- O Globo
STF mandou todos voltarem à mesa de negociação. A solução encontrada pelo Supremo Tribunal Federal para o conflito da dívida dos estados foi engenhosa. A ordem dos ministros foi a de que os dois lados voltem à mesa de negociação e em 60 dias encontrem uma saída para o conflito entre entes federados e o governo central. “Devolver à política”, como disse o ministro Barroso. O ministro Facchin acha que as leis que reabriram a questão são inconstitucionais.
Ficou um ponto de dissenso. A liminar deu aos estados o direito de não serem punidos se pagarem menos do que a União considera devido nas prestações mensais. Isso foi usado pelos estados para pagar o que quiserem. São Paulo deveria pagar R$ 1 bilhão por mês e pagou R$ 22 milhões. Somando-se todas as prestações, os estados pagariam R$ 2,98 bilhões e poderão pagar R$ 355 milhões em abril. Isso porque consideraram que a decisão lhes dá o direito de pagar juros simples em vez de juros compostos. Sendo assim, a liminar que existe para evitar um prejuízo iminente dos estados acaba produzindo um prejuízo imediato à União. Foi o que ponderaram os ministros que sugeriram derrubar o que STF havia concedido anteriormente. Contudo, a ponderação que venceu, do ministro Barroso, é de deixar esse alívio temporário com os estados, como incentivo à negociação.
Vários ministros já anteciparam seu voto sobre o mérito. Fachin, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello e Barroso disseram que votarão pelo uso dos juros compostos. Mas querem que, no tempo de dois meses, os dois lados se acertem até sobre os fatos e a matemática. Houve um momento em que ficou claro que a divergência não era apenas sobre a teoria financeira dos juros ou de interpretação jurídica. Estados e União não contam a mesma história e quando fazem os cálculos, com os mesmos fatores, chegam a resultados diferentes.
A sessão de ontem do Supremo foi uma aula em todos os sentidos. Tanto procuradores de Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, quanto a representante da AdvocaciaGeral da União, fizeram sustentações vigorosas e claras. Discorde-se do lado que se quiser, mas o fato é que chegaram preparados. O ministro Luiz Fachin tocou em questão essencial: ele considera que a lei complementar 148, de iniciativa do Executivo, e a lei complementar 151, de iniciativa do Congresso, são inconstitucionais. Estados e União brigam sobre a forma de interpretar um artigo da lei, e o ministro está dizendo que todo o documento legal pode ser inconstitucional.
Essas leis são resultado de mais uma barbeiragem econômica do governo Dilma executada pelos suspeitos usuais: ex-ministro Guido Mantega e ex-secretário do Tesouro Arno Augustin. Eles decidiram reabrir o acordo firmado em 1997 com os estados para mudar o indexador e a taxa de juros e ainda aceitaram incluir um artigo que revê o passado. Para completar, redigiram o texto da lei 148 de forma imprecisa. No novo mandato, mais erros: o que o governo federal estava se dispondo a fazer foi transformado em obrigação nas mudanças feitas pelo Congresso na nova lei, a 151. Uma confusão federal.
Um ponto importante levantado pelos estados é que eles foram prejudicados pela política econômica, principalmente no primeiro governo Dilma. Houve perda de arrecadação com as desonerações tributárias, como a redução de alíquotas do IPI. Além disso, tiveram aumentos de salários e Previdência com a fórmula de reajuste do mínimo.
O ponto importante levantado pela representante da AGU Grace Fernandes é o começo de toda essa história. Os estados estavam quebrados por causa da hiperinflação. Tinham enormes dívidas mobiliárias, junto ao mercado, pelas quais pagavam inflação mais 19,5% de juros. A União assumiu todas as dívidas, passou a ser o único credor e reduziu as taxas de juros para inflação mais 6%. Os estados pressionaram durante anos para trocar de indexador. O IGP-DI sobe muito em época em que o dólar dispara. O governo Dilma aceitou trocar para IPCA e reduziu a taxa para 4%. E deixou espaço para briga judicial no texto da lei.
O STF mandou que todos voltem para a mesa de negociação. Os loucos tempos atuais fazem com que a ordem acabe sendo cumprida por um eventual governo Temer. Sessenta dias é longo prazo no Brasil de hoje.
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