quarta-feira, 24 de setembro de 2008

A carapuça de Lula na medida do ministro


Villas-Bôas Corrêa
DEU NO JORNAL DO BRASIL


E m outros tempos e cos- tumes, a esta altura o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, estaria com o pedido de demissão pronto e assinado para entregar ao presidente Lula assim que puder ser recebido no gabinete do Palácio do Planalto.

Lá é verdade que o ministro pode sair pela tangente, alegando que se enrolou num quiproquó por desinformação e que um pedido de desculpas, com o presidente boiando nas águas mansas da felicidade com a escalada dos seus índices de popularidade, a bater recordes que parecem que podem chegar à lua da virtual unanimidade, pode ser e deve ser a saída pela porta dos fundos, olhando para os lados para conferir se os abelhudos não estão na tocaia para badalar o seu momento de infortúnio.

Acontece que Lula pegou pesado e aumentou o constrangimento do ministro. O caso começa com a matéria publicada pela Folha de S.Paulo anun ciando que o governo estava examinando a proposta, apoiada pela União Geral de Trabalhadores (UGT), da liberação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para a compra de ações da Petrobras.

Em cima do laço, o ministro Carlos Lupi, do Trabalho, bateu o martelo confirmando, em entrevista à Rádio CBN, que era favorável à medida que estava sendo examinada pelo governo.

Lula desembarcou em Nova York para o discurso inaugural na Assembléia das Nações Unidas (ONU) sufocado pela irritação com a notícia lida nos jornais durante a viagem e desabafou, sem medir palavras, com extrema violência: "O governo não está preparando no- vas ações da Petrobras. Em momento de crise, a gente não pode tomar nenhuma medida precipitada".

No crescendo foi às nuvens: "Eu acho abominável fazerem manchete irresponsável sobre esse assunto, sem nunca terem conversado comigo, sem que eu tivesse sequer pensado nessa idéia". Na marcha batida, piorou o soneto: "Isso é uma coisa que eu nunca falei. Para dizer que o presidente pensa alguma coisa dessa magnitude deveriam ter a responsabilidade de me consultar, ou de consultar o ministro da Fazenda, ou o presidente do Banco Central ou o ministro do Trabalho".

Mas se o episódio é curioso ao expor o bastidor do governo e as dificuldades de entendimento do maior ministério de todos os tempos, com 38 ministros e secretários batendo cabeça nos corredores superlotados do palácio na Esplanada dos Ministérios, certamente deixará seqüelas, com a UGT estimulada a ativar a mobilização para pressionar o governo a apoiar o ministro do Trabalho, que bate em retirada fugindo da conversa...

Por enquanto, com o vento a favor, Lula passará por cima do incidente, mais para o cômico do que para sério, nas asas tão confiáveis como as do Aerolula do recorde de popularidade em 77.7%. Está com a casa arrumada, dono e senhor do governo e do PT.

Na exemplar competência da entrevista emoldurada na seção Coisas da Política do JB de ontem, o jornalista Tales Faria extraiu do presidente do PMDB, deputado Michel Temer (SP), o roteiro óbvio do segundo maior partido do país, que abandonou o muro para cair nos braços do governo. Em acordo aberto, com a participação negociada às claras no toma-lá-dá-cá. E com a exigência sem novidade, além da sua confirmação pelo presidente do partido: o PMDB quer a vice-presidência na chapa da ministra-candidata Dilma Rousseff.

O que depende de Lula e de mais ninguém. O PT queimou os seus quadros no fogaréu dos escândalos do mensalão e do caixa 2. Os demais aspirantes do segundo escalão já se recolheram aos seus lugares. Não há novidades arranhando a porta. Lula jogará pesado para viabilizar a sua candidata. Antes de conhecidos os resultados da eleição de 5 de outubro para prefeitos e vereadores, qualquer especulação não irá além do palpite. E palpite, como pode confirmar o ministro Carlos Lupi, às vezes queima a língua.

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