domingo, 12 de agosto de 2012

As medidas do mal - Míriam Leitão

Corrupção não se mede. É da sua natureza ser fugidia, clandestina, sombria. É dinheiro que escapa pelas franjas, por atores que se escondem e camuflam. O diretor da Transparência Brasil Claudio Weber Abramo acha que os números que aparecem são fantasiosos. Gil Castello Branco, do Contas Abertas, diz que é possível estimar as perdas e que os dados reforçam a luta contra o mal.

A Fiesp calculou entre R$ 50 bilhões e R$ 85 bilhões de perdas anuais no Brasil. Gil pensa que essas estimativas, feitas com base em cruzamento de dados, têm solidez. Existe também o índice de percepção da corrupção. Pesquisas com empresários que fazem negócios no Brasil e com o Brasil. Juntos dariam uma boa ideia da dimensão do problema e são coerentes entre si.

Abramo pensa diferente. Ele analisou os cálculos e diz que as bases de dados são frágeis e que as conclusões não passam por qualquer teste. Isso não o leva à conclusão de que o problema não seja sério.

- Pode custar mais ou menos. Mas existe um problema (no cálculo): base metodológica frágil. O crime é escondido. Estimá-lo é difícil. A melhor opção é dizer: não sei quanto é. Isso não significa dizer que não exista a corrupção ou que não se conheça suas consequências. Um número serve para quê? Para dizer que existe corrupção no Brasil? Ora, isso é óbvio, todo mundo sabe - diz Abramo.

- É difícil quantificar, mas é um referencial. O Banco Mundial faz seu esforço de quantificação, compatível com os dados da Fiesp. O professor Marcos Fernandes, da FGV, somou os casos de desvio no Governo Federal de 2002 a 2008 e chegou à conclusão de R$ 40 bilhões. Essa é a ponta do iceberg. O Brasil é o quarto país em volume de dinheiro em paraísos fiscais. É válido medir e trabalhar com extrapolações. São valores substanciais. É bom ter parâmetro. Esse patamar mínimo do estudo da Fiesp, R$ 50 bi, equivale ao investido pelo PAC I em infraestrutura - rebate Gil.

Um problema e duas visões que coincidem num ponto: é necessário combater o mal. Conversei com os dois esta semana e os entrevistei na Globonews. Um interessante conflito de ideias, porque ambos dão contribuições importantes na luta contra os desvios. Abramo acha que a questão mais interessante é o combate.

- Corrupção é um problema objetivo. Não é subjetivo. Não é um problema moral. A corrupção não acontece porque existe gente desonesta no mundo, mas porque gente desonesta pode agir desonestamente. Tem que se ver as condições institucionais e as práticas administrativas. Um foco de corrupção no Brasil é o excessivo número de indicações políticas dos chefes do Executivo - diz Abramo.

Gil acha que a grande medida a tomar para reduzir a corrupção é a adoção do financiamento público de campanha. Ele admite que já há esse financiamento, através do programa eleitoral e do fundo partidário, mas acha que é possível aperfeiçoar:

- As eleições são caríssimas e isso alimenta o caixa dois. As empresas doam para ter proveito.

- É ilusão achar que isso resolve. Se for proibido o financiamento privado, o caixa um vai virar caixa dois. Já foi tentado em outros países com resultado horroroso - diz Claudio Abramo.

Ele acha que usar cargos públicos como moeda de troca produz outro efeito nocivo: o legislativo deixa de fiscalizar e legislar.

A Transparência Brasil foi quem fez a primeira sugestão para se ter no Brasil a Lei de Acesso à Informação. Abramo lembra que a lei não vai criar informação. Cria condições de acesso. Gil Castello Branco lembra que mesmo com a Lei de Acesso à Informação há dificuldades de se conseguir dados de órgãos públicos e das estatais. E as empresas públicas "movimentam um PIB argentino por ano".

FONTE: O GLOBO

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