O governo Dilma é visto entre os parlamentares como aquele que fecha acordos de manhã e joga tudo por terra horas depois. Se não mudar de atitude, a crise da MP dos Portos se repetirá em todos os demais temas importantes
Se depender das excelências parlamentares, a presidente Dilma Rousseff não terá mais um dia de paz no Congresso Nacional, caso mantenha a atitude cada vez mais corriqueira de desrespeitar acordos fechados no plenário por seus representantes, leia-se ministros e líderes. O crédito do governo, em relação a esses acertos de mérito hoje é nulo. Já estava esgotado e ficou pior depois de fechado um acordo com o PMDB para votar a MP dos Portos, e romper esse mesmo acordo tão logo aprovado o texto-base da proposta, sem os trechos destacados para votação em separado. A longa sessão de ontem para concluir a apreciação da MP dos Portos é a maior prova de que a base desandou. E, se nada for feito, o “ponto de liga” desse bolo não será alcançado.
Dilma, apesar dos apelos pela votação, quebrou algo que é considerado ponto de honra entre os políticos, os acordos firmados para apreciação de matérias. Ali, acordo que não é para cumprir, não se faz. Nos tempos de Luiz Eduardo Magalhães como líder do governo Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, o deputado podia até brigar com o Planalto, mas não deixava de cumprir os acordos fechados com a oposição, onde estava o então guerrilheiro de plenário, José Genoino. Hoje, esse tempo de acordos acabou. E essa quebra de confiança não ocorreu apenas na madrugada de quarta-feira.
O governo Dilma Rousseff é visto hoje entre os parlamentares como aquele que fecha acordos de manhã e joga tudo por terra horas depois. O episódio anterior ao da Medida Provisória dos portos ocorreu há três semanas, quando o líder do PP, Arthur Lira, fez um esforço danado para garantir R$ 10 de subvenção a pequenos produtores de cana de açúcar. Num acordo avalizado pelo líder do governo, Arlindo Chinaglia, a subvenção foi aprovada. A alegria do pepista, no entanto, durou pouco. Na semana seguinte, a proposta de Lyra - crucial para garantir a aprovação da medida - terminou vetada pelo Planalto. Daí, uma das razões que levou o PP na semana passada a fazer corpo mole para votar a MP dos Portos.
No Senado, recentemente, Ana Amélia Lemos (PP-RS) relatava um projeto do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), que institui a obrigatoriedade de pós-graduação ou mestrado para professores universitários. Na véspera de relatar o projeto, ela recebeu um telefonema do Ministério da Educação. Assessores do ministro Aloizio Mercadante queriam que ela não levasse a proposta a voto. Ana Amélia se recusou e a proposta do líder do PSDB foi aprovada na comissão de Educação. Agora, o governo quer segurar a tramitação do texto no plenário do Senado porque o ministro Mercadante prepara uma MP a respeito. Assim, em vez do líder tucano, quem ficará com o mérito sobre o texto será o governo Dilma.
Essa forma de fazer política, quebrando acordos fechados e desconhecendo a generosidade de acolher um projeto parlamentar, ainda que seja de oposição, é novidade para deputados e senadores experientes. E deixa mal todos os aqueles que se envolveram nos acordos. Na MP dos Portos, por exemplo, até o vice-presidente Michel Temer, saiu chamuscado. Afinal, ele chancelou um acordo que o governo quebrou para não caracterizar a aprovação do marco regulatório dos portos como uma vitória de Eduardo Cunha.
A estratégia de enquadrar o líder do PMDB teria funcionado se a votação estivesse sido concluída ontem. Mas, ao tirar o sabor de vitória da boca da bancada do PMDB, o governo perdeu. O partido fez corpo mole no plenário e, em vez de Dilma ter os peemedebistas ao seu lado, no esforço para encerrar a votação ainda na terça-feira na Câmara, ela teve os deputados do partido engrossando a fileira daqueles com cara de fastio para o governo. Na última votação, por exemplo, lá pelas 5 da matina, faltavam 60 votos do PMDB. Nenhum partido da base estava de corpo e alma no plenário. Assim, tudo ficou mais difícil para a MP Titanic, que ontem à tarde já era chamada de MP Cinderela. Se não for votada até a meia-noite de hoje, vira abóbora, na verdade “um abacaxi”.
Enquanto isso, entre os ministros...
Os parlamentares não gostaram muito de ver os ministros do governo cabalando votos, embora essa atitude seja comum há tempos na casa. O ministro da Agricultura, Antonio Andrade, por exemplo, ao responder aos deputados que estava ali para ajudar a buscar votos em favor do governo, ouviu a seguinte resposta de um antigo colega de bancada: “Estamos com um único problema. O Leonardo Quintão (PMDB-MG). Liga para ele!”. Toninho Andrade murchou: “Esse não fala comigo”. O ministro, então, recolheu os flaps. Para quem não se lembra, Quintão é aquele deputado a quem foi prometido um cargo no governo e quase rompeu quando Andrade assumiu a pasta da Agricultura.
Fonte: Correio Braziliense
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