Virou lugar-comum a referência ao livro de Zuenir Ventura sobre 1968 (“O ano que não acabou”) em análises sobre o que poderá ser 2017. E com fundadas razões, porque, em vários aspectos, o ano começa com um certo perfil carregado de 2016.
Este, cópia de 2015, quando o embuste eleitoral da campanha da petista Dilma Rousseff — já visível para os mais atentos desde 2013 — explodiu à frente de todos na forma de inflação de dois dígitos, desemprego em ascensão veloz, causado por um ciclo recessivo que se aprofundava.
Na verdade, a crise em si não surpreendeu quem acompanhou a crônica da debacle fiscal do país já sinalizada em fins de 2005, quando a nova ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, descartou, por “rudimentar”, proposta dos colegas Antonio Palocci (Fazenda) e Paulo Bernardo (Planejamento) para limitar os gastos à evolução do PIB.
O conceito antecipava a demonizada PEC do teto 11 anos antes de ela ser aprovada pelo Congresso, no governo do vice de Dilma — defenestrada por impeachment devido àquela mesma fé tosca no desequilíbrio das contas públicas como propulsor do crescimento.
Maquiou a contabilidade da União, atropelou, assim, princípios da Lei de Responsabilidade Fiscal, e entrou para a História pela porta dos fundos: simboliza a primeira punição de alta autoridade por fazer pouco-caso da necessidade de zelar pelo Orçamento, algo nunca levado muito a sério no Brasil. Daí a gangorra de euforias e recessões que ponteiam a República.
Mas, desta vez, o mergulho do PIB, com suas consequências negativas, extravasou os limites históricos. Sequer na Grande Depressão (1929/30) houve algo semelhante: um ano de virtual estagnação (2014) e dois períodos consecutivos de quedas do PIB acima de 3% anuais.
Menos 3,5% em 2016, segundo a última estimativa de analistas do mercado ouvidos semanalmente pelo Banco Central, para produzir o Boletim Focus. O Brasil se aproximará de uma perda de PIB na fronteira dos 10%, algo inédito.
As projeções compiladas em 23 de dezembro pelo BC, para este ano, não desenham uma recessão, tampouco um revigorante crescimento (ver gráficos). As estimativas semanais, porém, já foram melhores que a virtual estagnação de uma expansão irrisória de 0,5%.
Foi quando o otimismo proporcionado pelo impeachment de Dilma Rousseff, em maio, e a consequente saída do lulopetismo do Planalto e da máquina pública, chegou a gerar um ou outro número positivo, principalmente em balcões do varejo.
Nada de maior fôlego, porque a desestabilização fiscal da União e da Federação — mesmo quem consegue equilibrar as contas pode não se livrar de problemas mais à frente — foi obra bem-feita. Por isso, para a recuperação da confiança dos agentes econômicos e consumidores, a fim de que possam fazer as engrenagens do crescimento voltar a funcionar, ficou evidente que era preciso muito mais do que o apeamento do PT.
Neste sentido, a agenda de reformas do governo Temer atende às melhores expectativas: criação do teto para conter o crescimento dos gastos acima da inflação — aprovada, na primeira vitória importante do Planalto sob o comando de Michel Temer — e, como segunda etapa, também crucial, as bases de um novo sistema previdenciário, mais uniforme, centrado na exigência de idade mínima para a habilitação à aposentadoria. Além de outras mudanças também sensatas nas pensões e benefícios sociais.
Há indícios do surgimento de condições para a retomada. Por exemplo, a redução do nível de inadimplência e alguma procura por crédito. Neste pacote de otimismo há, ainda, uma inflação em queda, rumo à meta de 4,5%, e, por isso, o consenso em torno de cortes mais generosos nos juros, fator de impulsão de consumo e investimento, combustíveis para a decolagem do PIB.
Existe, porém, o imponderável da agenda política, em que se encontram a Lava-Jato e o julgamento no TSE do financiamento da campanha da chapa Dilma-Temer. Se 2017 estivesse subordinado apenas ao signo da economia, as incertezas seriam menores.
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