sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Desconhecido, Haddad deve ser poupado de ataques

Por Ricardo Mendonça | Valor Econômico

SÃO PAULO - Embora seja tratado como provável candidato muito competitivo à Presidência, o petista Fernando Haddad, inscrito como vice de Luiz Inácio Lula da Silva, tende a ser poupado de ataques na arena eleitoral. Pelo menos no primeiro momento. O refresco não tem relação com qualquer pacto antibeligerante. Deverá ser preservado, na avaliação de analistas, por razões pragmáticas e circunstanciais: rivais simplesmente não têm estímulos para acionar a artilharia.

Haddad tem 4% no Datafolha quando seu nome aparece no lugar de Lula, o mesmo patamar de Alvaro Dias (Podemos). É menos que Jair Bolsonaro (PSL), 22%; Marina Silva (Rede), 16%; Ciro Gomes (PDT), 10%; e Geraldo Alckmin (PSDB), 9%. Diferentemente dos demais, ele permanece como uma figura desconhecida de quatro de cada dez brasileiros. Outros 27% o conhecem "só de ouvir falar".

No encurtado período de propaganda de rádio e TV, um dos maiores desafios do PT será reverter o desconhecimento. É uma necessidade que se tornará urgente quando Lula for excluído da disputa, cenário dado como certo no meio político. Estrategistas avaliam que se antecipar a isso e atacar Haddad desde já poderia servir para começar a desgastar sua imagem. Mas contribuiria ainda mais para torná-lo conhecido - justamente o que o PT mais precisa.

Outra situação de contexto que desestimula ataques a Haddad é a expectativa de postulantes com o "espólio" de Lula, que lidera com 39% quando é apresentado como opção. Isso vale especialmente para Marina e Ciro, explica o cientista político Marco Antônio Teixeira.

As intenções de voto em Marina e em Ciro dobram quando Lula sai da disputa. Para 16% e para 10%, respectivamente. Nas duas situações, o incremento é de "lulistas em disputa". São eleitores simpáticos ao ex-presidente que podem estranhar e desaprovar a ideia de Marina ou Ciro hostis ao ex-ministro de Lula, que hoje é seu vice.

Por outros motivos, bater em Haddad também parece desinteressante para Alckmin. O consultor Mauricio Moura, diretor da empresa Ideia Big Data, sustenta que o ex-governador de São Paulo precisa trabalhar para reconquistar o voto tradicionalmente dado a tucanos, mas que agora migrou para Bolsonaro. "Alckmin deve mirar naquilo que pode dar mais retorno", diz. "Haddad tem um outro público, um voto que, para Alckmin, é bem mais difícil de roubar."

Para o tucano, o risco de concentrar ataques no petista seria deixar caminho livre para Bolsonaro. O candidato do PSL dificilmente deixará de passar para o segundo turno se conseguir manter seu atual desempenho até a data da eleição.

Bolsonaro também não teria "incentivo" para bater em Haddad. Isso porque o ex-prefeito, diz Moura, "é o único que Bolsonaro talvez tenha alguma chance de vencer num eventual segundo turno".

A apuração do Datafolha coaduna com essa avaliação. Em simulações de segundo turno com dois pontos de margem de erro, Bolsonaro fica numericamente atrás de Ciro (38% a 35%), perde para Marina (45% a 34%) e Alckmin (37% a 31%). O único que ele venceria seria Haddad (38% a 29%). Conforme esse raciocínio, interessa a Bolsonaro transformar a etapa final da disputa numa embate plebiscitário entre petistas e anti-petistas.

A grande incógnita da eleição, na avaliação de Teixeira, é a capacidade de transferência de voto do popular ex-presidente preso em Curitiba. "A verdade é que nenhuma pesquisa consegue medir isso claramente", diz. O desempenho crescente de Lula nas pesquisas, diz, levará o PT a "esticar ainda mais a corda" pela manutenção de sua candidatura. "Vão tentar transformar a exclusão em comoção."

Se esse plano for bem sucedido, Haddad tende a virar alvo preferencial só nos últimos dias de campanha. A ligação com petistas condenados dificilmente deixará de ser lembrada. Outro mote previsível será a tentativa de associação de seu nome com o da ex-presidente Dilma Rousseff e o fracasso econômico de seu mandato.

A principal vulnerabilidade de Haddad é a derrota em 2016 quando tentou a reeleição para a Prefeitura. Dificilmente deixarão de explorar a ideia segundo a qual o eleitor paulistano o desaprovou.

Outro ponto a ser explorado é a suspeita de irregularidade no custo da construção de um trecho de ciclovia. Dias atrás, a Justiça aceitou denúncia e transformou o político em réu. A assessoria de Haddad diz que o próprio juiz do caso reconheceu em despacho que medidas formam tomadas pela Prefeitura para evitar prejuízos.

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