• Pecuarista amigo de Lula está preso e vai depor hoje; ex-primeira-dama e Lulinha optam pelo silêncio
Cleide Carvalho, Dimitrius Dantas* - O Globo
-SÃO PAULO- O pecuarista José Carlos Bumlai vai admitir à Polícia Federal (PF) que fez reformas no sítio de Atibaia a pedido da ex-primeira dama Marisa Letícia, mas vai dizer que a obra seria uma surpresa ao ex-presidente Lula e que, na ocasião, soube apenas que o sítio havia sido comprado por Fernando Bittar, um amigo da família do petista. Esses detalhes serão apresentados, segundo uma fonte próxima a Bumlai, em depoimento hoje na sede da PF em São Paulo.
Bumlai, segundo a fonte, deve afirmar que, quando se dispôs a ajudar, a reforma era apenas “um puxadinho” da casa principal, e que enviou pessoas que estavam fazendo obras em sua usina, a São Fernando. Como o serviço estava devagar, dona Marisa teria reclamado, dispensado a ajuda de Bumlai e dito que queria serviço profissional — “uma construtora de verdade”. Com a saída de Bumlai, a obra foi assumida pela Odebrecht. A OAS também fez serviços de contenção no lago e reformou a cozinha do sítio, onde instalou móveis planejados.
Por determinação do juiz Sérgio Moro, Bumlai deve retornar à prisão no próximo dia 23, depois de cinco meses em prisão domiciliar para tratar um câncer. A defesa do pecuarista recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) argumentando que ele tem 71 anos, é réu primário, tem colaborado com a Justiça e confessou ter feito um empréstimo em seu nome para o PT, sem ter usufruído qualquer benefício.
O juiz Sérgio Moro negou ontem pedido da defesa de Lula para que a investigação seja transferida para a Justiça paulista e voltou a repetir a afirmação do Ministério Público de que o ex-presidente teria se beneficiado das fraudes na Petrobras.
Em nota, a defesa de Lula criticou a decisão e voltou a dizer que o juiz assume o papel de acusador. Para os advogados, não há vínculo entre o sítio e a estatal.
José Roberto Batochio, um dos advogados do ex-presidente, disse que os contratos com a Petrobras representavam não mais do que 4% do faturamento da Odebrecht. Segundo ele, não há “dinheiro carimbado” que prove que reformas no sítio foram feitas com recursos da estatal. Ele chegou a ironizar o fato de a propriedade do sítio ser atribuída a Lula e, no cartório de registro de imóveis, estar em nome de Jonas Leite Suassuna Filho e Fernando Bittar.
— É uma prova material que tem fé pública. Seria o mesmo que dizer que a Torre Eiffel é de qualquer um de nós — disse o advogado.
Marisa e Lulinha faltam a depoimento
Estavam marcados para ontem os depoimentos de Marisa Letícia e Fábio Luís Lula da Silva, o Lulinha, primogênito do casal, no inquérito que investiga o sítio, mas os dois não compareceram. A defesa já havia informado que eles permaneceriam em silêncio. Ontem, os advogados receberam a imprensa para explicar que trata-se de um direito previsto em lei. Nenhum cidadão é obrigado a depor contra um familiar.
— Não é um ato de rebeldia, mas o exercício de um direito consagrado — disse o advogado José Roberto Batochio.
Na avaliação da defesa de Lula, o inquérito do sítio deveria ter sido encerrado, pois Fernando Bittar e Jonas Suassuna Filho teriam comprovado a compra do sítio, pagamento das reformas e entregaram até comprovantes de pedágios de idas a Atibaia, para demonstrar que frequentavam o local.
— Não se pode criminalizar a amizade — disse Batochio, reafirmando que a família Bittar emprestou o sítio a Lula depois que ele deixou a Presidência.
Defesa não teme Odebrecht e OAS
A defesa de Lula afirmou que não teme as delações premiadas dos executivos de Odebrecht e OAS, porque não houve desvio de recursos a favor do ex-presidente. Os depoimentos de diretores e presidentes das duas construtoras têm sido tomados pelos procuradores há semanas, mas ainda não foi fechada nenhuma delação.
— Não tem desvio em relação ao expresidente Lula — disse Batochio.
O advogado afirmou que é preciso “atribuir o verdadeiro peso” às delações, que não merecem “fé incondicional”. Ele comparou os delatores a Judas, que venderam Cristo por 30 moedas, e disse que falam qualquer coisa para sair da prisão. Um eventual pedido de prisão de Lula é visto pela defesa como “arbitrário, escandaloso, execrável e impensável”.
Perguntado sobre o motivo de ter denunciado Moro, um juiz de primeira instância, à Comissão de Direitos Humanos da ONU, ignorando as instâncias superiores da Justiça, Batochio criticou o Supremo Tribunal Federal. Segundo ele, em vários casos o Supremo vem “entendendo contra a Constituição”. Citou como exemplo o afastamento do deputado Eduardo Cunha da presidência da Câmara. Segundo ele, a decisão da Justiça fere a independência entre os Poderes (Legislativo, Judiciário e Executivo) prevista na Constituição. (*Estagiário sob supervisão de Flavio Freire)
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