Ao destinar grande parcela do Orçamento para aposentadorias, principalmente de servidores, e folha de salários do funcionalismo, Estado compromete futuro do país
A crise fiscal de dimensões históricas força reformas estruturais, como a da Previdência, e expõe mazelas de toda ordem, principalmente nos gastos públicos — da União, de estados e municípios. Há, então, um aspecto positivo, até pedagógico, de a crise indicar graves desvios no funcionamento do Estado, enquanto força reflexões sobre causas e medidas corretivas.
Os próprios efeitos da recessão — deflagrada pelo aumento do risco de insolvência do Tesouro, causado pelo lulopetismo — impactam a população de formas muito diversas, e isso por si só já alerta para carências.
Na edição de domingo, O GLOBO trouxe informações graves de pesquisa da economista Sonia Rocha, do Instituto de Estudos de Trabalho e Sociedade (Iets), sobre o efeito desse período de dois anos de profunda recessão, antecedidos por um de estagnação, sobre crianças e jovens, parcela vulnerável da população. A pobreza entre eles, até o limite de 14 anos de idade, que atingia a parcela de 25,8% em 2014, aumentou, um ano depois, para 29% —, e 2016 também foi de recessão. A situação piorou ainda mais, portanto.
Paralelamente a isso, de 2004 a 2015, a proporção de pobres em toda a população caiu de 33% para 16%. Confirma-se, então, o segmento de crianças e jovens como o mais sacrificado na crise. E não apenas nela.
Na faixa de 14 a 24 anos, a taxa de desemprego chegou a 30%, pouco mais que o dobro do índice médio de toda a população (13,7%, no primeiro trimestre.) Além de mais pobres, até porque têm difícil acesso ao mercado de trabalho, os jovens também são as maiores vítimas da violência.
Outra comparação negativa: de 2004 a 2015, o contingente de até 14 anos de idade teve seu peso na população reduzido de 27,4% para 21,2%, mas entre os pobres caiu bem menos : de 41,9% passou para 38,3%.
Com os idosos, ocorreu o oposto. No mesmo período, a participação dos de 60 anos e mais passou de 9,6% para 14,3% na população, mas seu peso entre os pobres ficou entre 3,2% e 3,6%.
Todas estas e várias outras estatísticas apontam para o diagnóstico de que as políticas de gastos do Estado privilegiam os mais velhos, relegando a plano secundário crianças e jovens. Apesar de todo o discurso dos governos ao contrário, à direita e à esquerda.
O fato de os gastos com a Previdência — aposentadorias, pensões e auxílios — absorverem cerca de 50% das despesas primárias da União (exceto juros) explica quase tudo. São despesas, por óbvio, canalizados para adultos.
Ficam em segundo plano despesas destinadas à Educação — de que crianças e jovens dependem de forma crucial. Há ainda a ação de grupos organizados na burocracia do Estado, com grande influência no Legislativo, capazes de se apropriar de grandes parcelas orçamentárias, para garantir altos salários e generosas aposentadorias.
Não é portanto, por acaso, que o Brasil é um país símbolo de injustiças sociais. Como esta de manter crianças e jovens na pobreza, vítimas da violência e com baixo nível educacional. A crise tem mostrado a todos esta tragédia. E que não se trata de uma deficiência conjuntural. A usina nacional de miséria está sempre em operação. Só que no momento ela se encontra mais visível.
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