Por André Guilherme Vieira e Ricardo Mendonça | Valor Econômico
SÃO PAULO - Patinando em modestos 6% nas intenções de voto, segundo pesquisa Datafolha divulgada anteontem, o presidenciável Geraldo Alckmin (PSDB) intensifica a aproximação com lideranças evangélicas para ampliar seu eleitorado e garantir lugar no segundo turno da eleição.
Ontem, Alckmin manteve encontro reservado por cerca de uma hora com o líder da Igreja Mundial do Poder de Deus, Valdemiro Santiago, na sede da designação religiosa, no Brás, em São Paulo. Também participou da reunião o ex-prefeito de São Paulo e candidato do PSDB ao governo do Estado, João Doria.
Em seguida os candidatos tucanos assistiram, em pé e ao lado de Santiago, ao culto realizado por ele, que teve pregação bíblica e louvores embalados por canções. O sermão religioso ocorreu à porta fechada e seguranças do templo foram orientados a barrar a entrada de jornalistas. Alckmin e Doria deixaram o local sem falar com a imprensa. O candidato a presidente seguiu para o aeroporto de Congonhas para cumprir agenda de campanha em Petrolina (PE).
Templos evangélicos podem funcionar como caixa de ressonância para políticos "apadrinhados" por seus líderes. O censo 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apontou os evangélicos como o segmento religioso que mais cresceu: 42,3 milhões de pessoas ante 26,2 milhões contabilizados em 2000. A Igreja Mundial aparece no censo de 2010 com 315 mil fiéis. A Assembleia de Deus ainda detém o maior número de evangélicos no Brasil, 12 milhões, segundo o IBGE.
A aproximação de Alckmin com líderes evangélicos faz parte da estratégia de capturar o eleitorado de Bolsonaro, líder das pesquisas de intenção de votos com 19%, de acordo com o Datafolha. A campanha do tucano ainda não definiu como fará o ataque ao candidato do PSL durante os cinco minutos e 32 segundos de tempo que terá no horário gratuito da TV e do rádio, a partir de 31 de agosto.
Por ter perfil moderado, não há consenso sobre a melhor forma para Alckmin atacar diretamente Bolsonaro na TV. A crítica deverá ser feita indiretamente, por meio de peças de campanha, narrações de locutor e atores apontando "fraquezas" da candidatura adversária, como a falta de habilidade para formar governo e negociar com o Congresso, e ainda a inexperiência como chefe de Poder Executivo.
As investidas da campanha de Alckmin sobre os evangélicos deverão se intensificar. O tucano é bem visto no meio pentecostal, mas ainda há dúvidas sobre seu posicionamento acerca de temas considerados fundamentais pelo eleitorado composto pelos fiéis.
"Hoje, eu tenho a impressão que os evangélicos preferem o Bolsonaro ao Alckmin, apesar de o candidato do PSDB também agradar", acredita o bispo Robson Rodovalho, presidente da Confederação dos Conselhos de Pastores do Brasil (Concepab) e fundador da Sara Nossa Terra, designação religiosa que contabiliza mais de mil templos no país e soma cerca de 1,8 milhão de fiéis, segundo dados da confederação.
"Na minha avaliação, tanto um quanto outro têm plataformas de governo alinhadas às nossas bandeiras", afirma Rodovalho, que diz ainda manter relação de amizade com os dois candidatos.
"Para nós, não importa se está mais à direita ou na centro-direita. O nosso ideal seria ter os dois no segundo turno, afastando o risco de vitória da esquerda. Ainda não nos decidimos, mas agora é que a campanha está começando pra valer", diz o líder da Sara Nossa Terra.
"O importante é que nossos valores estejam presentes no plano de governo do candidato a presidente que decidirmos apoiar", diz o líder máximo da Igreja Apostólica Fonte da Vida, César Augusto Machado de Sousa. A designação religiosa foi fundada por ele em 1994, em Goiânia, e vem ganhando terreno. Em São Paulo, a sede regional fica no Ipiranga, zona Sul.
"Até agora, a tendência é o Bolsonaro agradar mais aos evangélicos, por tudo o que ele defende, como os valores familiares, que para nós são inegociáveis. Ao Alckmin falta expressão. Ele precisa se posicionar claramente sobre a questão dos valores", afirma César Augusto. "Mas, hoje, concordo que o Alckmin é o mais preparado para tirar o país da crise. Somos totalmente favoráveis às reformas necessárias, como a previdenciária", diz o religioso, intitulado bispo, o mais alto posto na hierarquia da Fonte da Vida.
Na hipótese de um segundo turno com candidato da esquerda, como Fernando Haddad (PT) ou Ciro Gomes (PDT), tanto Alckmin como Bolsonaro serão as "opções lógicas" dos evangélicos, segundo César Augusto.
"Somos contra a ideologia de gênero, contra a liberação das drogas, contra tudo isso que a esquerda e os 14 anos de governos Lula e Dilma trataram de tentar de impor ao país. Aliás, o Fernando Henrique Cardoso, cada vez que ele fala sobre liberação das drogas, da maconha, o Alckmin perde votos na comunidade evangélica, você pode ter certeza", critica.
Na avaliação do sociólogo Ricardo Bitum, professor do Mackenzie, a tendência é de atuações cada vez menos ostensivas de lideranças evangélicas em eleições. "Estão começando a aprender a lidar com o poder", opina.
Segundo ele, os comandantes das denominações devem copiar Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deis, que tem atuação muito mais discreta quando o assunto é eleição. "Macedo lida com isso muito bem. Controla um partido [o PRB], conseguiu eleger o prefeito do Rio [Marcelo Crivella], influencia na escolha de ministros, mas não aparece na linha de frente", explica. "Faz com habilidade incomum para os evangélicos o que a Igreja Católica faz há anos com muito mais sofisticação."
Bitum lembra que Valdemiro Santiago manteve encontro discreto com o presidente Michel Temer em janeiro. Estão percebendo, segundo ele, que "negociar vale mais do que falar alto".
De acordo com o pesquisador, lideranças evangélicas, especialmente de igrejas neopentecostais, têm dois comportamentos no trato com políticos. Uma pauta é aberta, pública e outra é velada, de bastidor. A pública defende valores morais, como proibição ao aborto e repúdio a direitos de homossexuais. A de bastidor trata de interesses objetivos, como regras para concessão de emissoras de rádio e TV e isenções tributárias para templos e atividades religiosas.
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