Um governo fraco e impopular, mas com ambições de fazer um sucessor e a proximidade de eleições favoreceram a insatisfação do setor de transportes de cargas com o reajuste dos preços dos combustíveis e nutriram uma crise séria. Os primeiros sinais de que a fórmula de correções quase diárias dos preços poderia estar provocando mal-estar e trazendo prejuízos políticos ao governo partiu do presidente Michel Temer, que encomendou estudos ao ministro de Minas, Moreira Franco, sobre possíveis medidas pra barateá-los (Valor, 10 de maio). Manifestações dos caminhoneiros se iniciaram 12 dias depois, com bloqueio de estradas, e tornaram a questão "urgente", com riscos de desabastecimento graves caso os bloqueios de estradas perdurem.
Outro político com pretensões de chegar ao Planalto, Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, correu para fechar um acordo para reduzir a Cide, imposto sobre combustíveis. O Ministério da Fazenda resistiu e aceitou a ideia a partir do momento em que a Câmara aprovar o projeto de reoneração de vários setores da economia. A discussão assim chegou perto de onde não deveria: redução de impostos para um grupo, sob pressão, em troca do fim da desoneração para outros.
Como o governo é presa da pressão de grupos, há espaço para decisões demagógicas. Uma das primeiras ideias foi a de mudar o sistema de reajustes diários da Petrobras, algo que, se fosse adiante ao sabor do acaso, de sopetão, levaria a estatal de volta ao inferno nos mercados. A intervenção traria o fantasma recente do controle feito no governo de Dilma Rousseff, que trouxe perda na distribuição de combustíveis à Petrobras de R$ 80 bilhões em um par de anos e contribuiu para arruinar mais a empresa, superendividada e vítima da maior roubalheira de sua história.
Procura-se uma fórmula mágica para um problema: a alta internacional dos preços combustíveis. A Petrobras os repassa ao mercado doméstico, onde o diesel subiu 21% desde julho de 2017. A tendência no mercado externo ainda é de aumento das cotações.
A Cide existe para suavizar as oscilações de preços e deveria ter sido zerada. Para um governo na penúria, porém, a Cide tornou-se um imposto arrecadatório e não regulatório. Sem crise fiscal, já teria sido zerada antes de qualquer manifestação de protesto.
No sistema de preços livres, a questão se resolve com o repasse desses aumentos aos custos do frete e das mercadorias em geral. A redução da Cide dará pouco alívio ao preço final e líderes do movimento dos caminhoneiros agora pedem isenção de PIS-Cofins, enquanto seguem bloqueando estradas, o que é ilegal, para obter algo que outros setores produtivos, que utilizam o diesel como insumo, não têm.
Grandes transportadoras não teriam tanta dificuldade em repassar o aumento do diesel para seus serviços, mas enfrentam o obstáculo do crescimento raquítico da economia. Por isso elas e empresas de outros setores refreiam a transferência de custos tentada por caminhoneiros independentes, o elo fraco da corrente e que compõem a linha de frente dos protestos. Diante de um impasse na cadeia de preços, busca-se concessões da União, o caminho mais lógico em ano de eleições. A União não tem como ceder muito - o maior naco da grande carga tributária sobre combustíveis fica com os Estados, via ICMS.
A mesma política que os caminhoneiros consideram prejudicial, a de preços livres da Petrobras, sustenta aumento direto da arrecadação da União, Estados e municípios, na forma de royalties, e indireto, na forma de maiores ágios nos leilões de petróleo. Ontem, o governo liberou mais R$ 2 bilhões do Orçamento com base no salto dessas receitas. Uma interferência do Estado na formação de preço definida pela Petrobras teria efeitos muito negativos, com repercussões econômicas que suplantariam em muito ganhos ou perdas de um ou outro setor com reajuste de preços.
Por outro lado, a fórmula de reajuste de preços da Petrobras é um enigma e não se conhece o espaço que nela existe para dilatar ou não o período de reajustes sem ferir seu caixa e sem desvirtuar seu espírito. O sistema de preços livres é melhor, especialmente se considerado em relação ao passado recente, pois permite, como já ocorreu, que os preços caiam mais à frente.
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