quarta-feira, 8 de agosto de 2018

FMI aponta que Brasil precisa acelerar ajuste fiscal: Editorial | Valor Econômico

O Fundo Monetário Internacional, em sua revisão anual da economia brasileira, insistiu novamente, e com maior ênfase, na necessidade de acelerar o ajuste fiscal brasileiro. A dívida pública é muito alta, continua crescendo e é o principal ponto de vulnerabilidade diante de incertezas domésticas e externas. Turbulências nas duas frentes podem jogar o país de novo em recessão.

Desta vez o Fundo recomenda políticas específicas para acelerar o equilíbrio fiscal. A instituição não vê com bons olhos o aumento do déficit primário em 2018 - previsão de 2,4% ante 1,8% em 2017 - e sugere áreas de possíveis cortes. A mais óbvia delas é a montanha de 4% do PIB de subsídios e isenções fiscais. A outra reside na folha de salários do funcionalismo dos três níveis da federação. Apesar do número de servidores públicos não ser excessivo, sua remuneração é. O gasto total com salários no país é de 13% do PIB, superior a 10% dos países ricos, a 9% dos países emergentes e bem mais alto que os 8% dos países da América Latina.

Há um prêmio de mais de 50% para os salários dos funcionários públicos em relação aos do setor privado, especialmente para pessoas com baixos níveis educacionais. Levando-se em conta o sistema de aposentadoria mais generosa do setor público, essa diferença é ainda maior. Tudo isso coloca os servidores no batalhão dos 40% de maior renda no país - 80% dos funcionários federais estão nele e 55% dos funcionários estaduais e municipais.

O Fundo considera "essencial" para a sustentabilidade fiscal segurar as despesas com pessoal e indica que para obter uma economia de 0,5% do PIB seria preciso congelar os salários do funcionalismo e suspender admissões por 5 anos. Seria uma proeza inédita na história brasileira e uma missão quase impossível, considerando-se a composição do Congresso atual e do próximo, com predomínio dos partidos fisiológicos. A simples proposta de adiamento dos aumentos salariais foi derrotada na votação do orçamento de 2018, assim como a de aumentar a contribuição previdenciária para servidores que recebem acima do teto do INSS.

O ajuste fiscal necessário até 2023 é da ordem de 4,5% do PIB. A reforma da previdência é crucial para isso, assim como, na visão do Fundo, limitar os reajustes do salário mínimo à variação da inflação. O FMI considera também possível obter ganhos da ordem de 0,5 a 1 ponto percentual do PIB com um pente fino, que já vem sendo feito, nos gastos e ajuste no foco de rubricas como a do abono salarial.

A instituição considera importante, pelo lado da receita, pôr ordem na algazarra de impostos, com uma reforma que harmonize os regimes tributários de Estados e municípios. Para o manejo dos gastos, reitera que é preciso acabar com as vinculações no orçamento e rever algumas das regras tributárias, como aquelas que permitem a pessoas físicas constituir empresas com o fim de pagar menos impostos.

O Fundo sugere mais aperto fiscal e indica que a política monetária, caso o ajuste seja mais severo de fato, pode ser mais frouxa se houver contração da economia - desde que a inflação se comporte dentro das metas. Mas também não hesita em prescrever aumento dos juros se a política fiscal se revelar expansionista em 2019, já sob a égide do novo governo.

A dívida pública bruta, que deve fechar este ano em 88,2% do PIB subirá a 95,6% em 2023 e é esse longo período, até que se comece a gerar superávits primários, que coloca o Brasil na linha do azar. As reformas precisam andar sob pena de a economia entrar em crise de novo.

O primeiro risco é o de o próximo presidente não ter o desejo ou apoio no Congresso para levar à frente essa agenda. Nesse caso, "os investidores podem perder a confiança na sustentabilidade da dívida, levando a uma desvalorização do real, aumento nos yields dos papéis da dívida soberana, aperto nas condições financeiras e, possivelmente, recessão". Esse cenário pode se materializar até mesmo antes das eleições, caso candidatos que rejeitem as reformas liderem as pesquisas.

O segundo risco é o aumento da aversão ao risco nos emergentes, em função do aumento dos juros nos EUA. Há ainda um terceiro risco, decorrente da guerra comercial (sem usar essas palavras) de Trump. O Brasil pode ser vítima de um choque comercial.

No Brasil, o FMI dá prioridade absoluta à correção da trajetória da dívida pública. A maioria dos candidatos à Presidência têm essa percepção, o que é meio caminho andado para enfrentar o desafio.

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