Duas mudanças significativas da postura do PMDB – do discurso antipetista no programa partidário, transmitido em setembro, até o final de outubro. O discurso, elaborado pelo entorno de Michel Temer, claramente preparatório de candidatura presidencial própria, baseada na disputa do antipetismo com o PSDB, foi pouco depois atropelado pelo envolvimento dos caciques do Senado e da maioria da bancada fluminense na Câmara (articulada pelo governador Luiz Antônio Pezão e pelo prefeito do Rio, Eduardo Paes) num salto da representação do partido na “reforma ministerial” montada pelo ex-presidente Lula. Envolvimento que, além de generoso espaço aberto para o chamado baixo clero peemedebista e de outras siglas da base governista, tinha um ingrediente mais importante para tais caciques: a perspectiva de contenção e controle posterior nos tribunais superiores das decisões da operação Lava-Jato. Viabilizável, segundo avaliação de Lula, com a “peemedebização” de um governo Dilma recomposto e reorientado pelo controle que ele passaria a exercer.
A segunda mudança ocorreu no final de outubro com o retorno e o reforçamento daquele discurso, após o presidente Temer barrar a tentativa dos “governistas” de cancelar o encontro nacional do partido este mês. Ao que se seguiu o lançamento do programa anticrise do PMDB. Que retomou o distanciamento crítico em relação ao governo (responsabilizado pela “grave crise” que o país vive) e, mais do que isso, contrapôs-se ao populismo estatizante e inflacionário do lulopetismo, por meio de propostas para reformas pró-mercado da economia.
Cabendo associar o lançamento do referido programa à persistente deterioração dos indicadores econômicos e sociais e ao enorme déficit primário, cujo reconhecimento tornou-se imperativo e deverá desdobrar-se em 2016 (também num cenário de estagflação e de desemprego ainda maior). Bem como vinculá-lo a relevantes fatores político-administrativos e institucionais. Com destaque para a péssima repercussão e o fiasco da “reforma” do Ministério; o ajuste das contas públicas reduzido basicamente ao empenho para aumento da carga tributária; a presidente tendo que manter como principal prioridade as respostas às pressões por impeachment ou renúncia, e sem escapar de elevadíssimos índices de rejeição. Tudo isso agravado pela frustração da perspectiva de Lula e seus sócios no PMDB de esvaziamento das investigações da Lava-Jato. As quais, ao contrário, mantêm-se fortes e desdobraram-se em operações paralelas do Ministério Público, da Receita, da Polícia Federal (Zelotes, Acrônimo) que ampliam os danos para o PT, o PMDB e o próprio Palácio do Planalto. E vão chegando, perigosamente, ao ex-presidente Lula.
Nesse contexto, a dimensão do programa que ganhou relevo, maior que a voltada para o pleito presidencial de 2018, foi a de configurar-se como uma “ponte para o futuro”. Ou seja, a de alternativa à incapacidade política e administrativa do governo Dilma de promover o ajuste fiscal e de combiná-lo com o desencadeamento de reformas capazes de recuperar a confiança dos investidores e começar uma reanimação da economia. Alternativa centrada no vice Michel Temer, e que pode ser precipitada já este mês com um fracasso de duas medidas essenciais para que o ajuste possa ter algum papel positivo, de cuja aprovação no Congresso dependerá uma sobrevida do mandato de Dilma: a repatriação de vultosos recursos de brasileiros no exterior e a recriação da CPMF, ambas de respaldo legislativo improvável.
Convergem agora, articuladas ou não, para a alternativa Temer, por meio de renúncia da presidente ou apoio de grande parte das bancadas do PMDB ao impedimento dela, a retomada de manifestações de lideranças empresariais em favor de resposta urgente às crises política e econômica. Assim como entrevistas recentes do ex-presidente FHC no mesmo sentido. Estas podendo constituir, também, uma pressão sobre a executiva nacional do PSDB, dirigida por Aécio Neves, para que passe a apoiar a participação formal dos tucanos num governo Temer, em troca de compromisso deste, que FHC busca negociar, de que, assumindo agora o comando do Palácio do Planalto, ele não será candidato em 2018. Negociação certamente muito difícil, até por envolver um partido como o PMDB, que tem constituído uma federação de diferentes e contraditórios interesses regionais. E que, desde o mensalão, tornou-se o principal cúmplice do lulopetismo na montagem de abusivo e escandaloso aparelhamento partidário – o fator básico dos megaescândalos do petrolão, nas diversas estatais e em outros órgãos da máquina administrativa federal, como o BNDES e os fundos de pensão.
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Jarbas de Holanda, jornalista
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