Por Raymundo Costa | Valor Econômico
BRASÍLIA - O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, perdeu as condições políticas para apresentar a segunda denúncia contra o presidente Michel Temer. Na prática, tem menos de dez dias para tirar o MPF de uma roubada que pode comprometer a Operação Lava-Jato e os processos que correm no STF. Juridicamente, a revisão da delação da JBS abre um flanco para a defesa de Temer
Temer ganha fôlego mas Lava-Jato está na berlinda
O procurador-geral Rodrigo Janot perdeu as condições jurídicas e políticas para apresentar a segunda denúncia contra o presidente Michel Temer, conforme havia prometido, até 17 de setembro, data em que deixa o cargo e assume em seu lugar a procuradora Raquel Dodge. Na prática, Janot tem menos de dez dias para tirar o Ministério Público Federal de uma roubada que pode comprometer a Operação Lava-Jato, sobretudo no que diz respeito aos processos que correm no Supremo Tribunal Federal (STF). Sem falar das explicações que Janot deve sobre suas relações com Marcelo Miller, o procurador que virou casaca enquanto ainda integrava o MPF para defender as cores da JBS.
Juridicamente, a revisão da delação da JBS abre um flanco para a defesa de Temer avançar. Ela não apaga o áudio da conversa de Joesley Batista com o presidente, que fundamentou a primeira denúncia, que não prosperou, mas deixa dúvida sobre a legalidade da prova. Mas se o áudio for uma prova obtida ilicitamente, é o tal do fruto da árvore envenenada de que falam os advogados. Politicamente, a revisão dá argumento para o presidente reafirmar ao Congresso que é vítima de uma armação entre o empresário e o procurador-geral.
A posição de Janot é agravada pelas suspeitas de que há mais áudios além daqueles entregues por Joesley Batista na quinta-feira. Não foi por acaso que a defesa do presidente pediu acesso à perícia das gravações feita pela Polícia Federal (PF), que detectou a existência de outras gravações, mas foi ignorada pelo ministro Luiz Edson Fachin, relator dos processos da Lava-Jato no STF.
Duas outras frentes da Lava-Jato abertas pela procuradoria-geral da República, em Brasília, também estão sendo questionadas e podem ser revisadas pelo Ministério Público Federal: a do ex-senador Delcídio Amaral e a do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado. O primeiro foi preso por ser gravado por um delator em tratativas para obstruir a Lava-Jato, o segundo gravou a República.
Em Brasília, os métodos da Lava-Jato mudaram: em vez de procurar esclarecer crimes praticados no passado, os delatores saíram de gravador em punho para denunciar crimes que estariam sendo cometidos ou que as pessoas pensariam em cometer - caso da operação atribuída a José Sarney, Romero Jucá e Renan Calheiros para abafar a Lava-Jato. Acionada, a PF respondeu que não conseguiu comprovar as suspeitas surgidas a partir dos áudios de Machado.
A Operação Lava-Jato está na berlinda, e a posição de Janot, comprometida. O procurador não pode passar o cargo para a sucessora sob a suspeita de estar entregando um campo minado. É verdade que se passar a segunda denúncia para Raquel Dodge vai deixar a nova procuradora numa situação delicada; mas se deixar e a nova procuradora assinar e der continuidade à denúncia, a situação de Temer se complica efetivamente.
Temer escapou da primeira denúncia com os votos de 263 parlamentares, tem gordura para queimar, na hipótese da apresentação da segunda denúncia, especialmente se ela vier assinada por Janot. A situação do presidente no Congresso melhorou, ele ganhou uma proteção para os achaques e até pode tentar recuperar os dissidentes que o abandonaram na votação da primeira denúncia - mas nada ao ponto de fazê-lo recuperar a capacidade de iniciativa para aprovar medidas impopulares que exijam o voto de 308 deputados na Câmara, como a reforma da Previdência.
O mais provável é manter isso aí.
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