terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Luiz Carlos Azedo: Lula, o incendiário

- Correio Braziliense

O julgamento das urnas como purgação de pecados e ressurreição política é música aos ouvidos dos políticos enrolados na Justiça. Alguns adversários de Lula também simpatizam com a ideia

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva decidiu pôr mais lenha na fogueira do seu julgamento, na qual parece ter a intenção de se imolar, ao decidir comparecer à manifestação de protesto antecipado contra sua eventual condenação pelo Tribunal regional federal da 4ª Região, em Porto Alegre, marcada para hoje naquela cidade. Seu pretexto é de que vai agradecer a solidariedade de seus companheiros, mas Lula sabe que sua decisão reforça a mobilização e radicaliza ainda mais o confronto com àquela Corte.

Lula não ficará para o julgamento, no qual pode perder o recurso contra a sentença do juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba, que o condenou a nove anos e meio de prisão no caso do triplex de Guarujá. Além de Lula, serão julgados o ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, condenado em primeira instância a 10 anos e 8 meses de prisão; o ex-diretor da área internacional da OAS, Agenor Franklin Magalhães Medeiros, condenado a 6 anos. O ex-presidente do Instituto Lula Paulo Okamotto, que foi absolvido em primeira instância, também será julgado, porque requereu a troca dos fundamentos da sentença.

Quanto mais Lula afronta o Judiciário, mais cresce a aposta de que será condenado e, com isso, ficará inelegível. A decisão caberá aos desembargadores federais Gebran Neto, Leandro Paulsen, revisor, e Victor dos Santos Laus, o decano da turma. Todos foram ameaçados e estão com segurança reforçada. O Ministério Público Federal também pede o aumento da pena aplicada por Moro. E recorre da absolvição dos executivos Paulo Roberto Gordilho, Roberto Moreira Ferreira e Fábio Hori Yonamine, todos da OAS.

A manifestação de hoje é uma prévia do que está sendo programado para amanhã, dia do julgamento. A presença de Lula, contra a recomendação de seus advogados, é uma provocação do réu contra os seus juízes. Na prática, procura endossar a narrativa petista de que o julgamento tem por objetivo promover uma grande fraude eleitoral, pois ficaria impedido de disputar as eleições deste ano para a Presidência, por causa da Ficha Limpa.

Esse discurso está sendo endossado por artistas, intelectuais, dirigentes sindicais, juristas e políticos filiados ao PT e aliados de Lula, que procuram também mobilizar apoio internacional. Essa solidariedade. porém, até agora, não passou da esfera das personalidades. No domingo, em Paris, um protesto durou 10 minutos e reuniu menos de 13 pessoas. No Brasil, o clima é de carnaval: milhares de foliões caíram no frevo e no samba em São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e Recife, só pra citar grandes redutos petistas.

Na marra
O PT quer garantir a candidatura de Lula nas eleições de 2018 na marra, o que pode não dar certo, mas revela uma estratégia de confronto com o Judiciário. Para ter sucesso, é preciso primeiro desacreditar a Operação Lava Jato e o juiz Sérgio Moro, com o argumento falso de que Lula foi condenado sem provas de que seria o dono do triplex. As provas, nos autos do processo, são abundantes. Mas isso não importa, o que vale é emplacar a narrativa, o que se faz repetindo o argumento exaustivamente.

A segunda parte da operação é criar um movimento de comoção política e social, que coloque em questão a estabilidade política do país e a normalidade do processo eleitoral, para forçar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aceitar o registro da candidatura de Lula e deixar que ele concorra sub judice, para receber o julgamento das urnas, evitando mais tensões.

O julgamento das urnas como purgação de pecados e ressurreição política é música aos ouvidos dos políticos enrolados na Justiça. Alguns adversários de Lula também simpatizam com a ideia do julgamento político das urnas, o que joga no lixo a lei da Ficha Limpa. Mas há controvérsias quanto à interpretação da legislação eleitoral vigente. Para muitos, a lei tem aplicação imediata quanto à inelegibilidade e não o contrário, ou seja, não caberia ao TSE decidir sobre o mérito da questão. Se Lula for condenado amanhã, pois, haverá muita discussão pela frente.

Vamos supor, porém, que Lula não seja condenado por unanimidade, mas por 2 a 1. Nesse caso, haverá margem real para uma batalha jurídica de longa duração, com recursos que deverão ser julgados em duas instâncias superiores, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (ST¨F), o que efetivamente pode prolongar ainda mais o imbróglio jurídico. Mas essa estratégia jurídica é prejudicada pela narrativa da fraude eleitoral e a tentativa de desmoralizar o Judiciário, em que pese o fato de Lula não estar sozinho quando se trata dos processos da Lava-Jato. A coalizão contra a operação abarca todos os políticos e partidos citados nas delações premiadas dos executivos da Odebrecht e da JBS.

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