Em ação coordenada não vista desde o estouro da crise global, em 2008, seis bancos centrais, entre eles os de EUA, Europa e Japão, se uniram para conter o agravamento da crise da dívida na zona do euro. Eles anunciaram corte nas taxas de financiamento, para injetar dinheiro nos mercados. O anúncio, aliado a notícia de que a China aliviou o crédito bancário, fez as Bolsas dispararem. Em Nova York, a alta foi de 4,24%; e em Frankfurt, 4,98%. A Bovespa subiu 2,85%, e o dólar caiu para R$ 1,813
Mutirão de peso contra a crise
Para injetar dinheiro nos mercados, 6 maiores bancos centrais do mundo cortam custo de financiamento. Bolsas reagem com euforia
Vinicius Neder
Seis pesos-pesados da economia mundial se uniram ontem para tentar aplacar os temores de um caos global a partir da crise da dívida na zona do euro. O Federal Reserve (Fed, o banco central americano), o Banco Central Europeu (BCE), e os bancos centrais (BCs) de Canadá, Reino Unido, Japão e Suíça anunciaram que vão reduzir em meio ponto percentual as taxas das linhas atuais de financiamento em dólar, para injetar mais crédito nos mercados. O anúncio foi recebido com euforia, sobretudo na Europa, onde os países da zona do euro enfrentam altos custos de financiamento para seus títulos soberanos. A alta das ações começou cedo, depois que o BC da China cortou, de forma surpreendente, a taxa de depósito compulsório dos bancos pela primeira vez em quase três anos, para aliviar as restrições de crédito. O corte também foi de meio ponto, para 21%.
A última vez que os bancos centrais atuaram de forma conjunta para aumentar a liquidez do mercado financeiro internacional foi em 2008, após a falência do banco de investimentos americano Lehman Brothers. As bolsas reagiram com fortes altas em todo o mundo. Londres subiu 3,16%; Frankfurt, 4,98%; e Paris, 4,22%. Em Nova York, o Dow Jones cresceu 4,24%; o Nasdaq, 4,17%; e o S&P 500, 4,33%. Com o anúncio, o euro avançou 0,9%, para US$1,3435. No Brasil, o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), avançou 2,85%, aos 56.874 pontos, depois de subir 4,14% no momento de maior otimismo durante o dia. No mercado de câmbio, o dólar comercial teve forte queda, de 2%, e fechou a R$1,813, maior recuo desde 27 de outubro.
Em comunicado conjunto, os seis BCs explicaram que o objetivo da medida é aliviar as tensões nos mercados de financiamento, facilitando o crédito às famílias e às empresas. O estímulo ao consumo e ao investimento é tido como essencial para tirar a economia das grandes potências da estagnação e evitar mais riscos de recessão. A participação do Fed na ação conjunta, contudo, dividiu sua diretoria, que não deu aprovação unânime à medida. Mesmo assim, o secretário do Tesouro dos EUA, Timothy Geithner, elogiou a iniciativa:
- Vemos como um bom sinal e apoiamos as ações adotadas hoje (ontem) pelos bancos centrais em todo o mundo para ajudar a aliviar a pressão sobre o sistema financeiro europeu e ajudar a recuperar a economia global.
Efeito é mais psicológico do que econômico
Para analistas, o barateamento dos custos dos bancos para obter dólares tem um impacto limitado, mas oferece um incentivo para elevar o dinheiro em circulação, o que ajudaria na captação de financiamento. Embora não seja a medida definitiva contra a crise, afirmam os especialistas, ela prepara o caminho para futuras ações das autoridades monetárias que têm peso no sistema financeiro internacional. Nesse sentido, o anúncio de ontem gerou expectativas de que saiam novas medidas da reunião do Conselho Monetário do BCE, na próxima semana.
- Isso alimenta a ideia de que as autoridades estão pelo menos começando a lidar com o problema - disse o economista-chefe do ING Group, Mark Cliffe. - Com os cenários ruins dando a tônica nos últimos dias, é mais importante que eles definam medidas agressivas para dar suporte ao sistema bancário e mostrarem que estão começando a confrontar os problemas financeiros das dívidas soberanas também.
Na Bolsa paulista, o otimismo atraiu investidores e o volume negociado foi de R$9,7 bilhões. Apesar da euforia, segundo especialistas, a combinação de notícias positivas foi pontual. A ação coordenada dos BCs teria principalmente o efeito de "ganhar tempo" para uma solução para a crise das dívidas soberanas na Europa, evitando um travamento no crédito interbancário global.
- A ação é emergencial e não elimina a necessidade de novas medidas na zona do euro. O objetivo dos BCs foi evitar um problema de liquidez que começa a existir em escala global - afirmou o estrategista-chefe do banco WestLB, Luciano Rostagno.
Na Bolsa, a alta foi generalizada, com apenas quatro ativos registrando queda. O destaque foi o setor financeiro, devido à ação dos BCs. As ações do Itaú Unibanco PN, por exemplo, subiram 5,98%, a R$31,90, e as units do Santander subiram 5,38%, a R$13,91. Bradesco PN teve alta de 4,55%, a R$29,63, e Banco do Brasil ON, de 4,27%, a R$24,20.
Os papéis da Vale, maior produtora mundial de minério de ferro, tiveram desempenho pior do que o Ibovespa, reagindo à decisão judicial que autorizou o governo federal a cobrar da mineradora impostos de R$25 bilhões. Vale PNA (preferencial, sem direito a voto) subiu 0,46%, a R$39,03. Já Petrobras PN teve alta de 2,99%, a R$22,05.
Em meio à desaceleração da economia brasileira e ao risco crescente de redução da oferta global de crédito ao setor produtivo, o Conselho Monetário Nacional (CMN) baixou ontem regra que permite às instituições financeiras com patrimônio de pelo menos R$5 bilhões e que não possuam uma agência no exterior a captar recursos no mercado internacional e emprestá-los lá fora diretamente às empresas brasileiras. A medida foi desenhada sob medida para o BNDES, principal financiador do setor produtivo brasileiro, uma vez que os bancos privados de grande porte já estavam liberados para este tipo de operação. Uma fonte do BC ouvida ontem pelo GLOBO afirmou que a medida tenta se antecipar a um agravamento da situação internacional.
O mercado de trabalho nos EUA também alimentou o otimismo dos mercados. Relatório da consultoria ADP National Employment em conjunto com a Macroeconomic Advisers, divulgado ontem, revelou que o ritmo de geração de emprego no setor privado do país cresceu em novembro e superou a previsão dos analistas. Foram abertas 209 mil vagas, contra uma expectativa de 130 mil, segundo pesquisa da agência de notícias Reuters. O número de setembro foi revisado de 91 mil para 116 mil vagas.
Na Europa, depois de os ministros de Finanças dos 17 países da zona do euro decidirem na quarta-feira recorrer ao Fundo Monetário Internacional (FMI) para reforçar o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (Feef), ninguém ousava avaliar ontem qual seria o montante que o Feef terá. Há um mês falava-se em 1 bilhão.
- Será menos de 1 bilhão - disse Jean-Claude Juncker, presidente do Eurogrupo.
Já o comissário europeu de Economia e vice-presidente da Comissão Europeia, Olli Rehn, advertiu ontem, na abertura da reunião da Ecofin, que dá prosseguimento à cúpula da véspera, que a Europa está diante dos dias determinantes no que se refere à superação da crise.
- Estamos entrando em um período crítico de dez dias para completar e concluir a resposta da Europa à crise.
(*) Com "El País" e agências internacionais
FONTE: O GLOBO
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