O discurso pró-mercado, da presidente Dilma Rousseff no fórum de Davos, representou, antes de tudo, uma nova versão da “Carta aos Brasileiros”, da campanha de Lula em 2002. Com os objetivos, agora, de desarmar as resistências dos investidores externos ao dirigismo estatizante do governo e a um possível rebaixamento da nota de crédito do país pelas agências internacionais de risco (em face da persistência dos sinais de erosão dos fundamentos da estabilidade macro-econômica), passando a atraí-los.
O discurso teve boa acolhida inicial pelos participantes do fórum, com a ressalva de que, primeiro, é preciso ver para crer. Ou seja, esperar que se confirmem as promessas de uma política fiscal de busca concreta do centro da meta inflacionária, de contenção das despesas de custeio e assistencialistas em favor de mais investimentos e de efetivo respeito aos contratos com a iniciativa privada.
Promessas que ganharam alguma consistência com a retomada das concessões de modais de transporte, imposta pelo agravamento das carências da infraestrutura e levada à prática após um verdadeiro zigue-zague de propostas estatais irrealistas. E que serão testadas ao longo do ano com a aplicação para valer, ou o esquecimento, das medidas a serem anunciadas em fevereiro de aumento do superávit primário para 2% (ainda muito pequeno, segundo a maioria dos analistas), de par com um corte das despesas orçamentárias maior que o do ano passado.
Esse novo discurso da nossa presidente, além de explicitar o imperativo eleitoral de respostas ao baixo crescimento do PIB e seus efeitos sociais, reflete o reconhecimento (mesmo que forçado e a contragosto) de um cenário da economia mundial completamente diverso daquele que ela descortinava e propagava anos atrás. Quando esnobava o fórum de Davos, qualificado por auxiliares como encontro de especuladores. E quando aproveitou uma viagem a França para dar conselhos à líder alemã Angela Merkel sobre como enfrentar a crise europeia.
Ora, o contexto que temos hoje, e à frente, configura-se, de um lado, pela retomada da expansão dos EUA; pelo revigoramento do Japão e da Coreia do Sul; e pela reanimação dos países da zona do euro, puxada pela Alemanha; e, de outro lado, por uma teia de problemas e entraves que debilitam as economias dos emergentes, como as da Rússia, Turquia, África do Sul e do Brasil, as quais, sob a liderança do capitalismo de estado da China (hoje em desaceleração e confrontado por crescentes reações sociais), eram projetadas, como polo dominante global após a superação da crise de 2008, nas manifestações da presidente Dilma e do Itamaraty.
E tal cenário tem fortes desdobramentos na América Latina, com o esgotamento do chavismo na Venezuela e de sua influência externa e a crise na Argentina (vivendo uma nova corrida ao dólar e sob a ameaça de recessão). Ou seja, com o desmonte dos principais parceiros do Brasil na operação do terceiro-mundismo protecionista do Mercosul. Enquanto ganha força a alternativa de abertura da região ao comércio global e às modernas cadeias produtivas, constituída por México, Colômbia, Peru e Chile, na aliança do Pacífico, com crescente atração de investimentos do 1º mundo.
Cabe concluir com uma pergunta: ao menos retoricamente – o que já seria um passo – o discurso pró-mercado da presidente em Davos, voltado para a economia doméstica, poderá ser estendido à política externa, especialmente ao papel dela no Mercosul? Ou essa área, importante para o Brasil nos planos econômico, político e cultural, seguirá entregue ao controle do petismo terceiro-mundista?
Jarbas de Holanda, jornalista
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