• Candidato derrotado do PT ao governo paulista em 2014 participou de reunião com alvos da Lava Jato para tratar dos interesses de empresa de remédios
Ricardo Brandt, enviado especial a Curitiba, Julia Affonso e Fausto Macedo – O Estado de S. Paulo
O Ministério da Saúde omitiu da Justiça Federal a informação de que o ex-ministro Alexandre Padilha – candidato derrotado do PT ao governo do Estado, em São Paulo, em 2014 – se reuniu com o ex-deputado federal André Vargas (sem partido-PR) para tratar da contratação da empresa Labogen S/A Química Fina e Biotecnologia, que havia sido comprada pelo doleiro Alberto Youssef, dentro de uma parceria para desenvolvimento de um medicamento.
A omissão do dado em nota técnica enviada no dia 26 de março de 2014 pelo Ministério da Saúde à Justiça Federal, após a deflagração da Operação Lava Jato, foi considerada suspeita pelo juiz federal Sérgio Moro, em sua decisão desta sexta-feira, 10, em que mandou prender o ex-deputado.
“Agentes do Ministério da Saúde faltaram, aparentemente, com a verdade para com este Juízo, ao não revelarem todos os fatos envolvidos na aprovação da parceria”, registrou o juiz federal Moro, que conduz os processos da Lava Jato e que nesta sexta feira, 10, deflagrou a Operação ‘A Origem’ para prender André Vargas e outros dois ex-deputados, Luiz Argôlo (SD/BA) e Pedro Corrêa (PP/PE), ambos das relações com o doleiro.
“Apesar da extensão da nota e do relato dos encontros entre os representantes da Labogen e os agentes do Ministério da Saúde, foi omitida qualquer informação acerca dos aludidos encontros de André Vargas com Alexandre Padilha ou com Carlos Gadelha (então secretário executivo da Pasta) a respeito dos fatos.”
A parceria aprovada envolveria a fabricação no Brasil e o fornecimento ao Ministério da Saúde do medicamento “citrato de sildenafila”, o que seria feito pela Labogen em associação com a empresa EMS S/A e o Laboratório Farmacêutico da Marinha (LFM). Desde abril de 2014, a Lava Jato havia divulgado relatórios em que apontavam o encontro entre Padilha e Vargas. Os dois negaram relações no negócio.
Moro afirmou em seu despacho, que “foram colhidas provas que indicam, em cognição sumária, que André Vargas, então deputado federal, teve papel fundamental para que a Labogen lograsse obter a aprovação do Ministério da Saúde para a parceria em questão”.
O encontro com Padilha foi revelado em delação premiada feita pelo doleiro perante a força tarefa da Lava Jato. A Labogen era empresa do laranja de Youssef, Leonardo Meirelles, que a utilizava para a celebração de contratos de câmbio para importações fictícias, a fim de remeter fraudulentamente dinheiro ao exterior.
Segundo o magistrado, as investigações da Lava Jato mostraram que a “interferência de André Vargas teria ocorrido a pedido de Alberto Youssef que pretendia, com sócios, comprar 80% das cotas sociais da Labogen”.
Em depoimento em março, dentro do acordo de delação premiada, Alberto Youssef confirmou a atuação de Vargas em prol da Labogen e revelou “a presença de André Vargas e dele mesmo em reunião com dirigentes do Ministério da Saúde, especificamente o então ministro Alexandre Padilha, para tratar da questão”.
“Vargas efetivamente ajudou” nas negociações, afirmou Youssef. “Sendo que em uma data que não se recorda, no ano de 2013, houve uma reunião no apartamento funcional do deputado André Vargas, em Brasília, onde compareceram o depoente, Pedro Argese, André Vargas e o ministro Alexandre Padilha”, registrou a PF no termo de delação.
Nessa ocasião, Vargas teria apresentado a Labogen ao então ministro. Padilha teria dito que encaminharia os representantes da Labogen a um dos coordenadores do Ministério da Saúde, Eduardo Jorge, a quem cabia tratar do assunto e habilitar a Labogen, caso ela apresentasse os requisitos necessários.
O doleiro afirmou aos investigadores que “certamente, sem alguém com a influência no governo federal como tinha André Vargas, a Labogen não teria condições de fazer contratos ou sequer ser atendida no Ministério da Saúde”.
“Há razoável prova de que André Vargas realizou diversas e intensas intervenções junto ao Ministério da Saúde para a aprovação da parceria”, sustenta Moro na decisão de prisão de Vargas. Segundo ele, “há indícios de que a intervenção de André Vargas foi essencial para a aprovação da parceria, já que a Labogen não tinha estrutura adequada para obtê-la junto ao Ministério da Saúde”.
Em abril de 2014, quando o nome de Padilha foi citado no caso, sua assessoria de imprensa divulgou nota repudiando qualquer relação com o doleiro Alberto Youssef. “O ex-ministro da Saúde Alexandre Padilha repudia o envolvimento do seu nome e esclarece que não indicou nenhuma pessoa para a Labogen. Se, como diz a Polícia Federal, os envolvidos tinham preocupação com as autoridades fiscalizadoras, eles só poderiam se referir aos filtros e mecanismos de controle criados por Padilha dentro do Ministério da Saúde justamente para evitar ações deste tipo. A prova maior disso é que nunca existiu contrato com a Labogen e nunca houve desembolso por parte do Ministério da Saúde.”
Na ocasião, o Ministério da Saúde esclareceu que não foi fechado nenhum contrato com a Labogen.
Em nota, nesta sexta-feira, a pasta afirmou novamente que ‘não firmou contrato com a empresa Labogen’.
“Em todas as Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo, a relação do Ministério é com os laboratórios oficiais, que podem buscar parceiros privados. Em 2013, ao tomar conhecimento do relatório da Polícia Federal sobre a Operação Lava-Jato, o Ministério imediatamente suspendeu o termo de compromisso selado com o Laboratório da Marinha, antes mesmo da assinatura de contrato ou de qualquer repasse de recursos públicos. Isso significa que a proposta envolvendo a Labogen sequer passou da fase do cumprimento dos requisitos para assinatura de contrato.”
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