Dora Kramer
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Regra geral, o presidente Luiz Inácio da Silva poderia ser menos áspero no uso das palavras. Mas não deixa de ter razão quando chama de “hipócritas” e “oportunistas” os políticos que fazem oposição para as câmeras das emissoras do Congresso e, na hora de ir às ruas pedir votos, são lulistas desde criancinhas.
Se o presidente não estivesse nadando de braçada na avaliação popular, os que hoje se aconchegam para tirar proveito da situação certamente estariam procurando manter dele uma prudente e amazônica distância.
Como de resto parte permaneceu no ataque durante o primeiro mandato até depois da crise do mensalão, quando ainda não era claro se haveria mais quatro anos de Lula outra vez, e parte deixou para mudar de opinião na hora de subir no primeiro palanque da campanha municipal.
Caso a situação venha a se inverter e, por exemplo, um candidato da oposição se converta na expectativa mais viável de poder, Lula voltará a ter os defeitos de sempre.
Por enquanto é um homem perfeito, espontâneo, patrono do idioma do povo, um gênio. Político não briga com pesquisa nem afronta o poderoso, principalmente se há perspectiva de ficar ainda mais poderoso.
É o que se observa na ofensiva dos correligionários do candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo, Geraldo Alckmin, quando acusam o oponente Gilberto Kassab de fatos sobre os quais sequer teve ingerência. Ou pelo menos não exclusiva.
O nome que ninguém ousa pronunciar é o do governador José Serra, protegido dos ataques pela dianteira nas pesquisas para a eleição de 2010 e a perspectiva de voltarem todos juntos com ele ao poder central. Na impossibilidade de atirar para o alto, o tucanato atira para os lados.
O líder do PSDB na Câmara, deputado José Aníbal, por exemplo. Deu anteontem duas entrevistas acusando Kassab e o secretário de Governo municipal, Clóvis Carvalho, de quererem destruir o partido e criar “uma zona de sombra” para levar o eleitorado a acreditar que a administração municipal é do PSDB.
“Não é, é do DEM”, diz o deputado, em franca luta livre com os fatos. Quais sejam: Kassab comanda equipe montada por Serra à imagem e semelhança do PSDB na proporção de 80%, não dá um passo fora do roteiro herdado e transfere veleidades de autonomia para quando, e se, for eleito com os próprios votos.
No deserto
Os pretendentes aos cargos de prefeito e seus encorpados padrinhos deixaram a Associação dos Magistrados Brasileiros falando sozinha sobre os candidatos fichas-sujas.
A AMB já divulgou três listas de postulantes com contas em aberto na Justiça. Pesquisou mais de 1.400 nomes de postulantes nas grandes cidades e chegou à conta de 113 processados.
As informações estão na internet, mas o assunto é ignorado até por parte daqueles que abraçaram com vigor a tese da melhor ética no exame da vida pregressa de candidatos.
Sem a indução dos políticos, o debate não prospera. Com isso, ficam desperdiçados o espaço, os instrumentos (inclusive públicos) e a visibilidade que poderiam ser usados para elevar o grau de educação política do eleitor.
Por oportunismo e auto-referência, preferem se esforçar para mostrar o quanto são amigos do presidente Lula do que estreitar genuínos laços de amizade com o eleitorado.
Régua e compasso
Em julho, o governador do Rio, Sérgio Cabral, qualificou de “imbecis” e “débeis mentais” os policiais que confundiram com traficante e mataram um menino de três anos.
Agora, diz que são “safados” e “vagabundos” os cinco médicos que faltaram ao plantão deixando um hospital público sem atendimento no fim de semana.
Todos provavelmente merecem os adjetivos, mas a população merece mais.
Cabral, que já havia tomado emprestado do governador Aécio Neves o figurino mundano cuidadosamente mantido no limite da responsabilidade, vai incorporando o modelo adotado pelo presidente Lula de tratar questões de governo em termos inflamados, quase como um discurso de oposição.
Lula faz sucesso com essa maneira esperta de escapar das cobranças desviando o foco para a “denúncia” dos problemas como se não tivesse sido eleito exatamente para solucioná-los. É um jeito de demonstrar permanente “preocupação” e, assim, manter acesa a chama da identificação popular.
A fórmula seria perfeita, não fora o senão devidamente estabelecido por Abraham Lincoln em sua célebre frase sobre o caráter perecível e a amplitude restrita da ilusão.
Detalhe
Se o PSDB não consegue administrar uma disputa municipal em condições razoáveis, terá trabalho para convencer o eleitor de que está apto a administrar o País de maneira minimamente aceitável.
DEU EM O ESTADO DE S. PAULO
Regra geral, o presidente Luiz Inácio da Silva poderia ser menos áspero no uso das palavras. Mas não deixa de ter razão quando chama de “hipócritas” e “oportunistas” os políticos que fazem oposição para as câmeras das emissoras do Congresso e, na hora de ir às ruas pedir votos, são lulistas desde criancinhas.
Se o presidente não estivesse nadando de braçada na avaliação popular, os que hoje se aconchegam para tirar proveito da situação certamente estariam procurando manter dele uma prudente e amazônica distância.
Como de resto parte permaneceu no ataque durante o primeiro mandato até depois da crise do mensalão, quando ainda não era claro se haveria mais quatro anos de Lula outra vez, e parte deixou para mudar de opinião na hora de subir no primeiro palanque da campanha municipal.
Caso a situação venha a se inverter e, por exemplo, um candidato da oposição se converta na expectativa mais viável de poder, Lula voltará a ter os defeitos de sempre.
Por enquanto é um homem perfeito, espontâneo, patrono do idioma do povo, um gênio. Político não briga com pesquisa nem afronta o poderoso, principalmente se há perspectiva de ficar ainda mais poderoso.
É o que se observa na ofensiva dos correligionários do candidato do PSDB à Prefeitura de São Paulo, Geraldo Alckmin, quando acusam o oponente Gilberto Kassab de fatos sobre os quais sequer teve ingerência. Ou pelo menos não exclusiva.
O nome que ninguém ousa pronunciar é o do governador José Serra, protegido dos ataques pela dianteira nas pesquisas para a eleição de 2010 e a perspectiva de voltarem todos juntos com ele ao poder central. Na impossibilidade de atirar para o alto, o tucanato atira para os lados.
O líder do PSDB na Câmara, deputado José Aníbal, por exemplo. Deu anteontem duas entrevistas acusando Kassab e o secretário de Governo municipal, Clóvis Carvalho, de quererem destruir o partido e criar “uma zona de sombra” para levar o eleitorado a acreditar que a administração municipal é do PSDB.
“Não é, é do DEM”, diz o deputado, em franca luta livre com os fatos. Quais sejam: Kassab comanda equipe montada por Serra à imagem e semelhança do PSDB na proporção de 80%, não dá um passo fora do roteiro herdado e transfere veleidades de autonomia para quando, e se, for eleito com os próprios votos.
No deserto
Os pretendentes aos cargos de prefeito e seus encorpados padrinhos deixaram a Associação dos Magistrados Brasileiros falando sozinha sobre os candidatos fichas-sujas.
A AMB já divulgou três listas de postulantes com contas em aberto na Justiça. Pesquisou mais de 1.400 nomes de postulantes nas grandes cidades e chegou à conta de 113 processados.
As informações estão na internet, mas o assunto é ignorado até por parte daqueles que abraçaram com vigor a tese da melhor ética no exame da vida pregressa de candidatos.
Sem a indução dos políticos, o debate não prospera. Com isso, ficam desperdiçados o espaço, os instrumentos (inclusive públicos) e a visibilidade que poderiam ser usados para elevar o grau de educação política do eleitor.
Por oportunismo e auto-referência, preferem se esforçar para mostrar o quanto são amigos do presidente Lula do que estreitar genuínos laços de amizade com o eleitorado.
Régua e compasso
Em julho, o governador do Rio, Sérgio Cabral, qualificou de “imbecis” e “débeis mentais” os policiais que confundiram com traficante e mataram um menino de três anos.
Agora, diz que são “safados” e “vagabundos” os cinco médicos que faltaram ao plantão deixando um hospital público sem atendimento no fim de semana.
Todos provavelmente merecem os adjetivos, mas a população merece mais.
Cabral, que já havia tomado emprestado do governador Aécio Neves o figurino mundano cuidadosamente mantido no limite da responsabilidade, vai incorporando o modelo adotado pelo presidente Lula de tratar questões de governo em termos inflamados, quase como um discurso de oposição.
Lula faz sucesso com essa maneira esperta de escapar das cobranças desviando o foco para a “denúncia” dos problemas como se não tivesse sido eleito exatamente para solucioná-los. É um jeito de demonstrar permanente “preocupação” e, assim, manter acesa a chama da identificação popular.
A fórmula seria perfeita, não fora o senão devidamente estabelecido por Abraham Lincoln em sua célebre frase sobre o caráter perecível e a amplitude restrita da ilusão.
Detalhe
Se o PSDB não consegue administrar uma disputa municipal em condições razoáveis, terá trabalho para convencer o eleitor de que está apto a administrar o País de maneira minimamente aceitável.
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