quinta-feira, 29 de março de 2012

A agenda da competitividade

O que aconteceu ontem no Congresso foi apenas uma exceção que confirma a regra: são tão raros os projetos de real interesse do país abraçados pelo governo, que a aprovação de um deles é motivo de destaque e comemoração. Foi o que se deu com a criação da previdência complementar dos servidores públicos federais.

O Funpresp chega com anos de atraso, mas pelo menos chega. Limitar a aposentadoria dos servidores bancada pela União e estancar o déficit da Previdência era parte integrante da reforma proposta nos anos 90 pelo governo Fernando Henrique. Proposta brutalmente rechaçada pelo PT, então ainda na oposição: "Quero admitir que erramos", penitenciou-se ontem, enfim, o senador petista Humberto Costa.

Se a medida já tivesse sido adotada àquela época, cerca de 15 anos atrás, a previdência do setor público talvez não exibisse hoje o gigantesco rombo de R$ 57 bilhões no qual está metida. Os centenas de milhares de funcionários admitidos nos últimos anos já teriam ingressado no serviço público sob novas regras, desanuviando um pouco o futuro da Previdência.

A renitência petista ainda nos cobrará seu preço por anos: estima-se que o novo regime somente permitirá zerar o déficit no longínquo ano de 2047. Até lá, a contribuição de muitos continuará servindo para pagar o benefício de uns poucos - menos de um milhão de ex-servidores aposentados respondem por rombo 60% maior do que o gerado por 28 milhões de segurados do INSS.

Por coerência e convicção, a oposição votou favoravelmente à criação do Funpresp. A base aliada, ao contrário, precisou de agrados para apoiar o governo a que serve: segundo a Folha de S.Paulo, só a liberação de verbas para emendas parlamentares - algo como R$ 3 milhões para cada congressista nos próximos dois meses - possibilitou a aprovação.

Ainda que positivo na essência, o projeto contém vícios deploráveis. Um deles é deixar sob administração pública - portanto, sujeita a enormes interferências político-partidárias - a gestão e o controle dos bilionários recursos dos novos fundos.

"O novo regime previdenciário dos servidores públicos (...) cria um inédito gigante estatal. Poderá tensionar ainda mais os limites entre o público e o privado no país. Fundos de pensão patrocinados pelas estatais já são utilizados hoje pelo governo para intervir em empresas e projetos privados", analisa a Folha.

Outras anomalias indesejáveis são a fragmentação do Funpresp em três fundos (para Executivo, Legislativo e Judiciário) e a adoção de uma alíquota de contribuição patronal, paga pela União, muito acima do que é usual: 8,5%, quando na esfera privada o percentual gira em torno de 5%.

Ainda assim, a criação do Funpresp já representa uma rara boa notícia no deserto de iniciativas positivas do governo Dilma Rousseff. Se quiser perseverar no bom caminho, assuntos e boas propostas para melhorar o país não faltam. A começar pela agenda legislativa sugerida pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), com olhos voltados à diminuição do famigerado custo Brasil.

A lista, divulgada nesta semana, traz 131 projetos de lei em tramitação no Congresso que afetam diretamente a competitividade do setor, tanto de maneira positiva quanto negativa. Há maior convergência da agenda, segundo o Valor Econômico, com propostas defendidas pelo PSDB e pelo DEM. E maior divergência com as do PT. Fica fácil ver quem está a favor do país...

Entre projetos que poderiam ser imediatamente abraçados estão a adoção de novas regras para licitações, mantendo o rigor, mas permitindo sua agilização; a regulamentação das agências reguladoras, de forma a assegurar-lhes maior autonomia e blindar-lhes da ingerência política espúria de que vêm sendo vítimas nos últimos tempos; e a extinção do adicional de 10% sobre o FGTS, que só serve para encarecer ainda mais o custo de mão de obra e engordar os cofres do governo.

Mas, mesmo além da agenda da CNI, há também iniciativas legislativas que poderiam ser imediatas e que são de interesse amplo, geral e irrestrito. É o caso, por exemplo, da proposição de uma nova lei seca.

A decisão tomada ontem pelo STJ sepulta uma iniciativa civilizadora, que pecou pela imperfeição do legislador, mas cujos méritos eram evidentes. É não apenas possível, como desejável, uma convergência no Congresso para restaurar rapidamente o espírito original da lei e seu efeito benéfico sobre o selvagem trânsito brasileiro.

O país está sedento de medidas que melhorem as condições de vida da população, ajudem o Brasil a avançar rumo a um ambiente econômico mais competitivo e a regras de convivência social mais civilizadas. É de se lamentar que esta agenda não exista nos planos do governo.

Fonte: Instituto Teotônio Vilela

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