O novo pacote de concessões de infraestrutura, lançado na semana passada pelo presidente Michel Temer como espécie de divisor de águas para restaurar um ambiente de confiança na economia brasileira, acertou no diagnóstico. O plano evita boa parte dos erros que contaminavam a cartilha da ex-presidente Dilma Rousseff para atrair investimentos privados ao setor.
Quase tudo do que foi dito vai na direção correta e pode ser interpretado como um início inspirador: o fim das taxas de retorno espremidas, a necessidade de apontar viabilidade ambiental nos projetos licitados, mais prazo entre a publicação dos editais e os leilões, a ausência da Infraero nos próximos leilões de aeroportos, o enterro do modelo que usava a Valec como garantidora de contratos de longo prazo das ferrovias, menor dependência de crédito subsidiado para tornar os empreendimentos lucrativos.
O diabo mora no que não foi dito. A estrutura de financiamento ainda se manterá dependente de recursos públicos em um primeiro momento, com a compra de debêntures pelo BNDES e pelo FI-FGTS, sem que se tenha uma ideia clara do grau de disposição de bancos privados em participar da engrenagem financeira dos projetos. Para ficar em uma única fonte de incerteza: a equação fecha, do ponto de vista das futuras concessionárias, com a emissão de debêntures quando os juros básicos estão em 14,25% ao ano? Também não está claro, sem a conveniência dos empréstimos-ponte, quanto tempo vão levar as empresas para obter um financiamento de longo prazo capaz de deslanchar obras que o erário não tem mais condições de executar.
É louvável a disposição do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) em perseguir regras mais amigáveis para o mercado, mas ainda é prematuro afirmar categoricamente que o novo pacote conseguirá extrapolar uma declaração de boas intenções. Não se sabe, por exemplo, como conciliar a acertada combinação de taxas de retorno mais sedutoras ao capital privado e menos crédito subsidiado com tarifas de pedágio minimamente palatáveis aos usuários de rodovias concedidas. O governo poderá encontrar interessados em assumir a Ferrovia Norte-Sul e a Ferrovia de Integração Oeste-Leste (Fiol), que receberam investimentos bilionários da Valec e têm obras em estágio avançado, mas não surgiram explicações novas sobre como tirar do papel projetos ferroviários, como a Ferrogrão, incluídos em programas anteriores de concessão, como as duas malfadadas versões do Programa de Investimentos em Logística (PIL).
Outra pergunta que se manteve sem resposta é como consertar os erros do passado. As licitações de rodovias feitas por Dilma em 2013 começaram bem. O deságio obtido com os lances vitoriosos produziu tarifas aceitáveis e as obras de duplicação tiveram um começo promissor, mas perderam o ritmo e hoje o que se verifica é uma espiral de atrasos no cronograma de investimentos. Os aeroportos repassados à administração privada correram contra o relógio e conseguiram entregar quase todas as ampliações de terminais prometidas para os grandes eventos esportivos, mas ficaram sem dinheiro para pagar valores estratosféricos de outorga. Em todos os casos, o tombo na demanda causado pela recessão prolongada aumentou a agonia das empresas, que acreditaram em um cenário de crescimento sustentável. Pouco se sabe, até agora, a respeito da aguardada medida provisória que acena com a repactuação desses contratos ou a relicitação de projetos cuja viabilidade acabou se perdendo.
Uma das chances de destravar rapidamente novos investimentos em infraestrutura seria a prorrogação antecipada de concessões de rodovias e ferrovias que já se aproximam do final, como a Nova Dutra e a ALL Malha Paulista, que vinham negociando com o governo aportes bilionários em troca de mais tempo à frente de seus ativos. Ao contrário do que se esperava, não houve sinalizações.
A maior parte das incertezas não se dissipará antes da publicação dos editais, e é improvável que haja qualquer desembolso relevante nos projetos anunciados antes de 2018. Por isso, embora tenha agradado mais a iniciativa privada do que suas versões anteriores, o novo programa de concessões ainda não constitui um mapa confiável de como a infraestrutura será modernizada.
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