sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

César Felício: As férias do outsider

- Valor Econômico

Huck é mais uma dúvida entre tantas desta eleição

Luciano Huck procura se afastar dos temporais deste verão, em todos os sentidos que o termo pode ter. O apresentador está em férias com a família, tendo como um de seus objetivos passar por um "detox digital". Não quer alimentar o debate a seu respeito e julga que está encerrada a polêmica aberta com sua participação no programa "Domingão do Faustão", no dia 7 de janeiro.

A dúvida sobre a sua participação ou não no cenário eleitoral perdurará por mais 78 dias, até 7 de abril, prazo final para a filiação partidária. Em um cenário com tantas incertezas, onde o primeiro e o segundo colocado nas pesquisas, cada um à sua maneira, parecem inviáveis; e ninguém se entusiasma com o restante da nominata, Huck é mais uma dúvida.

Ele já negou publicamente e em privado, mais de uma vez, que tenha qualquer projeto de participar das eleições presidenciais este ano, mas seus ouvintes, leitores e interlocutores têm seus motivos para não considerarem a negativa convincente. O apresentador não pretende fazer novos esclarecimentos por ora. Acredita que tudo já está dito ou escrito.

Huck não parece afastar totalmente de seu horizonte uma aventura eleitoral porque está sendo chamado para a arena, constantemente, por interlocutores do PSDB. Grosso modo, o apresentador é uma espécie de último recurso dos tucanos, caso o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin "não pegue no breu", como disse um deles.

A expressão "pegar no breu", hoje em desuso, tem uma origem sugestiva: breu, sinônimo de piche, era colocado no centro de mechas de balões de festa junina. O balão só subia quando o breu se inflamava. Se há algo curioso no comportamento dos tucanos é que, em vez de trabalharem para que o balão de Alckmin suba, eles se põem a examinar alternativas.

As insinuações de que o novo pode estar no ar, de que poderemos ter o advento de um fator disruptivo, tiveram início em uma entrevista do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso na virada do ano, claramente reativa ao aumento da movimentação do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para se tornar um presidenciável.

Henrique Meirelles nunca foi temido pelo PSDB, por lhe faltar densidade política. Uma candidatura à reeleição do presidente Michel Temer parece mais um movimento para impedir que seu governo morra antecipadamente e para o MDB se cacifar, usando o velho golpe da articulação da candidatura própria. Rodrigo Maia pode bloquear o caminho de Alckmin pelo eleitorado de centro-direita. O deputado do DEM conta com apoio das siglas que compõem o Centrão e teria assim tempo de televisão, lastro no governo federal e vinculações com a elite empresarial. Seu bombardeio ao programa Bolsa Família, anteontem nos Estados Unidos e ontem nas redes sociais, indica que Maia decidiu ingressar na retórica antilulista, que rende dividendos eleitorais nas regiões Sul e Sudeste e pode retirá-lo do ínfimo 1% que conta nas pesquisas.

Huck havia descartado entrar na sucessão no fim de novembro, em artigo reproduzido em diversos jornais. Surpreendeu seus articuladores iniciais, que esperavam uma manifestação que deixasse alguma porta entreaberta. Ali no fim de novembro a mensagem era inequívoca: o apresentador se comparou ao herói Ulisses, que amarrado ao mastro resistiu ao canto das sereias. Os incentivadores de Huck contavam com alguma brecha que permitisse nova investida lá por março, mas não encontraram a mensagem cifrada nas palavras de então do apresentador.

A ameaça que Maia passou a representar levou tucanos a reagir. Cinco dias depois da entrevista em que FHC disse que o PSDB poderia apoiar outro nome para a presidência, caso aparecesse outro candidato com mais capacidade de aglutinação, Huck reapareceu.

No dia 7, o programa "Domingão do Faustão", na TV Globo, transmitiu uma entrevista de Huck e da mulher, Angélica, ao apresentador Fausto Silva, em que o possível presidenciável afirmou: "Não quero que ser presidente seja uma pretensão minha e não quero ser pretensioso de maneira nenhuma". Do ponto de vista semântico, Luciano Huck disse que não quer ser presidente em determinadas circunstâncias. Ou seja, a vontade de ser presidente depende de variáveis. Não foi uma negativa categórica.

O apresentador ainda observou: "O que o destino e Deus vai deixar para mim, vou deixar rolar". Não deixa de ser uma variante da famosa resposta de Getúlio Vargas ao ser perguntado em uma entrevista nos idos de 1949 ou 1950 se seria candidato a presidente. "Se o cavalo passar encilhado, eu monto".

Três dias depois, diante da repercussão, Huck escreveu no Facebook que não era candidato a nada, também de modo pouco assertivo: "Sigo de onde estou tentando ser uma voz potente apoiando fortemente a tão necessária e esperada renovação política do Brasil".

Mas há tucanos que não veem Huck como um substituto de última hora para Alckmin, até porque não há como Huck ser o jogador que entra aos 40 minutos do segundo tempo quando se está perdendo por um a zero. Na primeira semana de abril, poucas respostas estarão dadas no processo eleitoral e ele já terá que estar filiado para se habilitar a disputar a eleição.

Ensaia-se uma variante para a aventura: o apresentador tornar-se um eleitor de peso, com uma manifestação que seja interpretada como de apoio a Geraldo Alckmin. Huck entraria no jogo emprestando o selo de qualidade da renovação ao mais tradicional de todos os presidenciáveis que se articulam para participar das eleições, o único pré-candidato que participa da política desde 1972.

Esta não é uma hipótese que Huck descarta de pronto. Apresentado à proposta, se disse disposto a estudar um apoio. Seria um suporte ruidoso, de quem tem 17,5 milhões de seguidores no Facebook, mais que a soma do que Bolsonaro (5 milhões), Lula (3 milhões), Ciro (200 mil), Marina (2,4 milhões), Alckmin (900 mil) e Álvaro Dias (1 milhão) conseguem.

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