• Não é em si preocupante que o indicado tenha passagem pela política, pois magistrados costumam ser independentes, como fica evidente em veredictos no STF
Rara indicação de presidente da República ao Senado para alguma cadeira no Supremo Tribunal Federal deixa de sofrer crítica. Até porque esta prerrogativa dada ao chefe do Executivo torna inevitável um certo caráter político na escolha do nome. É o que acontece com a definição de Michel Temer por Alexandre de Moraes, ministro da Justiça, egresso do governo paulista do tucano Geraldo Alckmin, e ele próprio, Moraes, filiado ao PSDB, do qual já pediu desligamento, como necessário.
É prerrogativa do presidente fazer a indicação de alguém que seja brasileiro nato, maior de 35 anos de idade e com “notável saber jurídico", um conceito amplo demais. O ideal é que o aspirante a ministro do STF tenha mesmo sólida formação na área. Moraes atende ao pré-requisito: advogado, com doutorado na tradicional escola de Direito da USP (Largo de São Francisco), onde leciona, ele ainda é autor de um bestseller sobre Direito Constitucional.
Como de praxe, várias críticas caem sobre o indicado. Na curta passagem pelo Ministério da Justiça, foi alvejado, de forma equivocada, na crise dos presídios, gestada por vários governos. Não só ele esteve presente desde o início em Manaus, onde houve o primeiro massacre entre prisioneiros, como, na exposição do Plano Nacional de Segurança, se a apresentação foi às pressas, a proposta tem o grande mérito de prever um maior envolvimento da União na segurança pública.
Não justifica temores o fato de ele ser ambientado no mundo político. A galeria de ministros do secular STF está repleta deles. Entre os mais recentes, Paulo Brossard e Nelson Jobim, juristas e políticos que cumpriram mandato. O próprio Temer é um constitucionalista. Para ele deve ter sido natural se definir por Moraes.
Os direitos que blindam juízes contra interferências de outros poderes são garantia de que a independência e a isenção podem ser exercitadas na Corte. Lembre-se de que o Supremo que condenou a cúpula petista e outros políticos no mensalão contava com maioria de indicados por Lula e Dilma.
Nos Estados Unidos, cujo modelo de nomeação de magistrados da Suprema Corte copiamos, acontece o mesmo. Lá, a divisão entre liberais/ progressistas (escolhidos por presidentes democratas) e conservadores (por presidentes republicanos) é até mais clara. Há pouco, Trump desempatou os votos na Corte com a escolha do juiz Neil Gorsuch, conservador, para a vaga de Antonin Scalia, de mesmo perfil. Mas nada indica que o placar sempre repita o colorido ideológico do Pleno. O uso do conceito de “raça” em políticas afirmativas no ensino superior americano foi mantido, no ano passado, pelo voto do ministro conservador Anthony Kennedy. Fugiu à lógica.
Moraes deverá chegar ao STF, com sólido apoio do PMDB e PSDB, para herdar processos que estavam com Teori Zavascki, mas não os atuais da Lava-Jato, cujo relator é Edson Fachin. Terá, porém, de votar nos que tramitarão na Casa a partir das delações da Odebrecht. Ao menos, deles não deverá constar Temer, a valer o entendimento de que presidente só pode ser investigado e processado por crimes cometidos no mandato. Assim, não passará por este momento de embaraço. Mas haverá outros, o que é normal. E ele sempre poderá declarar-se impedido de atuar em qualquer julgamento.
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