Lula põe o PT nas nuvens com a garantia de poder
Obsessão à deriva é como os políticos petistas têm definido, em conversas públicas, a menção à candidatura Lula em 2014, na sucessão da sucessora. É um recuo apenas tático, ensaiado, até porque, falando sério sobre a realidade que se descortina à sua frente, o partido vê como temíveis incógnitas as reações da presidente candidata à reeleição, a quem não quer magoar. Quando o assunto entra sob reserva no debate, é tratado como ele realmente se apresenta e a conversa é outra. E como é, na realidade? A passagem do tufão-Lula por Brasília, durante dois dias, a pretexto de receber uma medalha mas, sobretudo, participar de eventos de campanha, foi reveladora.
Um dos que se postaram na fila do gargarejo concluiu o estado em que ele deixou o partido após dois dias de discursos ouvidos tal como se fossem melodias: "O PT ficou nas nuvens". Voo impulsionado pelo motor- Lula.
Sem temor de consequências, passou um seguro eleitoral de que, em hipótese alguma, entregará o poder a outro partido. Nessa garantia está incluída, principalmente, sua candidatura a presidente.
A estratégia é óbvia e antiga na concepção: Lula está viajando Brasil afora, apartado da caravana de Dilma, oficialmente para fazer campanha para ela e defender o assim denominado legado petista no governo federal. Irá a todos os Estados, será agressivo naqueles que produziram candidaturas adversárias à do PT mas, sobretudo, tentará minar a candidatura Eduardo Campos, no Nordeste, e Aécio Neves, do Sudeste. Atacará com virulência, como já tem feito, a candidata a vice na chapa do PSB, Marina Silva, e ao próprio governador, que o tem irritado sobremaneira pelo sucesso que faz entre os empresários, donos do dinheiro privado das campanhas eleitorais.
Se avaliar que a candidatura Campos está crescendo ao ponto de ameaçar a vitória de Dilma no primeiro turno, o nome na urna eletrônica do Tribunal Superior Eleitoral será trocado e o candidato Lula surgirá na tela. A esta altura ele já terá feito campanha pelo Brasil afora e lembrado aos eleitores da sua carismática existência.
Essa é a ideia colocada à mesa desde quando Lula saiu do governo e já foi mais de uma vez retomada, mas refluiu por diferentes razões. Primeiro, em determinado momento de seu tratamento de combate ao câncer, quando se acreditava que não teria forças para enfrentar uma nova campanha; e, em seguida, em período mais recente, por causa das reações contrárias da presidente à hipótese de não ser ela a candidata. O recolhimento, agora, é teatral.
Voltou a vigorar no PT, com campanha às claras, a sua não admitida candidatura. Lula não quer permitir o segundo turno porque tem certeza que todos se unirão contra o PT e Dilma poderá não aguentar, eleitoralmente falando.
Chegou a Brasília elétrico, sob o efeito das reclamações que vinha recebendo dos empresários que o têm procurado para se queixar do intervencionismo do governo Dilma e da derrocada na economia. Sugeriu medidas, como a de independência do Banco Central, para reconquistar os ortodoxos. Procurou em todas as conversas um antídoto para o sucesso que, vem anotando com profundo desgosto, Eduardo tem feito entre os potenciais financiadores de campanha.
Movido por tão forte pressão, Lula deu ao PT a agenda política pela qual quer ver o partido se empenhar: a reforma política velha de guerra mas, nela, buscar resolver uma questão que acredita esgotada no modelo atual, a do financiamento de campanhas. O ex-presidente está achando cada vez mais difícil, tendo o obstáculo das deterioradas relações entre eles e o governo Dilma, arrancar dinheiro dos financiadores nas proporções da sua época áurea.
Uma vez reconduzido ao poder federal, e vitorioso em vários Estados, principalmente São Paulo, o ex-presidente deu ao PT a esperança de poder, lá na frente, se dar ao luxo de fazer o programa que quiser se o financiamento for público. Inclusive criar e aumentar impostos, como revelado ontem, neste espaço, por Raymundo Costa.
O ex-presidente quer garantir para o futuro verbas permanentes para as campanhas eleitorais, que permitam ao partido manter-se no poder sem a submissão à vontade dos financiadores.
Para isso, Lula exigiu que retomem a discussão da reforma política, sobretudo o financiamento público das campanhas eleitorais.
Lula mostrou que não há mais como fazer campanha, no Brasil, e que não tem outra saída fora do financiamento público. O ex-presidente, candidato de campanhas milionárias, convenceu-se que com ele foi encerrado um ciclo.
A reforma política concluída ontem no grupo de trabalho criado pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, em que se destacam o fim da reeleição, é considerada irreal pelo ex-presidente, não é o que ele quer. Apenas um corpo a ser remodelado à medida em que conseguirem avançar nas negociações com os aliados.
O PT deve reconsiderar o projeto conhecido como sendo o de Henrique Fontana, que insiste em duas teses caras ao partido porque fortalecem sua cartolagem: além do financiamento público, o voto em lista.
O PT gostou também da defesa que o ex-presidente fez do Parlamento e da política. Como o partido não conseguiu incluir-se nas manifestações populares, achou uma boa saída Lula taxar como fascistas os movimentos que só criticam e negam a política.
Também agradou o ex-presidente ter reagido ao que chamou de tentativa de desconstrução do seu legado, quando se atribuiu ao governo Fernando Henrique a estabilização da economia, um fato que o PT não registra e ele agora também prefere não registrar. Foi aí que disse, em tom que soou como ameaça, que se falarem mal do seu governo volta em 2018. A ameaça é à própria presidente Dilma, pois o que está posto mesmo é a sua volta em 2014. Mesmo agitado, espalhando farpas e animando o auditório, foi Lula quem se aproximou das teses mais caras ao PT, não o contrário.
Fonte: Valor Econômico
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