De Cancún - O presidente mexicano, Felipe Calderón, fez ontem, por mais de uma hora, um pronunciamento, seguido de debate aberto, com a plenária multinacional da COP 16. Defendendo a participação da sociedade civil para quebrar o impasse nas negociações, ele atestava, indiretamente, a dificuldade para o avanço de um acordo multilateral que salvasse a face de Cancún. Não vai ser fácil.
Até aqui, passados 9 dias do início da Conferência e faltando apenas três para sua conclusão, não há nenhum texto ou rascunho escrito das decisões a serem tomadas. Isso porque a estratégia dos anfitriões é a de manter ao máximo as conversações na informalidade, evitando assim o que se passou em Copenhagen. Lá, o primeiro ministro dinamarquês Hans Rassmussen, antes do inicio da COP 15, negociou um texto preliminar com os EUA e China. A proposta acabou sendo "vazada" pela China para alguns países, o que gerou um caos que paralisou por dias a Conferência, quebrando a confiança nos mediadores.
Os mexicanos tentam uma "fuga para frente", organizando os países chave dois a dois. O Brasil está de par com a Inglaterra, na expectativa de não engessar o processo, deixando o máximo de possibilidades abertas, o que é positivo. Hoje, porém, a onça começa a beber água.
É que algum texto ou rascunho tem que fluir, ainda hoje, desse emaranhado de conversações. Estas, como convivas num jantar, vão muito bem até que chega a hora de pagar a conta. E, na “conta” da COP 16 temos problemas salgados.
O Protocolo de Kioto corre o sério risco de ir para o espaço. Japoneses e europeus relutam em bancar a fase dois de Kioto se os EUA não aderirem. E eles não vão fazer isso tão cedo. Já os americanos, queixam-se de que China, Brasil e Índia, que permanecem com programas e metas voluntárias. Assis, eles não teriam porque aceitarem um acordo que seja vinculante e monitorado pela ONU.
Em outro nível, se os recursos emergenciais do Fundo Clima de US$ 30 bilhões estão praticamamente equacionados, tudo permanece indefinido com relação aos US$ 100 bilhões anuais a serem aplicados de 2020 em diante. Sem falar que vai se tornando consenso que as atuais metas de redução de emissões, em curso e previstas, não irão segurar o aquecimento global abaixo dos dois graus até o fim do século XXI.
Se todos estes obstáculos forem driblados, o que esperar de Cancún? Duas coisas. Uma, a principal, que se vai ter a fase dois de Kioto, preservando o seu arcabouço e processo, ficando a definição das metas para 2011. Em segundo lugar, que se encontre uma fórmula de auditar os programas voluntários dos grandes emergentes mais os EUA, de modo satisfatório para as demais nações, em especial europeus e japoneses.
Há uma imensidão de obstáculos a superar nas próximas 72 horas para que se possa alcançar esses dois objetivos. Não vai ser fácil, mas oxalá dê certo.
* Raul Jungmann é deputado federal, membro da comissão de Relações Exteriores da Câmara e dirigente nacional do PPS.
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