• A devolução da MP não é o fim do mundo, desde que o governo faça bem seu ‘dever de casa’ para viabilizar um ajuste sem o qual os cenários se tornam imprevisíveis
A devolução da MP 669 ao Planalto, “por inconstitucional”, segundo o remetente, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Congresso, ocorreu no mesmo dia em que o procurador-geral, Rodrigo Janot, despachou para o Supremo a lista de políticos implicados no petrolão.
E também ao mesmo tempo em que Renan, no Senado, fazia forte discurso a favor da independência do Congresso, sob aplausos da oposição, corria a notícia de que ele e outro peemedebista de primeiro escalão, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (RJ), estavam na lista de Janot.
A tensa tarde de terça-feira patrocinou o encontro entre as duas crises, a econômica e a política. A acertada rejeição da medida provisória — não importam motivações pessoais de Renan — firma a ideia de que MP não é indicada para aumento de impostos. Numa reação adequada, pouco tempo depois, no início da noite, a presidente Dilma reenviou o conteúdo da MP — a elevação em 150% das alíquotas de recolhimento de contribuições previdenciárias com base no faturamento das empresas — na forma de projeto de lei, com pedido de tramitação urgente. Como deve ser.
Longe de ser o fim do mundo. O importante é o Planalto entender a necessidade de fazer um “dever de casa”, e bem. Na economia ele é óbvio: buscar cortes que substituam aumento da carga tributária sobre a folha de salários.
Mesmo com o emprego de termos inadequados, o ministro Joaquim Levy tem razão quando critica a forma como foi executada a exoneração da folha de salários.
Em vez de aplicar a medida de forma horizontal, o primeiro governo Dilma fez desonerações pontuais, causa de distorções nos mercados e com pouco efeito macroeconômico.
Mas, ao contrário do que entende Levy, a desoneração não é uma “brincadeira”. Mesmo com falhas na execução, a primeira rodada de desonerações teve efeito positivo em mercados de trabalho.
Há a interpretação no governo de que a atitude de Renan e a postura de Cunha na Câmara seriam uma retaliação à suposta interferência do Planalto na montagem da lista de Janot.
Parece uma fantasia conspiratória, porque a lista do procurador-geral não dependeu da PF, subordinada ao Executivo federal. Se a PF faz investigações e executa prisões na Lava-Jato, só cabe à Justiça Federal e ao MP encaminhar as denúncias, e sobre estas o governo federal não tem qualquer poder.
Outro aspecto é que o Planalto errará mais uma vez se tentar fragilizar Renan, Cunha e o próprio PMDB, aproveitando-se do petrolão. Já não deu certo valer-se das feitiçarias de Gilberto Kassab (PSD), ministro das Cidades, na exumação de partidos para tentar esvaziar o partido.
O petrolão deve ser um processo para meses, enquanto o ajuste precisa ser desenhado o mais rapidamente possível. Melhor sentar e conversar. O mesmo vale para Renan e Cunha.
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