- Valor Econômico
Barbosa sabe que faltam regras claras e previsíveis no país
O Brasil é um país injusto e desigual, onde predomina o capitalismo de "compadrio". É preciso um capitalismo "de verdade" no país. O capital tem que aceitar risco e não ficar simplesmente "agarrado ao Estado" e dependente de dinheiro barato do BNDES. Ao Estado é imperativa a ação para reduzir as desigualdades e para proteger os desamparados. Em geral, nas áreas onde o Estado promete muito, acaba havendo "ineficiência e corrupção".
Essa é uma síntese do que pensa o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, segundo o relato de quem convive com ele e de pessoas com as quais ele tem conversado recentemente. Se for candidato e vencer as eleições à Presidência da República, pela história de vida e por ter sido implacável no julgamento do "mensalão", do qual foi relator no STF, ele terá condições de reunificar o país, hoje profundamente dividido entre uma esquerda envelhecida e uma direita extremada emergente, conforme definição de um dos interlocutores do ex-ministro.
Barbosa filiou-se ao Partido Socialista Brasileiro (PSB), que ainda não o consagrou como pré-candidato à sucessão presidencial. Ele próprio só deverá decidir se entra na disputa, segundo outro interlocutor, se as próximas pesquisas eleitorais indicarem um crescimento substantivo em relação ao último Ibope feito em São Paulo, que lhe atribuiu 9% das intenções de voto, percentual igual ao da última pesquisa Datafolha.
Na área econômica, Barbosa esteve com o ex-ministro Delfim Netto e com o economista Eduardo Giannetti. Ele gostaria de ter uma conversa, também, com o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, encontro que deverá ser marcado por um amigo comum.
Delfim está convencido de que ele governaria com os olhos na Constituição e resgataria o artigo 173, que inicia o capítulo da Ordem Econômica e Financeira da Carta de 1988, e que anda esquecido nos últimos anos. O artigo restringe a participação do Estado na exploração da atividade econômica a casos de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, definidos em lei.
Quem o conhece bem sabe que Barbosa tem uma personalidade forte que foi decisiva para ele levar adiante o julgamento do caso do "mensalão". Sua personalidade seria bastante útil, na avaliação de pessoas próximas, para o ex-ministro do STF, se por ventura vier a ser eleito, colocar limites aos poderes Judiciário e Legislativo - que devem voltar-se às suas respectivas funções - e resgatar o protagonismo do Executivo.
Giannetti contou que esteve duas vezes com Barbosa, no fim do ano passado, mas pouco ou nada falaram sobre economia. Conversaram mais sobre literatura. No primeiro encontro, após darem palestras em um seminário sobre as ações impetradas contra a Petrobras nos Estados Unidos, por conta do "petrolão", o ex-ministro contou que havia lido "Vícios Privados e Benefícios Públicos? A ética na riqueza das nações", livro de autoria do economista.
O segundo encontro foi no escritório de Barbosa, no Itaim, em São Paulo. Giannetti tinha o sonho de aproximá-lo de Marina Silva, pré-candidata à Presidência pelo Rede, para, eventualmente, ele ser o vice na chapa encabeçada por ela. A trajetória de ambos, que vieram de famílias pobres e venceram pela educação, representaria um ganho inestimável para o país. O ex-ministro do STF, porém, foi franco na manifestação de desinteresse pela proposta e a sondagem não prosperou. Falaram, porém, da biografia de Lima Barreto, que ambos haviam terminado de ler.
Todos os que conhecem Barbosa se impressionam com a sua cultura e aplicação. A Giannetti marcou, sobretudo, a compreensão de Barbosa da questão das desigualdades social, racial e de gênero.
Temas mais específicos, como reforma da Previdência, o forte desequilíbrio das contas públicas e privatização não tiveram, ainda, um posicionamento público do ex-ministro do STF. Para os que convivem com ele no dia a dia, esses são não assuntos costumeiros do ex-ministro. Mas, não há muitas dúvidas sobre o entendimento que ele tem a respeito, por exemplo, da distância que separa a previdência do trabalhador do setor privado e a do setor público. Ele trataria desse tema como uma expressão da desigualdade.
A média da aposentadoria do trabalhador do setor privado é de cerca de R$ 1.300,00. A cifra sobe para R$ 7 mil no poder Executivo, para R$ 16 mil no Legislativo e para R$ 27 mil no Judiciário.
Uma referência do que pensa o ex-ministro pode ser encontrada no voto que ele deu a favor da cobrança da contribuição previdenciária dos inativos. Na sua gestão à frente do STF foi criado o Funpresp (fundo de previdência complementar do servidor) que hoje tem 10 mil participantes, lembrou um assessor. O preenchimento dos cargos de direção do Funpresp foi feito por indicações de uma empresa de "headhunter", disse essa mesma fonte.
A um amigo, Barbosa vira e mexe faz duras críticas à atuação das agências reguladoras. Sobretudo à Agência Nacional de Telecomunicações, que, segundo ele, não fiscaliza os serviços de telecomunicações, que, na sua opinião, são muito ruins e caros.
Na concepção dele, segundo fontes próximas, a subsistência material deve ser produzida pelo setor privado, usando o mercado, sendo que este tem que ser bem regulado.
Barbosa tem consciência de que falta ao país regras claras e previsíveis, assim como segurança jurídica para os investidores estrangeiros. Para os nacionais, também, mas os estrangeiros precisam estar seguros de que quando quiserem sair do país, não serão barrados por razões diversas.
Barbosa costuma dizer que o Poder Judiciário no Brasil é dos mais independentes do mundo. Os juízes, aqui, são concursados, gozam de autonomia e só não julgam quando não querem.
Nenhum comentário:
Postar um comentário