Espanha substitui hoje o gerente da crise econômica, mas sem que o eleitorado espere muito do novo
A Espanha vota hoje dividida em duas grandes tribos: a dos indignados e a dos desiludidos.
Ocioso alongar a explicação sobre os indignados, cujas colossais manifestações a partir de maio tiveram repercussão mundial, a ponto de ativistas espanhóis terem sido chamados (ou se oferecido) para trabalhar, por exemplo, com os indignados gregos.
Um só número basta para explicar a indignação: são 5 milhões de desempregados, 21,5% da população economicamente ativa, recorde europeu. Em situações assim, é impossível que o governo de turno ganhe uma eleição.
Por isso, já se sabe que o vencedor será o líder da oposição, Mariano Rajoy, do conservador PP (Partido Popular).
Aí é que entram os desiludidos: recente pesquisa para o jornal "El País" perguntou aos eleitores se Rajoy inspirava confiança. Uma esmagadora maioria (76%) respondeu "pouca/nenhuma", contra apenas 22% que confiavam "muito" no líder do PP.
Pior ainda foi o resultado para seu adversário socialista, Alfredo Pérez Rubalcaba, que inspirava "pouco ou nenhuma confiança" em 79% dos consultados.
Não é à toa, portanto, que outra pesquisa tenha mostrado que 75% dos espanhóis simpatizam com o protesto dos indignados. Mas é uma indignação silenciosa, como explica o sociólogo Josep Ramoneda:
"Como revelam todas as pesquisas, as pessoas estão deprimidas, pessimistas e assustadas. Com esse espírito, a tendência é aceitar o que imponham os mercados e o diretório europeu, sem reclamar".
De fato, a eleição não escolhe qual é o melhor programa para a Espanha, mas quem será o gerente mais adequado para tocar o programa de austeridade imposto pela União Europeia, sob pressão dos mercados.
É como escreve Fernando Vallespín, cientista político da Universidade Autônoma de Madri: "Somos cidadãos pós-soberanos. Nós nos limitamos a designar um novo líder que fará o que se espera que faça por parte do poder real, o poder econômico, naturalmente".
Até Rajoy assume, indiretamente, que essa é a realidade. Na sexta-feira, último dia de campanha, em vez de pedir votos aos eleitores, mendigou clemência dos mercados: "Esperemos que isto [o aumento do risco-país] pare, que [os mercados] levem em conta que aqui há eleições e que os que ganhem tenham direito a uma margem mínima, que deve ser de algo mais que meia hora".
Patético, mas realista. Afinal, já faz no mínimo um mês que todo mundo sabe que os conservadores ganharão a eleição -e com a maioria absoluta. Conservadores são, em tese, mais indicados que os socialistas para impor medidas de austeridade, ainda que o Partido Socialista Operário Espanhol tenha deixado de ser socialista faz tempo.
Nem assim, no entanto, os mercados deram à Espanha a trégua solicitada agora pelo virtual novo presidente do governo.
Para ganhar mais do que meia hora, a tendência de Rajoy é dobrar a aposta na austeridade. Para os conservadores, é o caminho para a felicidade futura. Mas a história do presente, nos países sob mira dos mercados, mostra que é apenas uma fábrica de indignados e desiludidos.
FONTE: FOLHA DE S. PAULO
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