Advogado de Temer quer enfrentar Janot em comissão
Para procurador-geral, acusação tem uma ‘narrativa fortíssima’
Ao entregar a defesa do presidente Temer na Câmara, o advogado Antônio Cláudio Mariz chamou de “peça de ficção” a denúncia apresentada pelo procurador-geral, Rodrigo Janot, e disse que não há provas de corrupção. Mariz atacou o instituto das delações premiadas que, segundo ele, tem sido “instrumento de impunidade que transforma delatores em paladinos da verdade”. E desafiou Janot, afirmando que gostaria de enfrentá-lo na CCJ. O procurador disse que a denúncia “tem uma narrativa fortíssima”.
A versão de Temer
Mariz diz que denúncia é ficção e envia vídeos a deputados; presidente convoca 22 ministros
Cristiane Jungblut, Eduardo Bresciani e Gabriel Cariello, O Globo
-RIO E BRASÍLIA- O advogado Antônio Cláudio Mariz de Oliveira protocolou ontem a defesa do presidente Michel Temer na Câmara e disse que a denúncia formulada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acusando o presidente de corrupção passiva, é “uma peça de ficção” e o desafiou a provar as acusações. Além da peça de defesa de 98 páginas, Mariz enviou a cada um dos 513 deputados um vídeo de três minutos com seus argumentos contra a denúncia. No vídeo, ele diz que o presidente é “honrado” e tem “trajetória imaculada”.
Depois da apresentação da defesa, o presidente convocou todos os seus ministros ao Palácio do Planalto. No encontro, na véspera do seu embarque para a reunião do G20 na Alemanha, onde deve ficar até sábado, Temer reuniu titulares de 22 pastas. Os ministros da Fazenda, Agricultura, Defesa, Transparência e Cultura foram representados interinamente — as duas últimas pastas estão vagas há mais de um mês. O encontro só foi divulgado 15 minutos antes de seu início.
Após protocolar a defesa, Mariz negou que o mandato de Temer esteja na UTI. Ao responder a uma pergunta na entrevista coletiva, brincou:
— Não sou médico e não conheço bem as divisões do hospital, mas eu diria que ele está na lanchonete, está comemorando, está pensando, trabalhando pelo país. O presidente quer trabalhar pelo país, é preciso que se tenha presente que essa acusação não é contra um cidadão comum. Essa acusação é contra o presidente e contra o Brasil.
O advogado fez várias críticas à denúncia apresentada por Janot e cobrou provas. Disse ainda que adoraria enfrentar Janot, o empresário Joesley Batista e até o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, que a oposição gostaria de ouvir na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Mas disse que esses pedidos deverão ser rejeitados porque não estão previstos no Regimento da CCJ. — Seria absolutamente conveniente para que eu tivesse a oportunidade de demonstrar a ausência de provas, de interrogá-los. Porque eles foram ouvidos sem a presença da defesa. Agora, se não é do Regimento, se não é comum na CCJ a instrução procedimental, e parece que não é, isso é uma questão que deverá ser decidida pelo presidente da Comissão. Acho que ele deverá indeferir. Agora, se perguntarem se eu quero, quero sim. Sou homem do contraditório — disse Mariz, ressaltando não haver indícios. — O presidente não cometeu crime, não cometeu corrupção passiva. E eu lanço um respeitoso desafio aos acusadores para que demonstrem, através de um único indício que seja, mais frágil que seja, que o presidente da República teria solicitado algo, recebido algo ou favorecido alguém. A defesa está absolutamente consciente de que a acusação não se funda em prova e sequer se funda em indício. A peça acusatória é uma peça de ficção. É baseada em hipóteses, suposições, criações incidentais, fruto da inteligência do procurador-geral, mas que fugiu da realidade.
ARGUMENTOS CONTRA OS R$ 500 MIL
No material entregue aos deputados, a defesa do presidente afirma que Temer não autorizou o ex-assessor Rocha Loures a fazer “tratativas espúrias” em seu nome. É a primeira manifestação do presidente sobre o mérito da acusação de que seria o beneficiado da mala de dinheiro recebida por Rocha Loures.
“De toda sorte, nobres deputados federais, ainda que Rodrigo Loures pudesse ser o seu interlocutor, a denúncia não descreveu nenhum interesse ilícito anuído pelo sr. presidente da República, na medida em que Michel Temer nunca autorizou àquele realizar qualquer tratativa espúria com quem quer que seja em seu nome”, afirma trecho da defesa.
A peça prossegue tentando desvincular Temer dos R$ 500 mil recebidos por Rocha Loures em ação controlada gravada pela Polícia Federal. A defesa sustenta que a ligação do presidente ao dinheiro estaria apenas na declaração de delatores Joesley Batista e Ricardo Saud, ambos da JBS.
“Igualmente, não há nos autos do inquérito um elemento informativo sequer que demonstre tenha o sr. presidente da República cometido ou consentido com a perpetração de eventual crime de corrupção passiva. Tirante as declarações prestadas por Joesley Batista e Ricardo Saud no sentido de que o dinheiro entregue a Rodrigo Loures seria para Michel Temer, não há nenhuma prova sequer indiciária de que tenha ele praticado qualquer ilícito”, afirma a defesa.
Em entrevista, Mariz disse que o presidente “não prevaricou” ao ter se encontrado com o empresário Joesley Batista:
— O presidente encontrou Joesley Batista como encontrou inúmeras pessoas, é bom que se diga, fora de agenda, noturnamente, encontros noturnos, vários políticos, vários advogados, vários homens públicos, vários representantes de várias instituições do Estado. Não houve, por parte do presidente nesse encontro, nada anômalo, nada estranho.
SEM ECONOMIA NOS ADJETIVOS CONTRA A PGR
Em diversos trechos a defesa ataca a denúncia, que chama, entre outros adjetivos, de “chocha”, “capenga”, “pálido” e “ficcional”. Há ainda questionamentos sobre se a gravação da conversa entre Temer e Joesley foi adulterada, apesar de a Polícia Federal ter descartado tal hipótese. Classifica-se ainda essa prova como ilícita.
Mariz ressalta, em diversos pontos, que não haveria prova do dinheiro ter chegado a Temer. A mala acabou sendo devolvida por Rocha Loures, após a deflagração de uma operação da PF, com R$ 465 mil. O ex-assessor depositou posteriormente outros R$ 35 mil.
“O outro aspecto ao qual se empresta importância capital para a acusação refere-se ao fato em si apontado como criminoso: o presidente teria recebido R$ 500 mil pelas mãos de terceiros, por ordem de Joesley. A infamante acusação vem desprovida de provas. Não se aponta quem entregou para quem; onde ocorreu o encontro para a entrega; qual o dia desse encontro, horário. (...) E esses dados não foram colocados na denúncia simplesmente porque inexistem”, afirma.
Em outro trecho, a defesa rebate que a indicação de Rocha Loures a Joesley, na conversa gravada no Jaburu, tenha sido feita para tratar de negócios escusos. Para o advogado, tal interlocução foi sugerida apenas para que o dono da JBS não mais o procurasse. Mariz sugere que a acusação contra Temer seria apenas uma manifestação política contra seu governo. “Estaria Michel Temer sofrendo os dissabores de uma denúncia exclusivamente em razão de ser o presidente da República, em uma verdadeira manifestação política contra os seus ideais de governo? Ao que nos parece, Michel Temer está, sim, infelizmente sendo denunciado somente em razão dessas condições!”, diz.
No fim, são dedicadas ainda cinco páginas a questionar o benefício da delação premiada. “Observa-se que, além de suas intrínsecas irregularidades e anomalias em relação ao nosso ordenamento penal e processual penal e à própria Constituição, a delação tem sido um instrumento de impunidade que transforma delatores em paladinos da verdade e auxiliares da justiça”, diz trecho da peça.
Há ainda questionamentos ao benefício da imunidade concedida aos delatores da JBS: “Acinte, escárnio, tapa na cara, vergonha nacional e outros tantos epítetos estão sendo utilizados para adjetivar os benefícios concedidos aos ‘irmãos metralha’”.
Mariz conclui apelando a um “patriotismo” dos parlamentares para rejeitarem a denúncia.
(Colaborou Eduardo Barretto)
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