- Folha de S. Paulo
"Quem avisa amigo é. Se o governo continuar deixando que certos jornalistas falem em eleições; se o governo continuar deixando que determinados jornais façam restrições à sua política financeira; se o governo continuar deixando que alguns políticos teimem em manter suas candidaturas; se o governo continuar deixando que algumas pessoas pensem por sua própria cabeça (...), dentro em breve estaremos caindo numa democracia."
A advertência foi feita por Millôr Fernandes no oitavo número do "Pif Paf", em agosto de 1964. O governo não achou graça: fechou a revista.
Na segunda-feira (27), o país completou cinco anos sem Millôr. Poucos brasileiros incomodaram o poder durante tanto tempo e com tanto humor, sob regimes militares ou civis.
Sua mira era precisa. Às vezes, bastava-lhe uma frase contra o presidente da vez. Sobre FHC: "Fernando Henrique Cardoso acha que essas são as três palavras mais bonitas do mundo". Sobre Lula: "A ignorância lhe subiu à cabeça". Sobre Collor: "Deu ao povo uma coroa de espinhos e ainda ficou com os 30 dinheiros".
Millôr tinha predileção por políticos que se julgam escritores. Quando Sarney lançou "Brejal dos Guajas", sentenciou: "Não é caso de crítica literária. É caso de impeachment".
Ele desprezava a censura e não confiava em imprensa a favor. "Todo governante se compõe de 3% de Lincoln e 97% de Pinochet", dizia. Seu lema: "Jornalismo é oposição. O resto é armazém de secos e molhados".
Na terça (28), o presidente Temer expôs ideias diferentes. Ele elogiou a "imprensa livre", mas cobrou que os fatos sejam relatados "convenientemente". Em fevereiro, o Planalto pediu censura judicial a uma reportagem que citava a primeira-dama.
Quando Millôr morreu, Temer ainda era apenas um "vice decorativo". Azar nosso. Seria divertido ler sua crítica aos poemas do presidente.
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Volto à coluna em maio. Até lá.
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