• Em palestra a empresários, ex-presidente afirmou que Dilma perdeu credibilidade
- Valor Econômico
SÃO PAULO — Três dias depois de a presidente Dilma Rousseff delegar a articulação política do governo ao vice-presidente, Michel Temer (PMDB), o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que a capacidade de liderança de Dilma está abalada e afirmou que a presidente entregou o comando político e financeiro do país a quem pensa de forma diferente dela. Para o ex-presidente tucano, Dilma perdeu a credibilidade. FH afirmou ainda que parte da solução para enfrentar a crise está em não fazer "conchavo" nem acordos obscuros.
Ao falar para uma plateia de empresários em São Paulo, o ex-presidente disse que o governo precisa de liderança para superar os problemas políticos e econômicos.
— Estamos, por circunstâncias, em um momento em que a capacidade de liderança de quem está na Presidência está muito abalada, tanto que entregou a chave do cofre para alguém que pensa o oposto. E entregou para ele fechar o cofre. Ela não pode mexer mais no cofre — afirmou FH, em referência ao ministro da Fazenda, Joaquim Levy. — E agora, [Dilma] entregou o comando político para outro que também pensa diferente, para outro partido. É uma situação delicada que estamos vivendo — disse, ao participar do VTEX Day, evento de comércio eletrônico na capital paulista.
FH afirmou que a queda da aprovação do governo está ligada à perda de credibilidade da presidente.
— Infelizmente o que aconteceu no Brasil nos últimos meses não foi uma perda de popularidade só. Popularidade você ganha, você perde. Mas foi perda de credibilidade. Aí não tem jeito — declarou — Quando não tem nem popularidade nem credibilidade fica difícil mover as peças. Se não ganhar a credibilidade não vai.
O ex-presidente tucano disse que "haverá forçosamente uma mudança", mas lembrou que o país vive um sistema democrático. Ele afirmou que o país vive uma crise "política, econômica, moral e um começo de mal-estar social".
— É crise para não botar defeito. É muita coisa junto. Erro de condução de política econômica.
Na palestra, o ex-presidente citou o escândalo de desvio de recursos da Petrobras, chamado de "petrolão", ao falar sobre a crise política enfrentada pelo governo.
— Não pode dirigir um país na base do ‘dá lá-toma cá’ incessantemente. Gera uma crise moral. O petrolão é só o mais impactante, mas não é o único. É uma série, um sistema de modelo de negócios, que não funciona. Ou melhor, funciona mas para poucos e o dinheiro é nosso — destacou.
Na análise do ex-presidente, a saída para a crise, com a retomada da governabilidade, passa pelos protestos nas ruas, pelo bom funcionamento da Justiça e pelos meios de comunicação divulgarem "o que está acontecendo", ampliando a informação.
— Não fazer conchavo, conciliação. Em algum momento sempre tem que ter algum acordo. A sociedade não funciona em pé de guerra o tempo todo, mas o acordo não pode ser debaixo do pano. Tem que ser alguma coisa sustentada pela opinião da sociedade — afirmou.
Sem citar diretamente as manifestações contra o governo, que devem se repetir neste domingo, FH disse que os grupos organizados da sociedade civil "têm muita capacidade de mobilização, mas não têm de implementação".
— É uma espécie de ato de protesto, de desespero, mas e depois? O que acontece? Não se sabe, porque as instituições estão muito rígidas. As instituições disponíveis, o partido, o Congresso, a forma de governar vêm de outra época — disse.
Na palestra de quase uma hora, marcada por críticas aos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma, o ex-presidente tucano afirmou que a presidente "merece um prêmio Nobel ao contrário".
— Ela conseguiu colocar a Petrobras na posição que está, segurar a inflação, arrebentou com o etanol, usinas faliram e na parte hidrelétrica deu nó nas finanças que estão todas quebradas. Isso tem que ser refeito — apontou.
FHC criticou ainda a forma como o governo federal investe no Bolsa-Família, uma das principais marcas da administração petista na Presidência. O tucano disse que a desigualdade social continua grande no país e disse que pior do que o tamanho da desigualdade é o modelo usado para reduzi-la, de transferência de renda.
— Não foi um modelo de incentivo ao trabalho, de engajamento e de criação de novos campos de prosperidade. A transferência de renda é necessária como estímulo, mas não como resultado final. Se mantiver no Brasil a tendência vai criar uma camada de funcionários públicos que não são funcionários públicos, mas que dependem do Tesouro — afirmou — Uma camada dependente, que é crescente, que se veste, come, está melhor alimentada, mas não é isso que se deseja numa sociedade moderna e dinâmica.
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