segunda-feira, 29 de junho de 2015

Menção a doações legais como propina abre nova frente de investigação

• Denúncia pode indicar que houve corrupção e lavagem de dinheiro

Cristiane Jungblut – O Globo

BRASíLIA - O depoimento do presidente da UTC, Ricardo Pessoa, deu uma nova dimensão ao escândalo da Petrobras ao misturar em sua delação premiada doações legais de campanha, recursos que financiaram candidatos com . Na época do escândalo do mensalão, as investigações eram sobre pagamento a políticos por meio de caixa dois. A investigação sobre doações legais foi apontada ontem como um diferencial desse depoimento por ministros do Supremo Tribunal Federal. O empresário diz que boa parte dos recursos, mesmo os declarados, repassados a políticos é compensada por desvios de contratos com a Petrobras. Para investigadores, isso pode ser considerado ilegal, mesmo havendo registro no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Outra interpretação é que, se a denúncia se comprovar, haveria corrupção, pelo fato de o empresário ser obrigado a doar para obter contratos, e ainda lavagem de dinheiro, porque recursos da estatal poderiam ter sido drenados para doações de políticos do governo.

Apesar da apreensão em torno dos desdobramentos dos depoimentos de Pessoa, o Palácio do Planalto reforçará a estratégia de tentar desqualificar a delação com o argumento de que as cifras apontadas pelo empresário em relação à campanha de Dilma e de outros políticos, como o ministro Aloizio Mercadante (Casa Civil) eram declaradas como doações legais. A presidente Dilma Rousseff aprovou, de Nova York, o tom ofensivo usado pelos ministros Mercadante , Edinho Silva (Comunicação Social) e José Eduardo Cardozo (Justiça) em entrevista no sábado com a tese de que todas as doações foram legais e menções a políticos do PSDB que também receberam doações da UTC. A própria Dilma acertou a tática de colocar Cardozo no centro das explicações, para dar uma "resposta de governo" às acusações que envolvem a campanha da reeleição. Mas, interlocutores do governo avaliavam ontem que é "arriscado" botar o ministro da Justiça no processo, já que ele começa a ser pressionado pelo PT por causa da atuação da Polícia Federal nas investigações da Operação Lava-Jato, lembrando que ela é subordinada ao Ministério da Justiça. Nos bastidores, Cardozo retruca, dizendo que a autonomia da PF foi uma conquista do próprio PT.

"A origem suja das doações"
Tesoureiro da campanha de reeleição de Dilma, Edinho Silva disse que os R$ 7,5 milhões doados por Pessoa estavam declarados. O mesmo fez Mercadante sobre os R$ 500 mil doados à sua campanha ao governo de São Paulo, em 2010. As duas doações - de R$ 250 mil cada - constam da prestação de contas da Constram, de 29 de julho de 2010, com o recibo 13001092017; e da UTC, de 27 de agosto, com recibo 13001092079. O empreiteiro é dono das duas empresas, e teria dito que Mercadante recebeu R$ 250 mil de forma legal e R$ 250 mil por fora. O ministro fez questão de mostrar os recibos.

Pessoa falou, também, em pagamentos ilegais a parlamentares. Seriam recursos, chamados de "pixulecos", para conseguir obter decisões favoráveis no Tribunal de Contas da União (TCU) e enfraquecer a CPI da Petrobras. Essa parte do esquema lembra mais o escândalo do mensalão, em que havia vários tipos de pagamentos não contabilizados parlamentares, especialmente com recursos de caixa dois.

O líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), disse que o discurso da doação legal feita pelo Palácio do Planalto não se sustentará. Hoje, os presidentes dos partidos de oposição devem se reunir para discutir o caso:

- Essa tese de caixa um, de caixa legal, não tem como prosperar, porque o delator tem tudo documentado, mostrando o achaque dos emissários do PT, que as doações são oriundas de propina. Nenhum político tem como saber a origem da doação. Mas isso não vale para quem está na cena do crime, flagrado nas negociatas com contratos na Petrobras. O TSE agora sabe a origem suja dessas doações.

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