- O Globo
Primeiro a boa ou a má notícia? A péssima: os resultados da eleição para o Parlamento Europeu de maio serão deprimentes, os números vão mostrar o crescimento dos radicais da extrema-direita. A bem ruinzinha: seus partidos ainda têm nomes desconhecidos fora das fronteiras de seus países, mas estão se unindo sob um título ambíguo — “Aliança pela liberdade da Europa”— para lutarem, juntos, contra a União Europeia. A boa notícia é uma espécie de jogo do contente: os grandes países da velha Europa não estão todos dominados pela praga do populismo dos partidos extremistas.
Primeiro a boa ou a má notícia? A péssima: os resultados da eleição para o Parlamento Europeu de maio serão deprimentes, os números vão mostrar o crescimento dos radicais da extrema-direita. A bem ruinzinha: seus partidos ainda têm nomes desconhecidos fora das fronteiras de seus países, mas estão se unindo sob um título ambíguo — “Aliança pela liberdade da Europa”— para lutarem, juntos, contra a União Europeia. A boa notícia é uma espécie de jogo do contente: os grandes países da velha Europa não estão todos dominados pela praga do populismo dos partidos extremistas.
“Espero maus resultados, mas eles vão indicar mais o fim de uma época do que o início de um longo crescimento do extremismo”, sintetiza Alain Touraine, considerado pai da moderna sociologia e uma das tradicionais vozes da esquerda francesa.
Os sinais são contraditórios. Na semana em que o Reino Unido dá demonstrações de intolerância e bota sob vigilância a mais tradicional organização islâmica — a Irmandade Muçulmana —, a França aparentemente perde o medo e apresenta suas propostas para facilitar a vida das novas famílias, as múltiplas composições das uniões afetivas no século XXI. O presente deixado pela ex-ministra de Assuntos Sociais propõe uma pequena revolução do direito da família: reconhecimento de filhos gestados em barrigas de aluguel, inseminação artificial em casais de lésbicas, adoção de crianças por solteiros ou homos, e fim do anonimato dos doadores de sêmen.
Foi lançado com pouca pompa, numa adaptação ao estilo do novo premier, Manuel Valls: mais combativo, mas mais conservador em questões sociais. Encomendado a renomados especialistas, o calhamaço de 300 páginas ficou mofando nas gavetas do governo desde janeiro. A decisão de botar em discussão as propostas já é uma pequena ousadia, um sinal de vida da esquerda, emparedada pelo crescimento da Frente Nacional.
— Não vejo a extrema-direita desestabilizando a política francesa. A direita clássica não fez acordo com a Frente Nacional, e os socialistas estão reagindo. Mas a França é o pior caso na Europa Mediterrânea — diz Touraine.
Um pouco nos moldes do Tea Party americano, os extremistas europeus botam tudo junto e misturado nas suas plataformas eleitorais: desilusão com a política, crítica à austeridade receitada por Bruxelas, palavras de ordem contra imigrantes, judeus e ciganos, a defesa de uma família tradicional, o repúdio ao casamento gay. Esta mensagem antiestablishment faz sucesso com o eleitorado de esquerda do Movimento Cinco Estrelas do comediante italiano Beppe Grillo e agrada aos nazistas da Aurora Dourada, da Grécia. Junta também os radicais da Frente Nacional da França e os suíços da União Democrática, a direita nacionalista de maior sucesso na Europa.
“Surpreendentemente, a xenofobia e todos esses movimentos populistas de direita são mais fortes na Europa do Norte, onde a economia vai melhor”, diz Touraine.
A ideia generosa de uma Europa com livre circulação de pessoas, ideias e bens saiu de moda. Ganha força o movimento contrário, a Europa fortaleza, defendida pela extrema-direita, pela primeira vez com chances de organizar uma bancada no Parlamento Europeu. Para chegar lá, tem de eleger 25 deputados, de sete países diferentes.
Por conta disso, os eurocéticos estão se unindo. Começou no fim do ano passado, com Marine Le Pen e o holandês Geert Wilders prometendo fazer campanha juntos e este ano foi a vez de os nacionalistas da Áustria receberem belgas, eslovenos, suecos e italianos da mesma turma. “Mas não ficou só nisso, estão também atraindo os partidos mais tradicionais — como o Conservador do Reino Unido — e formações de esquerda, tipo Syriza, na Grécia”, informam Mark Leonard e José Ignacio Torreblanco, do European Council on Foreign Relations.
A sorte é que eles não se entendem. Mas as palavras de ordem racistas e xenófobas fazem estragos na reputação da Europa, aquela que nós gostamos pelo multiculturalismo estampado nas ruas, pela defesa de ideais de liberdade e o gosto de viver. Acuadas pela intolerância, a esquerda e a direita clássica tentam adaptar seu discurso à moda do momento, perdendo a oportunidade de reafirmar seus valores. A Suíça, em plebiscito, impôs cotas de imigração, numa violação absurda aos tratados de livre circulação no espaço europeu. Se ficar por isso mesmo, o próximo a romper as regras certamente será o Reino Unido. Os extremistas querem manter a livre circulação de capitais, mas gostariam de pôr barreiras à movimentação de pessoas, especialmente as pobres. Russos ricos sem papéis não têm a menor dificuldade de alugar um apartamento em Londres, simplesmente apresentam uma mala de dinheiro e pagam dois anos adiantado.
A melhor descrição do momento é a de Bob Dylan na sua velha balada do Thin Man: “alguma coisa está acontecendo aqui, mas você não sabe o que é, sabe Mr. Jones”? É bom que os europeus contrários ao fechamento da Europa compareçam para votar, já que será uma derrota para o mundo perder um espaço de liberdade.
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