Por Maíra Magro | Valor Econômico
BRASÍLIA - O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, deve pedir entre hoje e amanhã a abertura de mais de 80 inquéritos ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra deputados, senadores e ministros citados como destinatários de propina nas delações premiadas de executivos e ex-executivos da Odebrecht. Ao mesmo tempo, Janot pedirá a retirada do sigilo da maior parte das 78 delações feitas por dirigentes da empresa.
Porém a divulgação do conteúdo, que vem gerando apreensão no meio político, ainda deve ficar para as próximas semanas.
O Valor apurou que, ao receber o pedido de Janot, o STF levará cerca de dois dias somente para catalogar tudo. A partir daí é que o caso será encaminhado às mãos do ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava-Jato na corte. Fachin, por sua vez, não teria como analisar apressadamente o material, precisaria ao menos de dez dias para manusear o vasto material, segundo seus interlocutores.
Ao recebê-los, Fachin terá que decidir se autoriza ou não as investigações. Também terá que determinar a cisão de alguns fatos entre as instâncias competentes da Justiça. Questões envolvendo parlamentares ficarão no STF. Fatos que digam respeito a governadores serão encaminhados ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Já as questões relativas a pessoas sem prerrogativa de foro serão direcionadas a outras instâncias do Judiciário nos Estados. Só depois de analisar tudo isso é que Fachin poderá decidir sobre a retirada de sigilo das delações.
Para se ter uma ideia, os vídeos com as gravações dos depoimentos dos delatores somam 500 gigabites - volume de dados suficiente para cerca de 700 filmes longa-metragem, ou 1,2 mil horas de vídeo aproximadamente. Por isso, os depoimentos não chegaram a ser digitalizados na íntegra, o que, na visão da PGR, envolveria um trabalho hercúleo e atrasaria o processo. Para facilitar o trabalho de Fachin, procuradores fizeram um resumo escrito do conteúdo das delações. Os pedidos de abertura de inquérito virão acompanhados desses resumos, que farão referência aos depoimentos em vídeo. O ministro deverá consultar os vídeos.
Na "primeira lista de Janot", o então relator da Lava-Jato no STF, Teori Zavascki, morto em acidente aéreo em janeiro, demorou três dias para analisar os 28 pedidos de abertura de inquérito, com 54 investigados, feitos por Janot. A divulgação da lista foi feita no dia 6 de março de 2015. Mas Teori já conhecia bem o caso e o material era muito menor que o da Odebrecht.
No fim da semana passada, advogados de diversos delatores da empreiteira apresentaram petições ao STF para tentar barrar a divulgação dos vídeos das delações à imprensa. Os pedidos foram apresentados depois que correu a informação em Brasília de que a assessoria de imprensa do STF estava recebendo HDs de jornalistas interessados em gravar o conteúdo das delações, inclusive os vídeos, quando o sigilo for retirado por Fachin. O método foi combinado porque, se o material passar a ser acessado pelo sistema processual eletrônico do STF, este sairia do ar imediatamente. A informação gerou pânico entre políticos e advogados, com o surgimento de boatos - inverídicos - de que as delações seriam divulgadas a qualquer momento.
Os advogados dos delatores da Odebrecht argumentam que os vídeos não podem ser divulgados porque seus clientes estão protegidos pelo sigilo, segundo a Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850), que regulamenta o uso da delação premiada. O artigo 5º da lei diz que é direito do delator "não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito".
A intenção das petições, segundo os advogados, não é impedir a divulgação do conteúdo das delações, mas preservar a identidade dos depoentes que fizeram acordos sigilosos com o Ministério Público. Alguns criminalistas dizem temer que seus clientes sofram retaliação com a divulgação dos vídeos.
Se o Procurador-Geral da República não conseguir concluir o trabalho de pedido dos inquéritos até a tarde de hoje, como previa, para enviá-los ao Supremo, o procedimento ficará para amanhã logo cedo, o que agrava o clima de apreensão porque coincide com o depoimento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Justiça, em Brasília, sobre obstrução das investigações da Lava-Jato.
Na última sexta-feira, o ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Herman Benjamin realizou acareações entre Marcelo Odebrecht e os ex-executivos do grupo Claudio Mello Filho, Benedicto Júnior e Hilberto Mascarenhas. As versões mantiveram as contradições, sobretudo em relação a um jantar no Palácio do Jaburu, em 2014, no qual teria sido acertada uma doação da Odebrecht ao PMDB.
Marcelo sustentou que o presidente Michel Temer, à época vice, não teria solicitado pessoalmente a ajuda da empreiteira, ao contrário de Melo Filho. Mantiveram a versão original dos seus depoimentos.
O ex-executivo da Odebrecht José de Carvalho Filho teria, em seu depoimento também ao TSE, revelado que o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, intermediou o pagamento de caixa dois ao PMDB, definindo os locais para a entrega do dinheiro da empreiteira mediante senhas. Ao Valor, a assessoria de Padilha afirmou que o ministro está em repouso médico e não se manifestaria.
O ex-diretor da Odebrecht Carlos Armando Paschoal teria relatado em sua delação o repasse de R$ 500 mil, por meio de caixa dois, para a campanha ao Senado do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB/SP), em 2010. Hoje Ministro das Relações Exteriores, Aloysio Nunes negou, em nota, as acusações e disse que pedirá acesso à íntegra do depoimento do ex-executivo da empreiteira. (Colaborou Marcelo Ribeiro, de Brasília).
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