- Valor Econômico
Depois do rali da taxa de juro, a bolsa é ativo do momento
A nova 'Selic' de Donald Trump, a lista de Janot e a Previdência no Congresso são a essência da semana e podem impor inconveniente atraso nas reformas estruturais urgentes ou fortalecer a perspectiva mais benigna para o Brasil aberta pela inflação colada à meta e pela percepção de que a recessão ficou para trás.
Os pedidos que o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, encaminhará ao Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar autoridades com foro privilegiado citadas nos depoimentos de executivos da Odebrecht, no âmbito da Operação Lava-Jato, têm potencial para instalar o caos no Congresso. O suposto envolvimento de um sem número de parlamentares na 'lista de Janot' pode justificar atrasos na avaliação da reforma da Previdência - seja por ampliação das investigações da Lava-Jato, seja pela mobilização se opositores ao projeto do governo para a reforma.
Esse cenário, de várias possibilidades e pouca definição, não impedirá, contudo, que o país faça as reformas necessárias sem afugentar investidores. "Estou otimista porque, desta vez, corremos o risco de dar certo", afirma Eduardo Castro, superintendente executivo do Santander Asset Management. Em entrevista à coluna, ele explica que há um alinhamento de conjuntura que justifica esse otimismo, "o que não quer dizer que não haverá volatilidade". "Tanto o cenário doméstico quanto o externo são favoráveis na soma de prós e contras."
O mundo está crescendo, lembra o executivo. "Assistimos à revisão constante de projeções para o PIB nas grandes economias e nas emergentes. Prova isso a alta das commodities. Até poucos meses, não trabalhávamos com a perspectiva de preços tão firmes, seja minério de ferro, cobre ou produtos agrícolas. Claro que há questões de oferta e demanda por trás dessa evolução tão positiva, mas parte se deve à reação da economia global."
Para o Brasil, diz Castro, há o efeito positivo de aumento nos termos de troca, déficit em conta corrente absolutamente financiável por investimentos diretos. O déficit brasileiro ronda 1% do PIB enquanto investimentos diretos, 4%.
A perspectiva de crescimento econômico global torna o ambiente mais propício para aumento de taxa de juro, reconhece o superintendente do Santander Asset, tanto que os dirigentes do Federal Reserve, o banco central americano, mudaram o tom dos discursos. "Ficou claro que o Fed deve elevar o juro na quarta-feira. A probabilidade de que isso aconteça saiu de 30% para quase 100% em uma semana. E, ao contrário de outras vezes, não houve realização maciça em outros mercados e tampouco nos emergentes".
Castro entende que as eleições europeias e a transição de poder na China - que começará a ser articulada em outubro - adicionarão volatilidade aos ativos no mundo inteiro. Porém, na ótica do cenário global, até mesmo a alta do juro americano é uma boa notícia para o Brasil. Internamente, os sinais são de fortalecimento da tese de continuidade mesmo com eleições presidenciais em 2018.
"As reformas levarão à retomada mais forte da economia. Temos projeção de expansão de 3% para o PIB brasileiro em 2018 uma que deve promover uma reversão do desemprego", avalia Castro que não vê possibilidade de uma proposta política que se oponha à atual prosperar.
"Em termos econômicos o Brasil quase faliu, mas conseguiu reverter essa situação, o que fragiliza qualquer outra intenção de política econômica. É fato que temos uma indefinição enorme quanto às possíveis candidaturas à Presidência do Brasil, há incertezas quanto aos efeitos da Lava-Jato sobre nomes óbvios do cenário eleitoral brasileiro, mas é fácil inferir que a continuidade do atual modelo tem mais chance que um cenário de ruptura econômica ou política."
É cristalino, na visão de Castro, "o consenso de que o grande problema do Brasil é fiscal", mas soluções foram encaminhadas. "Surpreendeu a velocidade e a integridade da proposta para limitar o gasto público", diz. "A perspectiva de aprovação da reforma da Previdência é um fato. Calculamos que passará em 1º turno na Câmara na primeira quinzena de abril."
Para ele, existem riscos para as reformas, mas há também um alinhamento de interesses entre Legislativo e Executivo para que tudo dê certo. "Há consciência de que a reforma previdenciária ajudará na recuperação econômica pela via fiscal. Também por essa razão insisto no meu otimismo cauteloso, até porque a proposta é de reforma previdenciária, trabalhista e tributária e uma série de microrrefomas que darão ao país um aparato bem mais equilibrado para promover o desenvolvimento".
O momento é de grande importância para atrair investimentos, diz o especialista, para quem o Brasil está no exato trânsito de uma situação em que os preços dos ativos refletem uma correção de rumo com ajuste minimamente necessário para o trem não descarrilar, para outra situação em que os preços dos ativos indicarão que, estruturalmente, o país mudou.
"Essa segunda situação ou tese de investimento está sendo testada com o que está posto: o Brasil passou por uma recessão sem precedentes, o Banco Central detém credibilidade e a inflação está sob controle por uma ancoragem brilhante. Nessas condições, o próximo ativo financeiro a valorizar com o ciclo econômico é bolsa", diz Castro. Ele reconhece que a bolsa brasileira já subiu muito, mas pode subir muito mais porque sua valorização se dá em base muito baixa. Outra informação relevante é a evolução das projeções de lucro das empresas.
"Até agora, o mercado trouxe a valor presente um fluxo de caixa por juro menor. É quase um efeito matemático da taxa de juro. O momento é de revisão de fluxo. Não estarão as previsões de fluxo de resultados subestimadas para um cenário de economia equilibrada e em reação? Quando se observa as grandes economias, é óbvio que vivem ciclos de expansão e retração, mas não no ambiente caótico que vivemos nos últimos anos."
Os investidores internacionais reconhecem hoje que perderam o momento de investir em juros, inclusive, porque, a despeito do tenso ambiente político, observou -se um rali no Brasil. Quem não entrou no mercado de juro na hora certa perdeu a oportunidade e resta agora aguardar novo ciclo ou apostar em outro ativo. No caso, a bolsa.
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