Por não entenderem o momento em que se encontra o país, deputados alteram programa de renegociação de débitos tributários e o transformam em anistia
Não há quem desconheça, nem que seja pelos seus efeitos, o período da crise de dimensões históricas iniciado com uma estagnação em 2014 e seguida por duas recessões, em 2016 e 2017, que destruíram aproximadamente 8% do PIB, número inédito, e 14 milhões de empregos formais. Mas há em Brasília quem demonstre não ter consciência desta hecatombe econômica e social.
A tramitação irresponsável de mais uma proposta de parcelamento de débitos tributários, incluindo contribuições previdenciárias, chamada de Refis, reflete este distanciamento da realidade por parte de políticos, refletido na adulteração feita na projeto do governo.
O Refis é lançado quando a equipe econômica, diante de problemas de caixa no Tesouro, oferece ao contribuinte inadimplente a oportunidade de renegociar o débito, em um prazo palatável, com algum abatimento no que é devido, contanto que o devedor se comprometa a fazer pagamentos regulares.
É o que os economistas chamam de um acordo “ganha-ganha”, em que nenhum lado perde. O governo vê aumentar a receita tributária, devido aos pagamentos que passam a ser feitos pelo ex-inadimplente; enquanto este recupera o alvará de bom pagador, para voltar a obter empréstimos em instituições públicas e a participar de licitações abertas por organismos oficiais.
Foi para isso que o governo Temer enviou ao Congresso, em janeiro, uma dessas propostas de renegociação de débito tributário, com a meta de arrecadar R$ 13,3 bilhões, uma receita não prevista inicialmente.
O desatino está nas mudanças que parlamentares fizeram no projeto, de tal forma que a estimativa de receita com este Refis desabou para minguados R$ 420 milhões.
O mundo político está repleto de histórias desabonadoras, algumas convertidas em inquéritos, que se desdobraram em denúncias, processos e condenações. O quadro ético é tenebroso. Agora, há esta colaboração de políticos, para degradá-lo ainda mais.
Um deles, Newton Cardoso Jr. (PMDB-MG), é relator da proposta do Refis, e aproveitou o projeto para transformá-lo num mais que generoso perdão de dívidas, inclusive de vários parlamentares, como pessoas físicas e também donos de empresas em débito com a Receita.
O próprio Cardoso Jr. deve R$ 51 milhões ao Erário, revelou o jornal “O Estado de S.Paulo”. Será beneficiado por ele mesmo — caso o Refis adulterado não venha a ser vetado, como necessário. O deputado, inclusive, é reincidente, pois fez o mesmo numa relatoria anterior.
É certo que manobras baixas deste tipo não não devem ser vistas como símbolo do Congresso como instituição. Mas, por uma série de circunstâncias, está muito baixo o nível da representação política. E isso fica explícito em descalabros como este.
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