No direito brasileiro, toda vez que um juiz condena alguém, ele deve dizer, também, qual será a quantidade da pena imposta, o que deve ser feito para cada crime pelo qual o réu tenha sido condenado. Este é um dos problemas que o Supremo Tribunal Federal (STF) terá de enfrentar no caso do mensalão.
O STF é composto por 11 ministros. Se o ministro Marco Aurélio condenar alguém a um ano de prisão, o ministro Celso de Mello, a dois anos, o ministro Ayres Britto, a três anos ,e dois outros ministros absolverem o acusado, qual seria a pena final definida pelo tribunal? Deve-se fazer a soma das condenações e dividir pelo número de ministros? Deve-se escolher a pena que teve mais adesões de outros ministros como a definitiva? Alguns creem que os ministros não abrirão mão de sua prerrogativa de fixar a quantidade exata de pena para os réus que condenarem. Vai ser fácil saber o voto de cada ministro. Mas vai ser difícil saber o voto do Supremo. E este é o que importa.
A denúncia do mensalão descreve a suposta prática de sete crimes diferentes. Alguns réus respondem apenas por um, outros por dois, e há quem responda por até cinco crimes. Somando-se todos os crimes denunciados pelo Ministério Público, há 98 acusações no processo do mensalão.
Ainda não se sabe se prevalecerá condenação ou absolvição. Mas imaginemos o seguinte cenário: o STF condena todos os acusados. Caso cada ministro resolva fazer o cálculo de cada pena para cada réu que condenou, teríamos a incrível quantidade de 1.078 votos distintos lidos em plenário. Isso mesmo, 11 ministros calculando a pena das 98 condenações resulta em 1.078 votos em um único julgamento! Se já se espera que o julgamento dure meses, assim poderia levar anos... Como fazer para contabilizar todas essas posições e transformá-las em algo claro que reflita exatamente o que foi decidido?
Analisamos na FGV Direito Rio a jurisprudência das ações penais desde 1988, a partir da base de dados do Supremo em Números. São 394 processos, dos quais cinco resultaram em condenações. Em nenhuma delas todos os ministros se manifestaram expressamente sobre cada pena nem ousaram fixar-lhe a quantidade, uma a uma.
Os ministros simplesmente abrem mão de especificar a pena que consideram mais adequada e acompanham os votos dos ministros relator e revisor. O debate de como calcular penas diferentes é, neste momento, um falso debate. Nunca houve a aplicação da chamada pena-média, na qual é dada uma solução intermediária na ocorrência de votos divergentes. A saída tem sido simples: adotar a pena sobre a qual a maior quantidade de ministros tenha concordado. Em um dos casos, dos oito ministros que participaram da sessão, quatro votaram pela condenação a 13 anos e 4 meses de prisão, três votaram por 16 anos, e um votou por 11 anos e 10 meses. A posição vencedora? Treze anos e 4 meses. Não porque era média, mas porque foi a que obteve a maior quantidade de adesões, já que, em momento algum, os ministros discutiram como calcular o conjunto de seus votos.
A não ser que os ministros modifiquem esse comportamento, o que é possível, e cada um especifique a pena para cada crime de cada réu condenado, a discussão relevante é outra. Qual ministro conseguirá a maior adesão de seus pares na hipótese de absolvição ou condenação e suas respectivas penas? Quem vai liderar? A proposta do relator, do revisor ou de um terceiro ministro a surgir?
FONTE: O GLOBO
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