- Valor Econômico
Apoio popular dependerá de resultados práticos
Passado o impacto político inicial do anúncio das medidas de combate à insegurança pública que assola o país, nova fase se inicia para o governo federal. Autoridades avaliam que a receptividade da população à intervenção no Rio de Janeiro e à criação do Ministério da Segurança Pública foi positiva. Mas, agora, cada uma das ações do Executivo passará por detalhado escrutínio. Inevitavelmente, políticos tentarão aproveitar para ganhar pontos com o eleitorado - sejam governistas ou de oposição - a poucos meses do início da campanha. Já o presidente da República não tem tanto tempo assim: tratando-se de um assunto que tem impacto direto na vida das pessoas, Temer logo começará a ser cobrado por resultados.
Sem possibilidades de aprovar a reforma da Previdência, o presidente agiu com rapidez para afastar a percepção de que seu governo entraria em fase terminal. Com a retomada da economia contratada, redirecionou os esforços para o combate ao crime organizado e à violência. Colocou com rapidez o tema da segurança pública no topo das suas prioridades, item sempre citado pela população como uma de suas principais preocupações nas pesquisas de opinião e área que, no Rio de Janeiro, chegou a uma situação inaceitável. Garantindo uma rápida e folgada aprovação do decreto de intervenção no Rio pelo Congresso, demonstrou que mantém uma maioria parlamentar - mesmo que a base governista não tenha sido, em relação especificamente à reforma da Previdência, tão aliada quanto gostariam os articuladores políticos do Palácio do Planalto.
No entanto, se os recentes anúncios demonstraram a capacidade do governo federal de se recolocar diante dos obstáculos impostos pelo Legislativo e as necessidades mais prementes da agenda nacional, eles também evidenciam o insucesso das iniciativas até então adotadas para reduzir a fragilidade das fronteiras, combater o crime organizado e diminuir a violência.
Já se passou um ano desde que o Ministério da Justiça lançou um Plano Nacional de Segurança Pública. Órgãos do governo federal e do Estado do Rio de Janeiro atuam em conjunto desde maio de 2017 no combate ao tráfico de drogas e de armas, a furtos e ao roubo de cargas. Segundo mensagem do governo federal ao Congresso no início deste mês, foram enviados cerca de 620 policiais da Força Nacional para apoiar as polícias militar e civil do Rio em operações integradas. O Estado foi um dos alvos da Operação Égide, da Polícia Rodoviária Federal, que também envolveu os Estados que fazem fronteira com outros países e servem de corredor para os traficantes. Mesmo antes da intervenção um plano tático integrado havia sido elaborado e a nova gestão da Polícia Federal já tinha decidido aderir para valer à força-tarefa enviada ao Estado.
O governo Temer informou ainda aos parlamentares que verificou uma redução do roubo de carga em rodovias federais que cortam o Rio de Janeiro, território considerado de altíssimo risco por transportadoras. Apreendeu 219 armas e 30.389 munições, além de toneladas das mais diversas drogas. É pouco, muito pouco. Nesse período, foram presas 1.352 pessoas no Estado ou em outras unidades da federação mas que se dirigiam ao Rio.
Números oficiais à parte, a integração entre as forças federais e a as polícias locais não vinha ocorrendo de forma satisfatória. Desde as discussões sobre a recuperação fiscal do Estado, autoridades fluminenses insistiam em pedir mais recursos, mas evitavam discutir detalhes de como o dinheiro seria usado. Com a intervenção federal, a linha hierárquica passou a ser clara, muito embora o nível de cooperação que se dará entre as partes ainda seja uma incógnita.
Apesar de pensada há tempos no Executivo, a medida provisória criando o Ministério da Segurança Pública só foi editada a pouco mais de trezentos dias do fim do governo. Por sua vez, a intervenção federal na segurança do Rio foi decretada no dia 16, mas até agora o militar designado para comandar a missão concentrou tempo e energia no planejamento da ação.
É certo que se trata de um comportamento distinto do esperado se o interventor fosse um civil com pretensões políticas e usasse o novo cargo para catapultar um projeto pessoal por meio de discursos e promessas vazias. De qualquer maneira, entre os militares a condução do planejamento e dos preparativos sem arroubos é elogiada, mesmo que o tempo da política exigisse maior rapidez para que os resultados da intervenção pudessem ser notados pela população de imediato.
Em campo, o trabalho das tropas federais não será nada fácil. Os diversos desafios de se atuar no Rio já ficaram claros durante as missões de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) realizadas antes da edição do decreto de intervenção.
Traficantes e milicianos estão fortemente armados. Têm o domínio do terreno e devem fazer de tudo para impedir que o Estado recupere o controle das comunidades perdidas para as organizações criminosas. Militares que participaram de missões de paz das Nações Unidas, como a enviada ao Haiti, comparam os cenários enfrentados por soldados em conglomerados urbanos aos que se apresentarão no Rio. Em locais muito habitados e que propiciam a adoção de táticas de guerrilha por quem quer impedir o avanço de forças externas, as tropas muitas vezes são obrigadas a manter uma postura defensiva e acabam ficando vulneráveis a ataques e emboscadas. O Brasil não está envolvido em guerras há anos e colhe seguidos êxitos quando participa de missões internacionais. É difícil imaginar que as Forças Armadas aceitarão sair derrotadas em pleno território nacional e o próprio presidente disse em entrevista que, se necessário, os militares devem partir para o confronto.
O grande número de assassinatos de policiais no Rio já causa a compreensível indignação da sociedade, mas ainda é uma incógnita a potencial reação da população se ocorrerem baixas entre os militares. O governo também decidiu criar uma estrutura para garantir o devido respeito aos direitos humanos, outra área que pode gestar crises e críticas à intervenção. Somente nos próximos dias, com o avanço da operação, porém, o governo conseguirá verificar se o apoio popular obtido persistirá. Será possível também testar a reação da classe política, à medida em que a intervenção investir contra a estrutura de corrupção que levou o Estado do Rio ao colapso e atingir interesses dos partidos.
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