Miriam Leitão
DEU EM O GLOBO
Um grande exportador brasileiro para a China me disse que "a China parou de piorar". Alguns projetos de infraestrutura estão começando a sair do papel e isso levará o país a importar commodities que tinha parado de comprar. Mas só a China, porque na visão desse exportador "o Japão está derretendo, a Coreia está ainda caindo e a queda da Europa será funda e longa".
No Brasil, uma das respostas à crise tem sido o Banco Central usar as reservas para o financiamento ao comércio exterior. Agora, vai usar mais US$36 bilhões de reservas para socorrer as empresas que têm dívida externa. Por lei, o BC só pode agir através de instituições financeiras. Detalhe: o empresário Luiz Fernando Furlan me disse que aumentaram o spread nestas operações feitas com linhas do BC, de 1% para 5%. O risco é fazerem a mesma coisa com os US$36 bi para o pagamento da dívida externa das empresas.
No resto do mundo, os países estão tentando, cada um a seu modo, responder a essa crise. Da qualidade da resposta dependerá o futuro após a normalização. O Reino Unido baixou de novo os juros que já estavam no nível mais baixo da história, mas ontem também colheu o menor número de produção industrial desde 1974.
A China continua sendo, talvez por miragem, a economia da última esperança. Só porque se acredita que ela terá de 5% a 6% de crescimento no mar vermelho das previsões sobre os outros países. Mas ela está caindo 13% em 2007 e 10% em 2008. O crescimento está se reduzindo à metade e a previsão é de que o país acumule 20 milhões de desempregados. Isso na parte visível da China, que impõe pela ditadura a proibição de os trabalhadores irem para as cidades. Nos confins da China quem sabe o que se passa? O governo está tentando rever o clima com fortes estímulos fiscais.
A indústria brasileira, depois do tombo de dezembro, ainda está com estoque alto e as vendas de matérias-primas, em alguns casos, chegam a ser de apenas 30%. Janeiro também foi de paralisia nos negócios. Nas conversas com os setores, quando há sinais de melhora, são pequenos. O setor siderúrgico afirma que as encomendas externas começam a aparecer, segundo Marco Polo de Melo Lopes, do IBS. No setor de equipamentos eletrônicos simplesmente não houve encomendas em janeiro, diz o presidente da Abinee, Humberto Barbato. Ele acha que a atividade vai ficar baixa durante todo o primeiro trimestre. Celulares, bens de informática e material elétrico para a construção civil são os que mais sentiram no setor, que em dezembro caiu 40%. Estes seis meses entre setembro e março são o pior momento para nós. E ocorre quando o mundo continua piorando.
Nos Estados Unidos, a tentativa do governo Barack Obama de dar uma resposta rápida já fracassou. Tem estado na defensiva pelos problemas fiscais dos seus nomeados. As emendas protecionistas acabaram com a unanimidade que o pacote pretendia ser. Com o plano aprovado, o dinheiro começará a jorrar para a economia através de redução de impostos e projetos de investimento, mas ele perdeu duas semanas cruciais.
Além da retração de produção para o mercado interno, e da redução das exportações, as empresas brasileiras enfrentam a queda dos preços internacionais que, em alguns casos, é forte. A China chegou a pedir à Vale uma redução de 80% no preço, agora reduziu o desconto para 40%. O níquel, que já foi comercializado a US$55 mil a tonelada, caiu para US$11 mil. Para se ter uma ideia da drástica mudança de preços, o frete pago por uma tonelada de minério de ferro para a China no ano passado era US$110. Agora, está em US$10.
A economia internacional continua vivendo essa drástica alteração dos patamares de preços, de produtos e moedas. Por isso, a recuperação das economias fica mais imprevisível. Siderúrgicas que fecharam altos-fornos, como as de Tubarão, terão que esperar a demanda melhorar lá fora e ainda o grupo no qual estão - no caso a Arcelor Mittal - recuperar-se do baque que enfrentou. A interligação entre economia brasileira e internacional, que funcionou nos bons momentos, agora também funciona, mas para tornar mais difícil a recuperação.
Ontem, a OCDE piorou as perspectivas para o Brasil, a China, a Índia e a Rússia. Os países do Leste Europeu estão vivendo um desastre. A Turquia livrou-se do pior, que foi o colapso financeiro, através de um acordo com o FMI de US$25 bilhões. O governo russo queimou US$100 bilhões de reservas tentando evitar a alta do dólar. Depois desistiu. Agora, está tentando salvar o setor privado, mas as dívidas das empresas superam as reservas de US$386 bilhões. Apesar das altas reservas, o país foi rebaixado esta semana. A queda do preço do petróleo mudou a conjuntura. Após 10 anos, a Rússia terá déficits fiscal e externo. O fiscal pode chegar a 10% do PIB. A Ucrânia terá uma recessão de 6% este ano. Nossa vizinha Argentina entra em 2009 em estagnação, por culpa dos erros de sua política econômica.
Há pouca esperança lá fora. Por isso, o sentimento do nosso exportador de que a China "parou de piorar" - com o qual abro esta coluna - é uma rara esperança. Se for confirmada.
DEU EM O GLOBO
Um grande exportador brasileiro para a China me disse que "a China parou de piorar". Alguns projetos de infraestrutura estão começando a sair do papel e isso levará o país a importar commodities que tinha parado de comprar. Mas só a China, porque na visão desse exportador "o Japão está derretendo, a Coreia está ainda caindo e a queda da Europa será funda e longa".
No Brasil, uma das respostas à crise tem sido o Banco Central usar as reservas para o financiamento ao comércio exterior. Agora, vai usar mais US$36 bilhões de reservas para socorrer as empresas que têm dívida externa. Por lei, o BC só pode agir através de instituições financeiras. Detalhe: o empresário Luiz Fernando Furlan me disse que aumentaram o spread nestas operações feitas com linhas do BC, de 1% para 5%. O risco é fazerem a mesma coisa com os US$36 bi para o pagamento da dívida externa das empresas.
No resto do mundo, os países estão tentando, cada um a seu modo, responder a essa crise. Da qualidade da resposta dependerá o futuro após a normalização. O Reino Unido baixou de novo os juros que já estavam no nível mais baixo da história, mas ontem também colheu o menor número de produção industrial desde 1974.
A China continua sendo, talvez por miragem, a economia da última esperança. Só porque se acredita que ela terá de 5% a 6% de crescimento no mar vermelho das previsões sobre os outros países. Mas ela está caindo 13% em 2007 e 10% em 2008. O crescimento está se reduzindo à metade e a previsão é de que o país acumule 20 milhões de desempregados. Isso na parte visível da China, que impõe pela ditadura a proibição de os trabalhadores irem para as cidades. Nos confins da China quem sabe o que se passa? O governo está tentando rever o clima com fortes estímulos fiscais.
A indústria brasileira, depois do tombo de dezembro, ainda está com estoque alto e as vendas de matérias-primas, em alguns casos, chegam a ser de apenas 30%. Janeiro também foi de paralisia nos negócios. Nas conversas com os setores, quando há sinais de melhora, são pequenos. O setor siderúrgico afirma que as encomendas externas começam a aparecer, segundo Marco Polo de Melo Lopes, do IBS. No setor de equipamentos eletrônicos simplesmente não houve encomendas em janeiro, diz o presidente da Abinee, Humberto Barbato. Ele acha que a atividade vai ficar baixa durante todo o primeiro trimestre. Celulares, bens de informática e material elétrico para a construção civil são os que mais sentiram no setor, que em dezembro caiu 40%. Estes seis meses entre setembro e março são o pior momento para nós. E ocorre quando o mundo continua piorando.
Nos Estados Unidos, a tentativa do governo Barack Obama de dar uma resposta rápida já fracassou. Tem estado na defensiva pelos problemas fiscais dos seus nomeados. As emendas protecionistas acabaram com a unanimidade que o pacote pretendia ser. Com o plano aprovado, o dinheiro começará a jorrar para a economia através de redução de impostos e projetos de investimento, mas ele perdeu duas semanas cruciais.
Além da retração de produção para o mercado interno, e da redução das exportações, as empresas brasileiras enfrentam a queda dos preços internacionais que, em alguns casos, é forte. A China chegou a pedir à Vale uma redução de 80% no preço, agora reduziu o desconto para 40%. O níquel, que já foi comercializado a US$55 mil a tonelada, caiu para US$11 mil. Para se ter uma ideia da drástica mudança de preços, o frete pago por uma tonelada de minério de ferro para a China no ano passado era US$110. Agora, está em US$10.
A economia internacional continua vivendo essa drástica alteração dos patamares de preços, de produtos e moedas. Por isso, a recuperação das economias fica mais imprevisível. Siderúrgicas que fecharam altos-fornos, como as de Tubarão, terão que esperar a demanda melhorar lá fora e ainda o grupo no qual estão - no caso a Arcelor Mittal - recuperar-se do baque que enfrentou. A interligação entre economia brasileira e internacional, que funcionou nos bons momentos, agora também funciona, mas para tornar mais difícil a recuperação.
Ontem, a OCDE piorou as perspectivas para o Brasil, a China, a Índia e a Rússia. Os países do Leste Europeu estão vivendo um desastre. A Turquia livrou-se do pior, que foi o colapso financeiro, através de um acordo com o FMI de US$25 bilhões. O governo russo queimou US$100 bilhões de reservas tentando evitar a alta do dólar. Depois desistiu. Agora, está tentando salvar o setor privado, mas as dívidas das empresas superam as reservas de US$386 bilhões. Apesar das altas reservas, o país foi rebaixado esta semana. A queda do preço do petróleo mudou a conjuntura. Após 10 anos, a Rússia terá déficits fiscal e externo. O fiscal pode chegar a 10% do PIB. A Ucrânia terá uma recessão de 6% este ano. Nossa vizinha Argentina entra em 2009 em estagnação, por culpa dos erros de sua política econômica.
Há pouca esperança lá fora. Por isso, o sentimento do nosso exportador de que a China "parou de piorar" - com o qual abro esta coluna - é uma rara esperança. Se for confirmada.
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