segunda-feira, 19 de outubro de 2015

Para Planalto, impeachment se esvazia

Por Rosângela Bittar, Marcos de Moura e Souza e Raphael Di Cunto – Valor Econômico

BRASÍLIA e BELO HORIZONTE - O risco do impeachment foi contido, mas não passou, e o governo não desligou seus alarmes. Fatores de agravamento da crise, como a difícil situação da economia e a Operação Lava-Jato, persistem. O governo considera que obteve alguns trunfos, como a reforma ministerial, que deu fôlego à presidente e o agravamento da situação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que tem a atribuição de acolher pedidos de impeachment. Não só o surgimento de provas agravou a desdita de Cunha, como a abertura de mais inquéritos, o tratamento agressivo a ele dado pelo Ministério Público, bem como a ação forte, rápida, do STF. Para alguns tucanos e aliados, o impeachment "subiu no telhado".

Governo vê impeachment se esvaziar, mas receia fatores imponderáveis

Dilma, na Suécia: para Planalto risco maior já passou, mas há receios sobre Lava-Jato, economia e base aliada

O governo registra que conseguiu, sobretudo pela ação da última semana, domar bem o impeachment, que estava agudo. Mas, sabe que não o matou, ainda. Nem os mais otimistas ministros creem que já podem cruzar os braços, e os pessimistas, então, mantêm a pressão sobre a política em nível máximo.

A vitória, então, está sendo cantada por quê? Especialmente são três as razões para celebrar, como também são três aquelas que levam o governo a ter cautela.

A primeira, do êxito no combate ao impeachment, é que a presidente conseguiu fazer uma reforma ministerial que lhe deu um pouco de ar, mudou o clima, trocou o discurso porque afastou algumas personalidades que cultivam o atrito, e o governo ficou mais cordial, pouco impositivo, nada irracional, passando a ideia de ter se tornado tolerante e negociador. A reforma, porém, está incompleta, não atendeu a uma necessidade básica. Para ter efeito forte, a presidente precisaria surpreender, e não o fez.

Dilma tem um Palácio novo, mais político, mas continua sendo um Palácio do PT, fechado, e aí está o problema. As pessoas - outros partidos, a sociedade, as instituições - não estão dispostos a salvar o PT. Mas como melhorou muito o clima, ficou sendo uma grande reforma.

A segunda razão concreta para a descompressão é que o presidente do Senado, Renan Calheiros, retirou da pauta de votações os vetos presidenciais ao reajuste do Judiciário, adiando um teste dos efeitos da reforma sobre a consolidação da base de apoio no Congresso que poderia funcionar mal numa aplicação precoce. Não se imagina a intensidade do alívio nos partidos.

E a terceira foi o agravamento da situação do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, que tem a atribuição de acolher os pedidos de impeachment. Um agravamento representado não apenas pelo surgimento de provas, de abertura de novos inquéritos, do tratamento agressivo a ele dispensado pelo Ministério Público, bem como pela ação forte, rápida, do Supremo Tribunal Federal. Nunca se viu o STF agir dessa maneira, um absurdo estatístico na Corte.

O STF, que já havia interferido no exercício da presidência de Cunha ao derrubar o rito de apreciação das contas do governo, reprovou também o rito de tramitação do impeachment. Mais, tinha feito outras intervenções de peso, daquela vez no trabalho do juiz Sergio Moro, ao descentralizar a investigação da Lava-Jato, e ao aprovar habeas corpus para presos da cadeia de Moro. O governo avaliou, com dados concretos, que o conjunto da ação do STF lhe foi favorável.

E de maneira acintosa: passou-se a não mais esconder a orientação do ex-presidente do Supremo e ex-ministro da Justiça Nelson Jobim junto aos ministros do STF, e esses passaram a falar abertamente fora dos autos sobre o temperamento, o comportamento e o que não gostam na atitude do deputado. O presidente da Suprema Corte, Ricardo Lewandowski, desferiu ataques a Eduardo Cunha para quem lhe quisesse ouvir, pelos corredores.

Tendo que se virar com a avalanche impressionante de denúncias - ao que parece todo delator tem um arsenal contra o presidente da Câmara, ou terão também sobre outros mas o presidente da Câmara não tem companhia na berlinda do Ministério Público - Eduardo Cunha perdeu-se um pouco na negociação do impeachment, desvio ajudado pela percepção de que a oposição o deixaria sozinho depois que obtivesse o que queria. Com o aprofundamento de sua desdita, Cunha não pode reagir ao refluxo do impeachment, embora seu poder de ação não tenha sido exterminado pelo Supremo: mesmo nas cordas ainda impôs derrotas ao governo.

O risco do impeachment, porém, foi contido mas não passou, e o governo não desligou seus alarmes. Os fatores de agravamento da crise permanecem.

A primeira razão da permanência da instabilidade é a Operação Lava-Jato. Embora se multipliquem as vitórias sobre o juiz Sergio Moro, o resultado do trabalho desse grupo é imponderável para Lula, o PT, o governo, o PMDB, o PP e outros arrolados como fregueses do esquema da Petrobras. Uma das críticas mais ácidas que se fazem em Brasília aponta uma mistura equivocada de atribuições e tarefas em Curitiba entre o Judiciário, o Ministério Público e a Polícia Federal.

A segunda é que o fator econômico também continua imponderável. "Se alguém no mercado acha que o dólar pode chegar a R$ 5,00, é impasse para o governo, isso não pode acontecer". Depois, falta consistência à orientação econômica. "Não pode ter a política do Levy, do Nelson, do Delfim, da Unicamp, do Eduardo Cunha, do baixo clero da área de serviços (aqui se destacam as corporações da indústria, por exemplo, mencionadas jocosamente dentro do governo).

E a terceira é a razão política. A reforma ministerial tem que resultar em manutenção dos vetos, em aprovação de imposto. "A base ainda não passou por um batismo de fogo", diz interlocutor da presidente.

Na análise do governo sobre a sua própria situação, na política mais do que avaliar os fatos do momento é mais produtivo observar as tendências. "Os fatores que agravaram a crise permanecem, mas qual a tendência?" A tendência é a tese do impeachment esvaziar-se.

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