- O Globo
Numa curta entrevista ao repórter Wilson Tosta o professor Luiz Werneck Vianna lamentou a “balbúrdia manipulada com perícia” pelos “tenentes de toga” do Ministério Público e do Judiciário, “corporações que tomaram conta do país”.
Werneck sabe do que fala. Conhece a História da República e traçou o melhor retrato do Judiciário nacional no seu livro “Corpo e alma da magistratura brasileira.” Durante dez anos ajudou a aperfeiçoar os conhecimentos de toda uma geração de juízes e promotores como professor da Escola da Magistratura. Sua perplexidade diante do rumo tomado pelo conjunto de iniciativas derivadas da Operação LavaJato reflete a ansiedade de um mestre diante do tenentismo togado.
Nos anos 20 o Brasil teve os tenentes fardados. Era uma geração de jovens oficiais salvacionistas e honrados que combatiam uma República oligárquica. Sabiam o que não queriam, mas não sabiam direito onde chegar. Foram engabelados por Getulio Vargas, e a Revolução de 30 desembocou na ditadura de 1937. Para Werneck, os “tenentes de toga” cumprem sua missão profissional mas “não têm o mapa” que mostre a saída. Tomando um episódio extremo ele acha que combater a corrupção dentro das normas da lei é uma coisa, mas “esculacho é outra, as fotografias de Sérgio Cabral e de sua mulher com uniformes de presos foram um esculacho.”
Convivendo com jovens procuradores e juízes, em 1999 ele disse numa entrevista que estava acontecendo algo de novo no Brasil:
“É um revolução resultante da entrada dos filhos da transição no aparelho judiciário. Esse jovens estão mudando a cara da Justiça brasileira. Há empresários brasileiros que falam como americanos, mas nunca fecharam o ‘caixa dois’ de suas empresas. Há jovens banqueiros que parecem saídos de um clube de Nova York e, quando você vai ver, fazem o que fazem. Esses jovens procuradores e juízes são verdadeiros na semelhança com os seus similares americanos. Parecem-se até na gravata folgada abaixo do colarinho. São aquilo que o moralismo político dos anos 1950 e 1960 gostaria de ter sido. Eles vêm da classe média, frequentemente de famílias de servidores públicos. São pessoas com valores muito fortes e uma sólida crença nas leis. Formam a elite intelectual do Estado de Direito. São pessoas que não foram atingidas pela satanização do Estado. Pelo contrário, por acreditarem na lei, acreditam nele. Acima de tudo, sabem a vida de cachorro que levaram para chegar onde chegaram. Por causa deles o Judiciário brasileiro está mudando, para melhor, com uma velocidade maior que a do Executivo e a do Legislativo.”
Se os empresários que acabaram em Curitiba tivessem prestado atenção no que disse Werneck, teriam defendido suas reputações e fortunas, mas quem haveria de dar bola para um professor? Afinal, em 1999 Sérgio Moro era um jovem advogado.
O Brasil mudou para melhor, mas os “tenentes de toga” poderiam prestar atenção ao que diz o mestre.
A cabeça do criminoso de colarinho-branco
Saiu nos Estados Unidos o livro “Why they do” (“Porque eles fazem isso — A cabeça do criminoso de colarinhobranco”). Assim como o “Too big to Jail” (“Muito grande para ser mandado para a cadeia”) é um daqueles livros que, lidos por empresários, podem ajudá-los a economizar fortunas e até mesmo a preservar a própria liberdade.
O autor de “Why they do” é o professor Eugene Soltes, da Harvard Business School. Durante sete anos ele entrevistou e correspondeu-se com cerca de 50 empresários condenados por fraudes, alguns deles presos. Ouviu o inesquecível Bernard Madoff que explodiu em 2008 e hoje rala uma pena de 150 anos pela sua pirâmide que custou pelo menos US$ 20 bilhões a investidores.
Soltes foi fundo. Ele conta a história do combate a esse tipo de crime, desde 1939, quando o professor Edwin Sutherland cunhou a expressão “crime de colarinhobranco.” Sua conclusão é de que que todas as teorias vigentes (cobiça, arrogância ou custo-benefício) não ficam de pé. O criminoso de colarinho-branco faz o que faz porque acha que dá.
Às vezes o sujeito acha que dá e não percebe que com um simples telefonema pode arruinar sua vida. Um professor tinha uma empresa de biotecnologia e criou uma droga que curava um tipo de câncer, mas a agência reguladora não terminara as pesquisas para liberá-la com essa especificação. Quando ele farejou que a licença não viria, telefonou para a filha e disse-lhe que deveria vender as ações da empresa que lhe dera. Os papéis valeram US$ 2,5 milhões. Dias depois a licença foi negada, e as ações perderam dois terços do valor. O professor ficou sem a empresa e viu-se condenado a sete anos de prisão. Estava na cadeia quando a agência reconheceu o valor da sua droga. A firma que pertencera ao professor foi comprada por US$ 6,5 bilhões.
Segundo Madoff, há dois tipos de delinquentes, o que pretende cometer o crime desde a primeira hora e aquele que dá o primeiro passo pensando que conseguirá sair, mas vai em frente. Ele se coloca no segundo, mas essa pode ser mais uma de suas mentiras.
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