- O Estado de S. Paulo
• Juros que o BC não controla diretamente estão vindo para baixo com força
Quando menos se esperava, uma leve lufada de vento a favor começou a impulsionar o barco do governo Temer. Não se trata, de jeito nenhum, de uma reviravolta positiva. A popularidade presidencial permanece no chão e o desemprego no céu, e essa situação não deve mudar tão cedo. Mas nas últimas semanas surgiu uma série de tímidos sinais positivos no front econômico, alguns derivados da sorte, enquanto outros são frutos já colhidos do bom trabalho da equipe econômica.
No primeiro caso, a configuração astral dos mercados globais se redesenhou recentemente, de forma favorável ao Brasil. Para a economia nacional, é bom que o juro internacional caia e as commodities subam. A rentabilidade do título do Tesouro americano de dez anos, o principal referencial dos juros no mundo, caiu de um pico de 2,6% em 15 de dezembro para 2,34% ontem. Já o CRB, um índice que mede o nível de preço global das commodities, subiu de aproximadamente 400 pontos, em meados de outubro, para 433 nesta quinta-feira.
Fatores internos somaram-se à boa maré externa, empurrando os indicadores brasileiros na direção favorável ao governo. O Ibovespa subiu de 57.110 pontos em 19 de dezembro, o nível recente mais baixo, para perto de 64 mil ontem. O dólar, por sua vez, caiu de R$ 3,47 em 2 de dezembro para menos de R$ 3,18 na quinta-feira.
Mas o melhor da safra de boas notícias vem dos juros internos, e aí entra um forte mérito da atual equipe do Banco Central, liderada por Ilan Goldfajn, que conseguiu colocar o cabresto nas expectativas inflacionárias, que agora estão muito bem comportadas em relação a 2017, 2018 e mais à frente. Um prêmio extra para a turma do BC foi conseguir evitar que o IPCA, a meta de inflação, estourasse o teto de tolerância de 6,5% em 2016 – há poucos meses, ninguém achava que isso fosse possível. O IPCA fechou 2016 em 6,29%.
Ilan e seus companheiros do Comitê de Política Monetária (Copom) jogaram duro desde que o atual presidente do BC assumiu o cargo em junho. Não cortaram a Selic, a taxa básica, nas reuniões de julho e agosto, como muitos pediam, e administraram a conta-gotas a redução em outubro e novembro, com dois cortes de apenas 0,25 ponto porcentual (pp) cada, que levaram a taxa de 14,25% para 13,75%.
O prêmio pela disciplina veio esta semana, quando o BC, escudado no bom comportamento da inflação diante do rigor da política monetária, se permitiu triplicar o ritmo do afrouxamento dos juros, cortando a taxa em 0,75 pp, para 13%.
Que ninguém se iluda, o nível do juro básico no Brasil permanece elevadíssimo, inclusive em termos reais, isto é, descontada a inflação. Para nem falar, é claro, no imenso spread, o adicional acima da Selic, que o cidadão comum e a grande maioria das empresas têm de pagar em seus empréstimos.
Mas agora, com a inflação em rota de convergência para a meta de 4,5% e a atividade econômica ainda na lona, o mercado de juros que o BC não controla diretamente está vindo para baixo com força. Os chamados juros futuros, ou DI, com vencimento em janeiro de 2021, um parâmetro relevante no mercado nacional, caíram de 12,36% em 2 de dezembro para 10,77% ontem. Note-se que, com a decisão do Copom de cortar a Selic em 0,75 pp, o DI de 2021 caiu 0,34 pp em apenas um dia, o que é significativo (fechou em 11,11% na quarta-feira, antes de o BC anunciar sua decisão).
Bem, a lufada é favorável, mas o barco de Temer vai chegar ao destino desejado? Descontando os efeitos imprevisíveis da Lava Jato, dois fatores são cruciais para responder a essa pergunta. O primeiro é saber se Donald Trump não vai desestabilizar a economia global quando de fato assumir o comando dos Estados Unidos. E o segundo é saber se Temer conseguirá aprovar a reforma da Previdência. Sem ela, o Brasil é inviável.
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