Aumenta a pressão
• Nova delação da Lava-jato leva procurador-geral a pedir mais provas contra políticos
Vinicius Sassine, Maria Lima e Cristiane Jungblut – O Globo
BRASÍLIA - A Procuradoria Geral da República (PGR) já encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) os primeiros pedidos de produção de provas com base na delação premiada do dono das construtoras UTC e Constran, Ricardo Pessoa. O empreiteiro relatou o envolvimento de diversas autoridades com foro privilegiado em esquemas de desvio de recursos da Petrobras e de outras obras públicas. Por ter citado nomes novos, pedidos de abertura de inquéritos serão feitos pela PGR ao STF, além dos procedimentos já em curso contra dezenas de autoridades.
A delação de Pessoa também terá desdobramentos na ação de investigação eleitoral aberta no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para analisar a prestação de contas da campanha à reeleição da presidente Dilma Rousseff. Segundo o ministro João Otávio de Noronha, relator da ação, Pessoa será ouvido no próximo dia 14. Uma eventual comprovação das informações reveladas poderá ser levada em conta no julgamento.
As solicitações de diligências foram encaminhadas pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao ministro do STF Teori Zavascki, relator dos processos envolvendo políticos na Operação Lava-Jato. Os pedidos se referem a casos com investigações em andamento desde março deste ano, quando os primeiros inquéritos relacionados a políticos foram abertos no âmbito do STF. Teori ainda não proferiu decisão sobre os pedidos de produção de provas formulados pela PGR.
Procedimentos sob sigilo
O ministro homologou a delação de Pessoa na última quinta-feira, 25, o que significa que os depoimentos prestados pelo empresário passam a ter validade para o início das investigações sobre os 40 episódios delatados e sobre pelo menos 18 pessoas relacionadas a esses episódios. A partir da homologação, a PGR deu encaminhamento ao STF dos primeiros pedidos de diligências a serem executados pelo órgão e pela Polícia Federal (PF). Esses procedimentos podem ser depoimentos dos investigados e de testemunhas; quebras de sigilos bancário, fiscal e telefônico; ou busca e apreensão de documentos, entre outros. Todos os procedimentos tramitam sob sigilo, inclusive o próprio conteúdo dos depoimentos do dono da UTC.
Com base nas primeiras delações da Lava-Jato que fizeram referência a políticos com foro privilegiado - do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa -, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, encaminhou em março a Teori uma lista de nomes com pedidos de abertura de inquérito. O ministro do STF determinou a abertura dos procedimentos e, desde então, as investigações vêm sendo feitas pela PGR e pela PF. Ao todo, 13 senadores e 22 deputados federais são investigados, entre eles os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Agora, a delação de Pessoa vai ampliar a quantidade de investigados, pois o empreiteiro citou novos episódios e nomes. Caberá a Janot decidir sobre quais nomes deverão haver pedidos novos de investigação. Ainda não há informação sobre encaminhamentos desses pedidos, o que pode ocorrer nos próximos dias.
As menções a autoridades com foro e outros políticos já investigados no STF devem ser remetidas aos inquéritos já abertos no STF. São os casos dos senadores Fernando Collor (PTB-AL), Edison Lobão (PMDB-MA), Benedito de Lira (PP-AL) e Ciro Nogueira (PP-PI), dos deputados federais Eduardo da Fonte (PP-PE) e Arthur Lira (PP-AL) e do ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto. Todos eles já são investigados no STF, por suspeitas como corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Por aparecerem na delação de Pessoa, os inquéritos abertos contra eles terão novas frentes de apuração.
Pessoa delatou ainda uma suposta pressão por recursos para a campanha de Dilma Rousseff à reeleição, com citação ao nome do tesoureiro da campanha, o atual ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Edinho Silva. O dono da UTC também afirmou ter havido caixa dois na campanha de Lula em 2006.
Na delação do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa, também apareceram citações a uma suposta destinação de recursos ilegais à campanha de Dilma em 2010. Segundo Costa, o pedido de R$ 2 milhões foi feito pelo ex-ministro Antonio Palocci, que passou a ser investigado na primeira instância. Janot considerou não haver razões para investigar Dilma. Ele também descartou investigar o senador Aécio Neves (PSDB-MG), citado em delação de Youssef. Agora, as menções à campanha da presidente devem levar a uma nova análise do procurador-geral.
Cinco senadores citados na delação
O dono da UTC citou ainda supostos repasses ilegais à campanha do atual ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, ao governo de São Paulo em 2010; propina para abafar a CPI da Petrobras no ano passado, direcionada ao ex-senador Gim Argello (PTB-DF); compra de informações privilegiadas do Tribunal de Contas da União (TCU), com repasses ao advogado Tiago Cedraz, filho do presidente do tribunal, Aroldo Cedraz; e propina ao então presidente da Transpetro, Sérgio Machado, que ocupou o cargo por 12 anos por indicação de Renan Calheiros.
Pelo menos cinco senadores e três deputados federais foram citados na delação. Há ainda menções à campanha do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), e ao ex-ministro José Dirceu, que recebeu recursos por meio de sua consultoria. A lista tem políticos da oposição: o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP) e o deputado Júlio Delgado (PSB-MG).
Pessoa será ouvido no dia 14 pelo corregedor-geral-eleitoral do TSE, ministro João Otávio de Noronha, na ação de investigação judicial eleitoral protocolada pelo PSDB para cassar o registro da chapa de Dilma e de Michel Temer. Segundo Noronha, o delator terá que provar as acusações.
- Não basta só declarar a doação ao TSE. O senhor Ricardo Pessoa será ouvido. Se provar que o dinheiro doado veio da Petrobras, com a empresa sendo usada como barriga de aluguel para a doação, é fraude. Tudo vai depender da prova.
Ex-presidente do TSE e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Marco Aurélio Mello acha que esses fatos novos serão levados em conta no julgamento desse e de outros recursos do PSDB e da oposição contra a campanha de Dilma, na Justiça Eleitoral. As contas da campanha petista de 2014 foram aprovadas em dezembro no TSE . O PSDB entrou com duas ações para tentar contestar o mandato da presidente.
- O que percebo é que as coisas estão aflorando e revelando as deficiências do sistema. É época de correção de rumos. Mil vezes o conhecimento dos fatos, embora revelem os desmandos dos últimos tempos, do que empurrar para debaixo do tapete. Só lamento que a crise econômica, que ainda não chegou no seu pior momento, agora se agrave com a crise política e o esgarçamento das instituições. Temos que garantir que as instituições funcionem para apurar todas as responsabilidades.
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