O governo, que nas últimas semanas vinha em desabalada carreira a caminho do brejo, logrou fazer um pit stop no Senado. Renan Calheiros ofereceu a Dilma Rousseff um tempo para respirar, em mais uma guinada esperta em sua interessante trajetória política, onde há de tudo – menos altruísmo. Depreende-se daí qual seja o verdadeiro significado da Agenda Brasil, o mais recente episódio da trepidante crise em que o País está mergulhado. Crise, aliás, que nada tem a ver com Dilma, mas é todinha culpa dos Estados Unidos, como Lula constatou após percuciente análise das maquinações do imperialismo ianque feita diante da plateia da 5.ª Marcha das Margaridas, promovida pela Contag em Brasília.
Consubstanciada num pacote de 27 propostas de reformas – 19 das quais já estavam em tramitação – apresentadas pelo presidente do Senado como contribuição ao ajuste fiscal e ao aperfeiçoamento da economia e da administração pública, a Agenda Brasil é a ação mais visível do conjunto de medidas articuladas pelo governo e pelo PT para aliviar a pressão sobre o Planalto e afastar a possibilidade de impeachment de Dilma.
Lideranças do governo e do PT, inclusive o ex-presidente Lula, têm mantido contato com lideranças civis em busca de apoio para ações imediatas que favoreçam, além da defesa do mandato de Dilma, o controle da crise política e econômica. Da crise moral – ou seja, da roubalheira pilhada pela Operação Lava Jato – eles preferem não falar. São claros resultados dessas iniciativas as manifestações dos presidentes das federações da indústria de São Paulo e do Rio de Janeiro, bem como as entrevistas concedidas à Folha de S.Paulo e ao Globo pelo presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco. A tônica dessas manifestações foi, como era de esperar, o apelo à união dos brasileiros para a pacificação política e o combate à crise econômica. A ironia dessa situação é o fato de os petistas, em desespero de causa, se verem na contingência de terem de se valer do socorro “deles”, os representantes da “elite”.
A negociação que resultou na Agenda Brasil, na qual o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, teve papel relevante, garantiu benefícios imediatos tanto para a presidente da República e, consequentemente, para o governo, quanto para Renan Calheiros, que vinha disputando com seu correligionário presidente da Câmara, Eduardo Cunha, um torneio de maldades contra o Planalto.
Para alegria geral dos novos parceiros, o acordo com Dilma provoca desde logo o potencial enfraquecimento político de Eduardo Cunha, a partir da constatação de que os senadores passam a figurar como beneficiários prioritários das benesses governamentais, em prejuízo dos deputados. Afinal, é disso que se trata quando se coloca o que é verdadeiramente mais importante para os parlamentares em geral. Ponto, portanto, para Calheiros, que a partir de agora volta a desempenhar um protagonismo político do qual estava cada vez mais afastado. Além disso, o senador alagoano contabiliza mais dois bônus: a boa vontade do poder central para com seu filho, que governa as Alagoas, e pelo menos a torcida de Dilma para que a Operação Lava Jato o mantenha fora da mira.
Para Dilma, por sua vez, a encenação da Agenda Brasil oferece desde logo a garantia do apoio do Senado à aprovação das medidas restantes do ajuste fiscal e de um contraponto, na Câmara Alta, à “pauta-bomba” que Eduardo Cunha com toda certeza intensificará agora na Casa que preside. Se os tais 27 pontos deixarem de ser meras ementas de projetos, e se isso acontecer em tempo oportuno, a jogada poderá contribuir para a recuperação da confiança dos agentes econômicos. De qualquer maneira, Dilma deverá contar agora com a recondução de Rodrigo Janot à chefia do Ministério Público Federal. Esse ponto do entendimento com Calheiros teria sido facilitado pela verificação de que a Operação Lava Jato não teria apurado contra ele nada que deva ser processado imediatamente. O mesmo já não ocorre em relação a Eduardo Cunha, que ao que tudo indica integrará a primeira lista de políticos denunciados pelo Ministério Público ao STF.
Essa Agenda Brasil que o governo tão festivamente comemora representa, portanto, um alívio para Dilma. O problema é que acordos com Renan não resolvem as graves questões que a presidente tem pendentes no Tribunal de Contas da União e no Superior Tribunal Eleitoral e que podem lhe custar o mandato.
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