• Quatro dias após manifesto de criminalistas contra a Lava Jato, juiz federal afirma que defesa de Marcelo Odedrecht 'enquanto busca retardar o julgamento, reclama nas instâncias superiores pela revogação da prisão preventiva alegando excesso de prazo'
Por Julia Affonso, Fausto Macedo e Ricardo Brandt – O Estado de S. Paulo
Apenas quatro dias depois que mais de uma centena de advogados penalistas e constitucionalistas publicaram manifesto contra a Operação Lava Jato – com pesadas críticas à investigação que desmontou esquema de corrupção e propinas na Petrobrás -, o juiz federal Sérgio Moro afirmou nesta terça-feira, 19, nos autos em que são réus executivos da Odebrecht, que ‘a defesa, enquanto busca retardar o julgamento com novos e intempestivos requerimentos probatórios, reclama nas instâncias superiores pela revogação da prisão preventiva alegando excesso de prazo’.
“O processo é uma marcha para frente. Não se retornam às fases já superadas”, adverte o juiz que conduz a Lava Jato na primeira instância.
O protesto dos advogados, entre eles defensores de políticos e empreiteiros alvos da Lava Jato, foi publicado na sexta-feira, 15, nos principais jornais do País. “Nunca houve um caso penal em que as violações às regras mínimas para um justo processo estejam ocorrendo em relação a um número tão grande de réus e de forma tão sistemática”, afirma o manifesto.
Após a publicação da carta aberta dos criminalistas, as principais entidades de magistrados e de procuradores divulgaram nota de repúdio ao conteúdo do manifesto. Para a Associação dos Juízes Federais (Ajufe), o alvo do protesto dos advogados é Sérgio Moro.
Publicamente, o juiz da Lava Jato ficou e continua em silêncio. Mas, nos autos da ação contra o empresário Marcelo Bahia Odebrecht e Márcio Faria, executivo ligado ao grupo, o magistrado reagiu com veemência.
Em outras ocasiões, o magistrado já havia criticado estratégias protelatórias de defensores de investigados da Lava Jato. Nesta terça, quatro dias depois do contundente manifesto dos advogados, Moro despachou que pedidos formulados na última semana pelas defesas dos empresários – em um dos processos que eles respondem por corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa – , têm ‘caráter meramente protelatório’. A ação em que também são réus outros três executivos ligados à empreiteira (Rogério Araújo, Alexandrino Alencar e César Ramos Rocha) teve a fase de instrução encerrada e está em alegações finais, a última etapa antes da sentença.
Para Moro, os requerimentos ‘são intempestivos, já que a instrução há muito se encerrou, além das provas pretendidas serem manifestamente desnecessárias ou irrelevantes’.
Marcelo Odebrecht, Márcio Faria e Rogério Araújo estão presos desde 19 de junho de 2015, quando foi deflagrada a Operação Erga Omnes. Um a um os recursos interpostos por seus defensores estão sendo vetados pela Justiça. Há dez dias, o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ricardo Lewandowski, rejeitou pedido de liberdade para Marcelo Oddebrecht.
Segundo Sérgio Moro, a defesa de Odebrecht afirmou em petição que haveria uma ‘degravação errônea’ em um vídeo de depoimento do ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa, prestado na fase de investigação. Os advogados pediram ao magistrado que fosse solicitado que o Ministério Público Federal levasse aos autos “todos os vídeos correspondentes aos depoimentos dos réus-colaboradores”.
“Quanto ao requerimento da defesa de Marcelo Odebrecht, observo que os vídeos dos depoimentos prestados pelos acusados colaboradores na fase de investigação foram disponibilizados desde o início da ação penal às partes, como aliás constou expressamente na decisão de recebimento da denúncia. Então, o requerimento já foi atendido anteriormente, não havendo qualquer justificativa para renovação do requerimento pela defesa após o término da instrução”, afirmou.
Paulo Roberto Costa foi interrogado durante a instrução do processo. “Ademais, os acusados colaboradores, inclusive Paulo Roberto Costa, foram ouvidos em Juízo, sob contraditório. Esse é o elemento probatório relevante e não as declarações pretéritas, na fase de investigação. Então, o requerimento é meramente protelatório, pois a prova ao alcance deste Juízo já foi disponibilizada no início do feito.”
Suíça. Durante as investigações, a força-tarefa da Lava Jato descobriu contas secretas de offshores supostamente ligadas à Odebrecht, que teriam sido usadas para pagar propina a dirigentes da Petrobrás. A documentação sobre as contas usadas pela empreiteira no banco PKB Private Bank, na Suíça, é considerada o coração das acusações formais contra Marcelo Odebrecht e os executivos da maior empreiteira do País.
Entre os requerimentos apresentados ao magistrado, os advogados de Marcio Faria pediram a Moro uma ‘cópia de mensagens relativas à cooperação jurídica internacional ou ‘eventuais documentos’ que as autoridades suíças tenham mandado a respeito de suposta exceção quanto ao uso dos documentos enviados por cooperação jurídica internacional’.
Para os investigadores da operação, parte da estratégia de defesa dos empreiteiros é tentar anular o uso dos documentos enviados por autoridades da Suíça. Em agosto de 2015, os advogados defesa da Odebrecht entraram com mandado de segurança no Superior Tribunal de Justiça (STJ), pedindo que a Corte obrigasse o ministro da Justiça, José Eduardo Martins Cardozo, a dar detalhes sobre a cooperação entre autoridades brasileiras e suíças.
Em outubro, o ministro Benedito Gonçalves, do STJ, determinou que o Ministério da Justiça emitisse uma certidão à Odebrecht. O documento deveria conter todas as informações sobre a tramitação de provas bancárias enviadas pela Suíça ao Brasil e que dão base à acusação contra a empreiteira na Operação Lava Jato.
Na decisão nesta terça, Moro afirmou. “O procedimento de cooperação e o material probatório relativo às contas da Suíça supostamente controladas pela Odebrecht e que alimentaram contas supostamente controladas por agentes da Petrobrás já instruem a presente ação penal. Consta ali todo o material pertinente e necessário à ampla defesa. Consta ali a expressa autorização para a utilização dele pelas autoridades brasileiras. Se não houvesse a autorização para a utilização desse material na presente ação penal, é certo que, a essa altura e com a notoriedade do caso, já teria vindo alguma reclamação do estrangeiro.”
O magistrado classificou as questões levantadas pela defesa como ‘especulações fantasiosas’. Moro não considerou necessários ‘quaisquer novos esclarecimentos’ das autoridades suíças ou de cooperação.
“Deveria a defesa preocupar-se mais em esclarecer o que indicam os documentos, os supostos pagamentos de propina feitas pela Odebrecht aos agentes da Petrobrás, do que com as especulações sobre a supostas faltas de autorização, sendo desnecessários quaisquer novos documentos ou esclarecimentos sobre o referido material”, informou Moro.
Segundo o magistrado, os advogados de Marcio Faria também solicitaram cópia “de possíveis evidências quanto à existência” da suposta escuta ambiental instalada na cela de Alberto Youssef, na Superintendência da Polícia Federal, em 2014, em Curitiba, “independentemente de já estar finalizada a sindicância investigativa que apura o evento”.
“Este Juízo, a pedido da Defesa, já solicitou à Corregedoria da Polícia Federal o resultado das apurações acerca da suposta escuta ambiental tão logo se findassem. Atendeu os termos exatos do requerimento então feito pela Defesa. Não cabe solicitar o envio de cópia parcial do procedimento antes de seu término com o risco de prejudicar as apurações ou gerar juízos prematuros”, afirmou Moro. “Tal escuta ambiental, caso tenha de fato existido, não gerou resultado probatório direto ou indireto que tenha sido utilizado neste processo ou em qualquer outro perante este Juízo, sendo o elemento probatório pretendido irrelevante para o julgamento deste feito.”
Os criminalistas solicitaram ainda informações sobre a Operação Crátons, que investiga extração e comercialização ilegal de diamantes em Rondônia, e que seria derivada da Lava Jato. “Não vislumbro como informações sobre Operação Crátons, acerca da extração e comercialização ilegal de diamantes em terras dos índios conta-larga em Rondônia, possa ter alguma relevância para este feito no qual se apura corrupção e lavagem de dinheiro na Petrobrás. Assim, a prova pretendida também é irrelevante”, assinalou o juiz.
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