“É ainda uma das afirmações mais conhecidas e fortes de Berlinguer — a “democracia como valor universal” — que se mostra hoje vigorosamente atual.
Se, no passado, tal afirmação tinha o significado forte e explícito de contestar o comunismo soviético e seu caráter opressivo, hoje a “questão democrática” revela-se de extraordinária atualidade, numa sociedade em que os poderes das nações se esvaziam, os cidadãos sentem como mais incertos os seus direitos, a política e as instituições surgem fracas e inadequadas, e, até mesmo, crescente é o deslocamento de poderes, decisões, recursos: de instituições legitimadas pelos cidadãos — “democráticas”, precisamente — para lugares e instâncias extrainstitucionais, ao mesmo tempo que se afirmam concepções populistas e plebiscitárias da política e da direção.
E, por fim, como deixar de ver a extraordinária atualidade de uma concepção da política não separada de princípios éticos e regras morais?
Por ter evocado a “questão moral”, Berlinguer foi muitas vezes acusado de sectarismo e moralismo. E ainda hoje há quem atribua à evocação dessa questão feridas dilacedoras e não curadas.
Em realidade, em tal expressão havia não apenas a consciência da degradação a que o tecido político e institucional estava perigosamente exposto, mas sobretudo a firme convicção de que a credibilidade da política e de quem a representa consiste na transparência, na honestidade, no respeito à autonomia das instituições, na observância das leis e na adoção de comportamentos que não violem essenciais princípios éticos e morais em que todos os cidadãos se reconhecem. Valores e conceitos cuja necessidade podemos bem avaliar num tempo em que a política italiana nos traz todo dia imagens bastante deprimentes.
Refletir sobre Berlinguer, portanto, não em razão de uma nostalgia anti-histórica, mas para aproveitar suas intuições e suas reflexões num tempo presente que, mais uma vez, requer da esquerda e dos reformistas que não tenham medo — como Berlinguer não teve — de percorrer caminhos inexplorados e navegar em mar aberto.”
Cf. Piero Fassino, “A atualidade de Enrico Berlinguer” in L’Unità & Gramsci e o Brasil, 2009.
Foi expoente do antigo PCI e, a partir de 2001, secretário nacional dos Democráticos de Esquerda (DS). Ex-deputado e primeiro presidente do PD Atualmente, é prefeito de Turim.
Nenhum comentário:
Postar um comentário