- O Globo
MP abre a caixa de mistérios do caso do Panamericano. No turbilhão de notícias da semana, teve pouca atenção a Operação Conclave. Ela investiga a decisão da Caixa de comprar, em 2009, um banco quebrado, sem notar sua situação falimentar, sem ter uma conta caução que lhe desse garantias e permitindo, no final da operação, que o acionista da instituição, o grupo Silvio Santos, saísse com lucro e ela ficasse com todo o prejuízo.
Tudo nesse caso do Panamericano é misterioso. Já houve inquérito sobre a fraude financeira e contábil que quebrou o banco, mas agora o Ministério Público está investigando como e por que foi feita uma compra tão prejudicial aos cofres públicos. “A operação sob investigação foi extremamente lesiva ao Erário e ilegal, tratando-se aqui, em linguagem simples e direta, de uma aquisição criminosa de um banco falido por um banco público”, diz o documento do Ministério Público e da Polícia Federal.
A Caixa Econômica Federal (CEF) pagou R$ 740 milhões pelo banco e menos de um ano depois se descobriu que havia um enorme rombo, calculado inicialmente em R$ 2,5 bilhões e depois reavaliado para um total de quase R$ 4 bilhões. A CEF teve outros gastos com a operação. Os responsáveis não adotaram nenhum dos procedimentos que garantissem os interesses da instituição, como cláusulas para desfazer o negócio em caso de passivo oculto.
Na época, disseram que havia sido dada uma solução de mercado. Balela. Ainda bem que isso está sendo investigado mais profundamente. Houve uma operação abafa. O Fundo Garantidor de Crédito (FGC) emprestou R$ 3,8 bilhões, mas depois aceitou como pagamento R$ 450 milhões dados pelo BTG Pactual e liberou as garantias dadas pelo grupo Silvio Santos. O FGC disse que seus recursos eram privados. Na verdade, o Fundo foi criado para garantir depositantes, correntistas e investidores de bancos que falissem. E é capitalizado com um percentual sobre os depósitos bancários, com o custo transferido para os clientes das instituições. E foi usado para salvar uma instituição falida, liberar os bens do empresário, e a Caixa ficou com o seu prejuízo. Detalhe: os conselheiros do FGC eram os bancos Itaú, Bradesco, Banco do Brasil e Caixa. Os três primeiros eram credores do Panamericano, o outro era a instituição interessada em salvar-se do incêndio.
A descoberta de que o banco tinha um rombo gigante foi do Banco Central, em uma tardia verificação da solidez da instituição, depois que a Caixa já havia pago pelo ativo. O BC havia dado autorização preliminar para a compra. As consultorias que analisaram a operação — Delloite, Banco Fator, KPMG e o escritório de advocacia Bocater, Camargo, Costa e Silva — haviam aprovado a operação. Alguns dos que tomaram as decisões, e o escritório de advocacia, estão sendo investigados na Operação Greenfield, sobre fraudes em fundos de pensão. Houve uma cegueira coletiva. Deliberada? Isso é que se está investigando.
O Panamericano foi comprado em dezembro de 2009 com o desembolso de 70% do preço à vista. A autorização do Banco Central para efetivar a compra saiu em julho de 2010, quando a Caixa pagou o resto. Dois meses depois, em setembro de 2010, o então presidente Lula se reuniu com Silvio Santos para discutir esse assunto, segundo informou Luiz Sandoval, ex-presidente do grupo. Nessa época, o Banco Central havia descoberto os primeiros indícios de fraude no banco e pedira informações. A Caixa, a essa altura, já havia pago tudo. Em 29 de outubro, o BC anunciou que havia descoberto o rombo causado por fraude que consistia no seguinte: a instituição vendera carteiras de crédito, mas manteve esses ativos em seu balanço. O acordo de acionistas foi assinado pela Caixa só em novembro. A Caixa poderia ter pedido o dinheiro de volta e anulado a operação? Muitas dúvidas cercam a transação.
O Banco Central soltou nota esta semana repetindo o que sempre disse em sua defesa: que foi ele que descobriu a fraude em uma de suas fiscalizações. A dúvida é por que não viu antes de se autorizar a compra.
Esta semana, o MP pediu ao juiz uma série de medidas cautelares, quebras de sigilo, busca e apreensão, para continuar investigando uma transação que não seguiu nenhum dos cuidados que precisava seguir e deu enorme prejuízo para os cofres públicos. Que o turbilhão que vive o país não encubra mais esse estranho caso.
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