• Entrevista Marcelo Castro, relator da Comissão Especial da Câmara
Paulo Celso Pereira – O Globo
BRASÍLIA - Pressionado pelo PMDB e atônito com a decisão da maioria dos colegas na comissão, o relator da comissão especial da Câmara para a reforma política, deputado Marcelo Castro (PMDB-PI), viverá uma situação que ele mesmo define como "esdrúxula": votará contra o próprio relatório por ser contra a adoção do distritão, proposta que substitui o atual sistema proporcional para o Legislativo pela eleição dos mais votados nos estados e nos municípios, no caso de vereadores. Ou seja: tornar majoritária a eleição de todos os parlamentares. Em entrevista ao GLOBO, Marcelo Castro diz que aprovar o distritão poderá ser um erro histórico.
Por que o senhor é contra a propostas do distritão?
Quando adotamos o sistema proporcional, deveríamos ter adotado a lista preordenada, como funciona no mundo todo. Mas com o jeitinho brasileiro, permitimos o voto no candidato, fragilizando os partidos. As campanhas ficaram individualizadas e não partidárias. Aumenta a influência do poder econômico e é uma fonte inesgotável de escândalos de corrupção. Foi um grande erro histórico e estou achando que vamos cometer um segundo: aprovar o sistema majoritário no Brasil.
Por que defende o distrital misto?
Todo sistema tem vantagens e desvantagens. Quando você conjuga os dois, um compensa as desvantagens do outro. Eleger metade pelo sistema majoritário distrital é bom, você acompanha a atividade do parlamentar, escolhe aquele que conhece a vida toda. Mas, por outro lado, não permite o voto temático, ideológico, a representação das minorias. Que é o que o sistema proporcional permite. O distrital misto é um sistema testado, que já funciona há décadas e é o que mais cresce no mundo.
Quais as vantagens e desvantagens do distritão?
O distritão é no mínimo um voo cego, sem GPS, não sabemos onde vai dar. Não tem nenhum país de grande tradição democrática adotando esse sistema. O Japão já utilizou e não deu certo, acharam que tinha muito clientelismo e corrupção. Hoje, é usado na Jordânia, no Afeganistão e em Vanuatu. Sem desmerecer esses países, é algo que não tem solidez para o Brasil.
O senhor colocou o distritão no seu relatório. Vai votar contra?
Eu disse que colocaria no relatório a vontade da maioria. Não voto a favor do distritão nunca na minha vida. Nessa reforma política estou fazendo o que entendo ser melhor para o país. Eu vou votar num sistema que acho que vai piorar? Se eu votar nisso, vou me sentir indigno de ser representante do povo brasileiro.
O senhor foi pressionado pelo PMDB para incluir o distritão. Como lidou com isso?
Vou corrigi-lo. Nunca fui pressionado por ninguém. Só tem uma pessoa na face da terra com poder de me pressionar, me desequilibrar: minha mulher. Outra pessoa não me pressiona, a gente dialoga, debate. O partido, por maioria, decidiu a favor do distritão e queria, legitimamente, que seu representante na comissão, o relator, defendesse.
Votar contra seu próprio relatório não é estranho?
É a coisa mais esdrúxula do mundo. Mas fiz compromisso com a comissão de relatar aquilo que expressasse a vontade da maioria. Fui obrigado, por compromisso assumido, a relatar o sistema que acho que é prejudicial ao país. No plenário, não tenho esse compromisso. E na comissão também, por isso voto contra. Eu jamais votarei matéria de convicção que eu tenha certeza que será prejudicial ao país.
Por que a maioria de seus colegas defende o distritão?
É o mais parecido com o que existe hoje. Não vai ter renovação, serão lançados os nomes mais fortes e eleitas celebridades. Já viu sistema mais simples que esse? Pega o estado todo, são eleitos os mais votados. Não precisa fazer quociente eleitoral, somar voto de legenda, voto do partido, dividir as sobras, fazer os cálculos complicados. Se fosse tão bom, será que ninguém teria tido essa ideia? Está no conceito: o sistema majoritário distrital só funciona em região pequena. Ao botar no estado inteiro, a chance de dar errado é infinitamente maior que a de dar certo.
Quais as chances de se aprovar a reforma política desta vez?
Fica até difícil prever. Eu contava que a comissão especial jamais aprovaria o distritão porque se dedicou, estudou, ouviu, participou, recebeu a visita de dezenas de cientistas políticos, líderes partidários, especialistas, contrário a esse sistema. Esperava que tivessem formado massa crítica a partir das críticas que são feitas ao distritão. Se os que mais estudaram, votaram a favor...
Pode passar?
Vou votar contra, mas não tenho certeza de nada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário