quinta-feira, 5 de março de 2015

Janot rejeita pressão política na Lava-Jato

Janot critica pressão e diz que se baseou em critérios técnicos 

• Ministro do STF deve analisar pedidos do procurador até amanhã e acabar com sigilo da lista

Jailton de Carvalho – O Globo

BRASÍLIA - Um dia após pedir ao Supremo Tribunal Federal (STF) abertura de 28 inquéritos contra 54 pessoas, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot rejeitou as pressões políticas sobre o Ministério Público e disse que se baseou em critérios técnicos, sem levar em conta vínculos partidários e cargos públicos dos acusados. O procurador deixou claro ainda que está ciente da forte reação que terá pela frente e de possíveis tentativas de desqualificar as investigações. Janot fez o desabafo numa carta endereçada aos colegas do Ministério Público.

"Não acredito que esses dais de turbulência política fomentarão investidas que busquem diminuir o Ministéro Público brasileireo, desnaturar o seu trabalho ou desqualificar os seus membros. Mas devemos estar unidos e fortes", afirmou o procurador-geral. Na semana passada, Janot recebeu um alerta do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para aumentar sua segurança pessoal. Na última sexta-feira, ele relatou que teve sua casa em Brasília invadida em janeiro, pouco após criar a força-tarefa para preparar os pedidos de inquérito contra parlamentares. O caso está sendo investigado pela Polícia Civil.

Segundo o procurador-geral, a Operação Lava-Jato, base das acusações contra os políticos, chegou num momento crucial. Caberá ao ministro Teori Zavascki, relator no STF, decidiu se acolhe ou não os pedidos de inquéritos contra os presidentes do Senado, Renan Calhereiros (PMDB-AL), da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e outros acusados de receber dinheiro desviado de contratos entre empreiteiras e a Petrobras.

"Estou certo que, uma vez levantado o sigilo do caso pelo ministro Teori Zavascki, o trabalho até este momento realizado será esquadrinhado e submetido aos mais duros testes de coerência!", disse Janot. "Não espero a unanimidade nem a terei. Desejo e confio, sim, nesse momento singular do país e, particularmente, do Ministério Público brasileiro, que cada um dos meus colegas tenha a certeza de que realizei meu trabalho em direção aos fatos investigados, independentemente dos envolvidos, dos seus matizes partidários ou dos cargos públicos que ocupam ou ocuparam", acrescentou.

Teori planeja terminar até amanhã a análise dos pedidos de abertura de inquérito feitos por Janot. O sigilo deverá ser derrubado e o país conhecerá os nomes dos investigados. Janot também pediu diligências iniciais, como a oitiva de testemunhas, o compartilhamento de provas obtidas na primeira instância, além de quebras de sigilos fiscais e bancários. Teori deverá concordar com os pedidos.

Janot também quer o arquivamento de sete petições, por falta de provas suficientes contra os suspeitos. Janot solicitou que os inquéritos tramitem de forma pública, sem o sigilo judicial. Teori deve concordar com esse pedido. Permanecerão em segredo apenas provas que, se fossem divulgadas, comprometeriam o bom andamento das investigações. Também devem continuar sob sigilo provas que expõem a intimidade do investigado, como informações bancárias.

A decisão de pedir a inclusão num mesmo inquérito de pessoas sem foro junto ao STF vem adiando os pedidos de investigações contra os governadores citados na Lava-Jato - chefes de Executivos locais são investigados e processados no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A procuradoria ainda analisa os casos dos dois governadores citados: Luiz Fernando Pezão (PMDB), do Rio, e Tião Viana (PT), do Acre. Por conta da decisão de sugerir a conexão de fatos criminosos num mesmo inquérito no STF e da repercussão disso nos casos do STJ, os pedidos de abertura de inquérito contra os governadores só devem ser feitos na próxima semana.

Uma fonte com acesso às investigações relata que a quantidade de casos arquivados não deve passar de três - os outros quatro se referem apenas a uma baixa nos registros do STF, a partir do encaminhamento de casos para a primeira instância, no Paraná. Um dos casos seria o do ex-deputado federal Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), ex-presidente da Câmara. Caso Alves esteja fora da lista de Janot, está cotado para ser ministro do Turismo.

- Não recebi nenhuma comunicação. Aguardo naturalmente confiante a decisão da Justiça. Encontro-me em Natal, e acompanho fatos apenas pelo noticiário da imprensa - afirmou o ex-deputado.

Dois senadores do PT, Gleisi Hoffmann (PR) e Humberto Costa (PE), estariam entre os citados nos depoimentos das delações premiadas que embasaram os pedidos de Janot, segundo um investigador que atuou no caso. A lista de Janot é mantida sob sigilo. Caberá a Teori concordar com o pedido de Janot para derrubar o sigilo e abrir o andamento dos processos. Teori sinalizou que tornará público os procedimentos.

Ontem, no Tribunal de Contas da União (TCU), a área técnica concluiu parecer considerando que os acordos de leniência a serem assinados entre a Controladoria Geral da União (CGU) e as empreiteiras investigadas na Lava-Jato precisam ser submetidos ao Ministério Público Federal (MPF). Além disso, o órgão vinculado à Presidência da República deve comprovar que as construtoras vão apresentar informações inéditas sobre as irregularidades investigadas, demonstrando a "real vantagem para a administração". O governo da presidente Dilma Rousseff defende os instrumento da leniência no caso das empresas suspeitas de participação no esquema de desvios da Petrobras.

No último dia 21 de fevereiro, o Ministério Público junto ao TCU apresentou uma representação ao presidente do tribunal, ministro Aroldo Cedraz, em que pede a suspensão dos acordos envolvendo as empreiteiras da Lava-Jato. No documento, o procurador Júlio Marcelo de Oliveira argumenta que é preciso "evitar que se celebrem acordos que possam atrapalhar o curso das investigações dessa importante operação (a Lava-Jato)". O ministro Augusto Nardes foi designado para ser o relator do processo. Antes de tomar uma decisão, o ministro recebeu o parecer elaborado pela Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura de Petróleo, Gás Natural e Mineração. O documento foi concluído anteontem e anexado ao processo.

Em despacho assinado ontem, Nardes determinou que a unidade técnica faça uma oitiva da CGU, do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), da Advocacia Geral da União (AGU) e da Procuradoria Geral da República (PGR) a respeito do assunto. O prazo dado é de cinco dias. "A necessidade de participação do MPF nos processos administrativos referentes aos acordos de leniências firmados no âmbito administrativo se configura inequívoca, tendo em vista os reflexos que trazem ao processo judicial", citou o ministro.

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