Isso criou situações de permanente instabilidade e conflitos contínuos (étnicos, religiosos, políticos, etc.).

Outro fator, este mais contemporâneo, foram as crescentes intervenções norte-americanas na região. Desde fins dos anos 1970 o governo dos EUA, via órgãos diplomáticos ou militares e agências secretas de segurança, intensificaram ações, comuns desde a 2.ª Guerra, para garantir seus interesses econômicos e geopolíticos. Um insuspeito economista, Jeffrey D. Sachs, analisando essas operações afirmou há pouco que “a CIA recrutou em grande escala membros de populações muçulmanas (inclusive na Europa) para formar Mujahidin, uma força de combate sunita multinacional mobilizada para expulsar infiéis soviéticos do Afeganistão”. E observou também que, ao fomentar a concepção fundada na eclosão da jihad “para defender as terras do Islã (...) contra forasteiros, a CIA produziu uma força de combate inicial – e a ideologia que a motivou – que hoje ainda forma a base das insurgências jihadistas sunitas, incluindo o EI. O alvo original dos jihadistas era a União Soviética, hoje são EUA, França, Reino Unido e Rússia”.

Essas condições e esses desígnios foram agravados e potencializados com as ações e intervenções militares americanas e europeias a partir dos anos 1990 e no início do século 21. Ao desestabilizar ou depor governos e governantes (Afeganistão, Iraque, Líbia, Iêmen, Síria, etc.), tais operações provocaram um vácuo de poder ou destruíram, em alguns casos ou áreas, o que havia de Estado organizado. Isso facultou a liberação de espectros ideológicos extemporâneos e a ressurreição de concepções e atitudes fundamentalistas e/ou messiânicas há séculos adormecidas, que irromperam com uma brutalidade e um ódio inauditos – despertando demônios. Ainda que com elementos antediluvianos, essas concepções ganharam organicidade, manifestando-se na forma e por métodos terroristas. Seus alvos: as relações mercantis, os símbolos do capitalismo, as normas da modernidade laica, os valores da civilização ocidental e as tentativas de impô-los, seja pelo convencimento, seja pela força.

Suas ações, estruturação e difusão não ficaram circunscritas à região de origem. Encontraram condições de desenvolvimento excepcionalmente propícias no âmbito europeu, sobretudo na França, na Bélgica, na Inglaterra, países com significativa população de muçulmanos, advinda das ex-colônias. Migrantes, refugiados, descendentes, cidadãos de segunda e terceira categorias, tratados como estrangeiros, discriminados pela origem e vítimas da islamofobia, jovens sem perspectivas ou oportunidades, marginalizados e abandonados à própria sorte, tornaram-se alvo do aliciamento e da sedução dessas seitas sectárias e fundamentalistas. Os subúrbios de Paris, Bruxelas, Londres são hoje incubadores do extremismo jihadista.

A reação de EUA, Inglaterra, França e aliados não foi menos atroz e desarrazoada. A resposta ao terror foi dada no mesmo tom, informada e guiada pelo princípio do “olho por olho, dente por dente”. Especialmente durante o governo Bush, retomaram-se os velhos paradigmas baseados na força militar, na supremacia político-econômica dos EUA e nas noções de “guerra justa”, “missão civilizatória”, “exceção permanente”, etc. – o que serviu para alimentar a ira, acirrar os conflitos e disseminar o terror de parte a parte.

Na nova fase histórica aberta com o processo de globalização, foram criadas inúmeras possibilidades de renovação democrática na ordem mundial, como, por exemplo, a delimitação e/ou o refreamento de poderes dominantes, o fortalecimento de organismos mediadores das relações internacionais, o estabelecimento de premissas garantidoras da paz e reguladoras de conflitos pelo direito internacional, a implantação de uma plataforma de valores universais. Essas poderiam ser, de fato algumas das proposições básicas a partir das quais se poderia eliminar a violência e o terror e confinar os demônios de todos os tipos e classes, posições e partidos, nacionalidades e etnias, religiões e doutrinas, concepções e ideologias – caso contrário, a humanidade continuará convivendo com o pânico, sobressaltada e assombrada pelos espectros demoníacos.
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* José Antonio Segatto é professor titular de sociologia da Unesp