DEU NO VLOR ECONÔMICO
O 3º Programa Nacional dos Direitos Humanos deveria ser apenas uma satisfação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Organização das Nações Unidas (ONU) e aos setores de esquerda desavindos do governo. Em ano de sucessão não dá para dispensar apoios como em início de mandato. O que o governo talvez (há quem diga que sim) não esperasse era armar contra o PNDH um arco de alianças tão diverso quanto improvável.
Teorias conspiratórias à parte, o fato é que de uma hora para a outra o governo virou alvo de militares, católicos e ruralistas, sem falar de outros setores mais ou menos cotados. No Palácio do Planalto tratou-se das reações como uma "flor do recesso" - na falta de notícia, a imprensa teria hiperdimensionado as reações. Prova disso é que o PNDH tucano seria do mesmo calibre, mas não teria provocado a mesma resposta.
Curioso como o PT, quando interessa, busca aval nas boas políticas de Fernando Henrique Cardoso. A discussão sobre o PNDH não é nem uma flor do recesso, que se deixa fenecer, nem a crise que se procura desenhar em função de situações mal resolvidas. Não junta todos os críticos contra todo o decreto. É apenas uma discussão contaminada por meias-verdades, inapetência dos governos para tratar de assuntos recorrentes e esperteza eleitoreiras.
Antes de mais nada, não se trata de uma invenção do governo do presidente Lula e de seu partido, o PT. É uma recomendação da ONU aos países signatários. Pouco ou quase nada se fala do primeiro programa. Não é à toa. Foi um texto preparado às pressas no governo de Fernando Henrique Cardoso só para atender ao aviso da ONU. O segundo é também do governo FHC e em nada ou quase nada fica a dever ao terceiro, agora em discussão.
O aborto é uma questão de divide o país, mais até que a Lei do Divórcio, aprovada no Congresso faz pouco mais de 30 anos após décadas de discussão. A posição da Igreja Católica é conhecida desde sempre.
A questão da revisão da anistia requer explicação melhor do governo, uma vez que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, argumenta ter discutido e feito um acordo, em outros termos, com a Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Antes da assinatura do decreto de Lula.
Por essa razão é que Jobim - segundo disse o ministro a interlocutores - está demissionário, junto com a cúpula das três Forças militares, que teria avalizado o acordo feito por ele com o secretário especial dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi.
De resto, tem razão o secretário Vannuchi quando informa que o texto esteve à disposição dos interessados por mais de seis meses, sem que tenha recebido a devida importância da parte de muitos dos que hoje reclamam. O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, por exemplo, reage instintivamente à parte do programa que trata da reforma agrária. Um bom exemplo são os casos das invasões do Movimento dos Sem-Terra (MST) de áreas da União ocupadas ilegalmente por grileiros.
A realização de audiências preliminares de conciliação poderia não resolver, mas certamente levaria a uma distensão e diminuiria bastante a violência em regiões como o Pontal do Paranapanema. É só separar o que é propriedade produtiva do que é improdutivo e ocupado de forma ilegal. Não se trata de "criminalizar" o agronegócio, para usar uma palavra tão ao gosto dos movimentos sociais e do PT.
Nem todo o governo Lula tem a mesma opinião do secretário Vannuchi sobre a questão da anistia. Avalia-se que não era assunto para ser posto na ordem do dia, mas, tendo sido, há consenso pelo qual é preciso esclarecer a situação jurídica dos 400 mortos e 124 desaparecidos no regime militar.
É homicídio ou não é? Os familiares dos desaparecidos obtiveram certidões de óbito com base na morte presumida de seus parentes. É preciso um esforço do Estado para abrir os arquivos. A punição de torturadores, segundo se avalia em parte do PT, pode ser deixada para o Judiciário.
O ambiente eleitoral não é o melhor conselheiro para a questão. Basta ver tucanos que curtiram o exílio na pele tentando tirar proveito eleitoral do decreto de Lula. Os líderes José Aníbal (Câmara) e Arthur Virgílio (Senado) criticam a diversidade do 3º PNDH, como se o programa do atual governo não tivesse a mesma constituição daquele formulado no governo do PSDB.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
O 3º Programa Nacional dos Direitos Humanos deveria ser apenas uma satisfação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Organização das Nações Unidas (ONU) e aos setores de esquerda desavindos do governo. Em ano de sucessão não dá para dispensar apoios como em início de mandato. O que o governo talvez (há quem diga que sim) não esperasse era armar contra o PNDH um arco de alianças tão diverso quanto improvável.
Teorias conspiratórias à parte, o fato é que de uma hora para a outra o governo virou alvo de militares, católicos e ruralistas, sem falar de outros setores mais ou menos cotados. No Palácio do Planalto tratou-se das reações como uma "flor do recesso" - na falta de notícia, a imprensa teria hiperdimensionado as reações. Prova disso é que o PNDH tucano seria do mesmo calibre, mas não teria provocado a mesma resposta.
Curioso como o PT, quando interessa, busca aval nas boas políticas de Fernando Henrique Cardoso. A discussão sobre o PNDH não é nem uma flor do recesso, que se deixa fenecer, nem a crise que se procura desenhar em função de situações mal resolvidas. Não junta todos os críticos contra todo o decreto. É apenas uma discussão contaminada por meias-verdades, inapetência dos governos para tratar de assuntos recorrentes e esperteza eleitoreiras.
Antes de mais nada, não se trata de uma invenção do governo do presidente Lula e de seu partido, o PT. É uma recomendação da ONU aos países signatários. Pouco ou quase nada se fala do primeiro programa. Não é à toa. Foi um texto preparado às pressas no governo de Fernando Henrique Cardoso só para atender ao aviso da ONU. O segundo é também do governo FHC e em nada ou quase nada fica a dever ao terceiro, agora em discussão.
O aborto é uma questão de divide o país, mais até que a Lei do Divórcio, aprovada no Congresso faz pouco mais de 30 anos após décadas de discussão. A posição da Igreja Católica é conhecida desde sempre.
A questão da revisão da anistia requer explicação melhor do governo, uma vez que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, argumenta ter discutido e feito um acordo, em outros termos, com a Secretaria Especial dos Direitos Humanos. Antes da assinatura do decreto de Lula.
Por essa razão é que Jobim - segundo disse o ministro a interlocutores - está demissionário, junto com a cúpula das três Forças militares, que teria avalizado o acordo feito por ele com o secretário especial dos Direitos Humanos, Paulo Vannuchi.
De resto, tem razão o secretário Vannuchi quando informa que o texto esteve à disposição dos interessados por mais de seis meses, sem que tenha recebido a devida importância da parte de muitos dos que hoje reclamam. O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, por exemplo, reage instintivamente à parte do programa que trata da reforma agrária. Um bom exemplo são os casos das invasões do Movimento dos Sem-Terra (MST) de áreas da União ocupadas ilegalmente por grileiros.
A realização de audiências preliminares de conciliação poderia não resolver, mas certamente levaria a uma distensão e diminuiria bastante a violência em regiões como o Pontal do Paranapanema. É só separar o que é propriedade produtiva do que é improdutivo e ocupado de forma ilegal. Não se trata de "criminalizar" o agronegócio, para usar uma palavra tão ao gosto dos movimentos sociais e do PT.
Nem todo o governo Lula tem a mesma opinião do secretário Vannuchi sobre a questão da anistia. Avalia-se que não era assunto para ser posto na ordem do dia, mas, tendo sido, há consenso pelo qual é preciso esclarecer a situação jurídica dos 400 mortos e 124 desaparecidos no regime militar.
É homicídio ou não é? Os familiares dos desaparecidos obtiveram certidões de óbito com base na morte presumida de seus parentes. É preciso um esforço do Estado para abrir os arquivos. A punição de torturadores, segundo se avalia em parte do PT, pode ser deixada para o Judiciário.
O ambiente eleitoral não é o melhor conselheiro para a questão. Basta ver tucanos que curtiram o exílio na pele tentando tirar proveito eleitoral do decreto de Lula. Os líderes José Aníbal (Câmara) e Arthur Virgílio (Senado) criticam a diversidade do 3º PNDH, como se o programa do atual governo não tivesse a mesma constituição daquele formulado no governo do PSDB.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras
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